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A Política Tecnológica da Segunda Metade dos Anos Oitenta

Fabio S. Erber, Eduardo Augusto Guimarães, José Tavares de Araújo Júnior, In: Encontro Nacional da Indústria

Este artigo é bastante interessante por sua abordagem histórica, mas será útil aos formuladores de novas políticas industriais, como por exemplo, a do terceiro mandato do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2023- ), que visa a reindustrialização em novas bases tecnológicas? Acreditamos que a resposta é positiva, pois, não todos, mas muitos dos instrumentos de política disponíveis e a preocupação com a sua implementação permanecem basicamente os mesmos. As mudanças importantes são, naturalmente, de objetivo e ênfase. Cabe enfatizar, contudo, no que diz respeito ao setor manufatureiro, que a política tecnológica deve ser derivada da estratégia que se pretende imprimir à evolução da indústria, o que uma afirmação válida ainda hoje. No período estudado no texto, a análise dos obstáculos e opções enfrentadas pela política tecnológica concentrou-se em dois conjuntos de eventos: a) o crescimento industrial dos anos setenta, e a recessão dos anos oitenta e; b) o aparato institucional destinado ao suporte das atividades de ciência e tecnologia, criado ao longo dos quinze anos anteriores. Na formulação de uma nova política, a preocupação com a evolução histórica deve permanecer, pois cada país tem as suas idiossincrasias, que o diferencia dos demais. Além disso, as políticas industriais e tecnológicas devem estar em consonância com as demais, no sentido de propiciar um desenvolvimento social e econômico de longo prazo. Cabe lembrar aqui que o trabalho “A Política Tecnológica da Segunda Metade dos Anos Oitenta” de Erber, Guimarães e Araújo Jr. (1984) foi apresentado no Encontro Nacional da Indústria, em outubro de 1984. Na primeira parte, mostrou uma breve análise da experiência com políticas tecnológicas dos EUA, Japão, Alemanha Ocidental, França e Reino Unido, e na segunda seção, a do Brasil. Na segunda parte, uma agenda de médio prazo foi proposta, para a segunda metade da década dos anos oitenta, cujo objetivo era de gerar os mecanismos através dos quais a política tecnológica deveria tornar aptos diversos segmentos da economia a responder aos objetivos gerais da política econômica. Neste sentido, o trabalho focaliza: i) as implicações tecnológicas inerentes à provável evolução do setor industrial, inclusive, visando manter a sustentação das exportações, a ampliação da pauta de produção industrial e a retomada do crescimento do mercado interno; ii) as medidas factíveis e suas respectivas modalidades de implementação e; iii) a identificação de deficiências existentes no aparato institucional. No que concerne à política tecnológica, o texto afirma que essa deve ser ainda orientada a criar às condições necessárias à viabilização das trajetórias apontadas, a desenvolver capacitação tecnológica do país, como também a responder as demandas específicas da sociedade e da economia brasileira. A persecução dos objetivos apontados pressupõe reações de duas naturezas por parte do setor manufatureiro. Em alguns casos, requer-se ampla difusão no parque industrial brasileiro, de conhecimentos técnicos existentes no país e no exterior; em outros, além disso, requer-se das empresas industriais o pleno domínio da tecnologia utilizada, de modo a possibilitar a adaptação às especificidades do país e o poder de competição dos agentes produtivos nacionais. Por conseguinte, a política tecnológica deve ser, ao mesmo tempo, uma política de difusão, assim como, de geração e absorção de tecnologia, revestindo-se da necessária flexibilidade.

08. FSErber.EAAGuimarães.JTAraújoJrINTRODUÇÃO

Este trabalho discute os obstáculos e as opções a serem enfrentados pela política tecnológica brasileira na segunda metade desta década. Dois conjuntos de eventos orientam a análise e as sugestões aqui apresentadas. Por um lado, o crescimento industrial dos anos setenta, e a recessão dos anos oitenta, implicaram um processo de mudança estrutural que afetou significativamente o padrão de inserção internacional da economia, a configuração de seu parque industrial, e, consequentemente, redefiniu os termos do velho debate sobre o estilo de desenvolvimento. Por outro, o aparato institucional destinado ao suporte das atividades de ciência e tecnologia, criado no país ao longo dos últimos quinze anos, tornou-se um acervo de inequívoca importância para o encaminhamento das questões nacionais.

A primeira parte do texto reconstitui as principais características da política tecnológica de algumas economias industrializadas no passado recente, visando compará-las com a experiência brasileira. A partir dos dados relativos aos Estados Unidos, Japão, Alemanha Ocidental, França e Reino Unido, discute-se o papel que esses países desempenham na distribuição mundial de recursos de ciência e tecnologia, a concentração setorial do esforço inovativo e a intervenção do Estado nessas atividades. Em seguida, apresenta-se uma breve revisão do caso brasileiro.

A segunda parte propõe uma agenda de médio prazo, cujo tema é abordado sob três perspectivas complementares. Em primeiro lugar, são examinadas as implicações tecnológicas inerentes à provável evolução do setor industrial nos próximos anos, com ênfase nos aspectos relativos à sustentação do desempenho exportador da economia, à ampliação da pauta de produção: industrial, e à retomada do crescimento do mercado interno. Em segundo lugar, procura-se ordenar O elenco de medidas factíveis e suas respectivas modalidades de implementação. Por fim, algumas deficiências do atual aparato institucional são apontadas.

 

PARTE I – A POLÍTICA TECNOLÓGICA DOS ÚLTIMOS QUINZE ANOS

1 – A Experiência Internacional

1.1 – Concentração mundial

A distribuição internacional das atividades em ciência e tecnologia é altamente concentrada, quer se usem medidas de insumo (despesas em P&D, número de cientistas e tecnólogos)ou de resultados (patentes, artigos científicos publicados, inovações realizadas). Esta concentração ocorre não apenas entre países desenvolvidos e subdesenvolvidos (estes últimos respondem por apenas 3% destes gastos) mas também no âmbito dos primeiros — Estados Unidos, Alemanha, Japão, França e Reino Unido (na ordem de importância) — são responsáveis por quase: 90% dos custos totais em P&D industrial da OECD. Assim, embora outros países centrais tenham eventualmente papel relevante em setores específicos, o padrão de P&D no mundo capitalista & dado, em larga medida, por esses cinco países, sobre os quais se concentra a análise subsequente.

Três características marcam a pesquisa e o desenvolvimento industrial moderno: sua escala, seu conteúdo científico e sua especialização profissional, essas características estão intimamente ligadas ao seu caráter empresarial e configuram um processo de trabalho coletivo, conduzido dentro de cada laboratório ou planta-piloto.

No entanto, o processo de inovação é  um trabalho coletivo também num sentido mais amplo, ao nível da sociedade, Uma parcela substancial das informações utilizadas pelas empresas em suas atividades de P&D provêm de fontes externas e firma, notadamente de laboratórios governamentais e de universidades. Estudos setoriais sobre inovações mostram também a importância da comunicação entre firmas da mesma indústria e entre fornecedores e compradores. A transmissão dessas informações em geral, interpessoal e informal. Em consequência, obtém-se um efeito da sinergia, em que o resultado total é maior que a soma das partes. Essas condições, decorrentes de um longo processo de acumulação de capital e divisão do trabalho nos países centrais, conferem às empresas ali sediadas uma notável vantagem em relação às suas congêneres nos países periféricos.

É importante, porém, notar que, nesse processo coletivo, algumas indústrias desempenham um papel estratégico, atuando como núcleo gerador de inovações e como centro difusor de progresso técnico para os demais setores. o peso relativo dessas indústrias “intensivas em tecnologia” dentro de um sistema industrial nacional afeta de forma decisiva o dinamismo tecnológico e econômico desse sistema, bem como sua inserção internacional. Embora a importação de mercadorias e tecnologia possa, em parte, suprir deficiências da oferta interna de tecnologia, a política dos principais países da OECD orientada para a constituição e desenvolvimento desses setores estratégicos tanto por razões econômicas como militares.

Assim, cerca da metade dos gastos totais de P&D nos países da OECD refere-se à energia nuclear, atividades espaciais e defesa, dividindo-se o restante em partes aproximadamente iguais entre pesquisa e desenvolvimento com finalidade econômica e P&D destinados ao bem-estar público e apoio a universidade e pesquisa básica.

Em termos de P&D industrial, nota-se significativa concentração de gastos em alguns setores, notadamente nas indústrias aeronáutica, química, electro/eletrônica e de maquinaria, que absorvem cerca de dois terços dos gastos nos principais países. Estas indústrias caracterizam-se por fornecer  a base material do complexo militar e por apresentarem maior dinamismo em termos de comércio e investimento internacionais. Assinale-se, por fim, que — embora os Estados Unidos ainda sejam os principais investidores em P&D nos setores “intensivos em P&D”, principalmente em eletro/eletrônica e aeronáutica — os países da Comunidade Econômica Europeia (principalmente França e Alemanha) e, especialmente, o Japão têm apresentado maiores taxas de crescimento dos gastos em P&D nesses setores.

 

1.2 – A Participação do Estado

Embora os Governos dos países capitalistas tenham historicamente desempenhado um papel importante no apoio ao desenvolvimento da ciência e da tecnologia, observa-se a partir da II Guerra Mundial, uma expansão quantitativa e qualitativa da participação do Estado nessas atividades, que convém detalhar, Enquanto nos Estados Unidos a intervenção governamental nesta área parece ter se pautado principalmente por uma lógica a meme de potência militar, no Japão e Alemanha, obedeceu fundamentalmente a objetivos de poder econômico; a França e o Reino Unido aparecem como casos intermediários. Recentemente, observam-se nos Estados Unidos pressões para que a atuação do Governo seja dirigida a reforçar diretamente a capacidade de competição técnica e comercial das firmas americanas no mercado internacional, principalmente face a seus concorrentes japoneses no setor eletrônico.

O Governo como executor e financiador de P&D: Uma primeira aproximação ao papel desempenhado pelo Estado nos países desenvolvidos pode ser obtida pela análise de sua participação como executor direto de atividades de P&D. Conforme indica o quadro a seguir, referente aos principais países da OECD; é significativo o peso do Governo (exclusive sistema educacional) através de seus institutos de pesquisa e laboratórios, notadamente na França e no Reino Unido. Note-se  que, no setor empresarial, estão incluídas as empresas estatais, o que subestima substancialmente o papel do Estado na execução de P&D naqueles países onde tais empresas são importantes, como é o caso da França e do Reino Unido. O Governo nos países desenvolvidos desempenha um papel de financiador de gastos em PED que excede sua participação direta como executante destas atividades. A direção deste financiamento difere, no entanto. Nos EUA, França e Reino Unido, os gastos concentram-se em objetivos EUA, França e Reino Unido. Os gastos conceptivos de caráter. militar, aos quais estão intimamente ligadas às indústrias de ponta, enquanto na Alemanha e Japão os fundos governamentais são orientados prioritariamente para o “progresso do conhecimento”. Parcela ponderável destes fundos destinam- se a cobrir gastos em pesquisas que serão mais tarde utilizadas pelas indústrias de ponta. A importância do financiamento governamental para P&D varia, também, de acordo com os setores econômicos. Os Governos dos principais países da OECD financiam uma parte substancial dos gastos empresariais exatamente das indústrias intensivas em P&D, exceto a indústria química — chegando, no caso de a indústria aeronáutica cobrir a quase totalidade desses gastos. Por conseguinte, as indústrias tecnologicamente “de ponta” recebem praticamente a totalidade do financiamento governamental para P&D na indústria. É importante ainda notar que a contribuição governamental acima indicada não inclui certos gastos que, embora apareçam nas estatísticas oficiais como sendo de responsabilidade do setor empresarial, são, na verdade, cobertos pelo Governo. O caso japonês merece um reparo especial, pois estatísticas agregadas como as apresentadas nas tabelas anteriores mascaram uma intervenção governamental profunda em projetos de caráter estratégico em setores de ponta. No passado recente, destaca-se, por exemplo, a articulação do Estado com grandes grupos empresariais para alcançar sucesso internacional em produtos eletrônicos estratégicos, como a televisão a cores, componentes semicondutores e equipamentos de processamento de dados.

A seletividade da política de apoio à ciência e tecnologia dos países avançados revela-se também ao analisarem-se as empresas que utilizam os créditos governamentais para P&D: em 1975, nos EUA, 80% dos recursos governamentais para pesquisa e desenvolvimento iam para firmas com mais de 25 mil empregados; na França 90% para as 20 maiores firmas; na Alemanha 65% para empresas com mais de 10 mil empregados e no Reino Unido 97% eram absorbidos por 50 empresas. Embora não se disponha de dados comparáveis para o Japão, sabe-se que nas indústrias de ponta os projetos estratégicos são desenvolvidos em conjunto pelo, Estado e por um grupo restrito de grandes empresas. Por fim, a seletividade setorial e de objetivos reflete-se também no seio do Estado: os aparatos estatais têm uma interferência diferenciada na política tecnológica, de acordo com os objetivos desta. Assim, nos Estados Unidos, destaca-se o papel desempenhado pelo Departamento do Defesa e pela NASA; no Japão, o MITI (Ministério de Comércio Internacional e Indústria) tem o papel principal. Entre esses dois conjuntos restritos de setores – grandes empresas (e seus subcontratantes) e aparatos estatais específicos — forja-se uma solidariedade de interesses— em que o fomento tecnológico é um elo importante — que tende a se reproduzir, reforçando-se pela continuidade ao longo do tempo. A atuação dos Governos dos países industrializados , tal como é captada nas estatísticas de P&D acima citadas, representa apenas uma parcela reduzida do apoio dado pelo Estado ao processo de desenvolvimento científico e tecnológico desses países, sob a forma de diversas medidas de ordem legal e de política econômica e financeira. Embora esse apoio se estenda também às instituições de pesquisa e universidades (por exemplo, através de fundos destinados ao ensino e não à P&D), ele é especialmente importante para as empresas. Dentre as iniciativas não captadas nas estatísticas apresentadas, e ainda no âmbito do apoio financeiro, aponte-se os incentivos fiscais concedidos, pela maior parte dos Governos dos países centrais, às empresas que realizam P&D. Em suas formas mais comuns, tais estímulos consistem em deduções do imposto de renda devido pelas empresas e na depreciação acelerada dos investimentos em P&D, reduzindo assim os custos de realização dessas atividades. No entanto, a eficácia desse instrumento tem sido questionada devido, principalmente, ao fato de o investimento fixo em P&D ser relativamente pequeno e os incentivos não cobrirem os gastos de inovação subsequentes à pesquisa e desenvolvimento, Apoio governamental à apropriação e comercialização dos sucatados de P&D. Deste ponto de vista, a ação governamental contempla inicialmente assegurar o direito de monopólio da inovação, inclusive o direito de obter compensação daqueles ‘que tentam se apropriar de informações sem o devido pagamento. A preservação dos direitos de propriedade sobre o conhecimento apoia-se em sistemas legais nacionais e em acordos internacionais como a Convenção de Paris. Os países centrais não só tem sistemas legais internos e eficientes como tem consistentemente apoiado a internacionalização dos direitos de seus súditos. No tocante ao apoio à utilização dos resultados de P&D, ressalte- se, em primeiro lugar, O apoio de natureza financeira. Os gastos em P&D constituem, normalmente, uma parcela raramente superior: a 50% dos custos totais de inovação industrial. As demais despesas (instalações produtivas, marketing etc.) são frequentemente financiadas pelos Governos dos países avançados, embora não sejam incluídas nas estatísticas de P&D. Parte desses financiamentos são concedidos no contexto de políticas industriais mais amplas — ponto que voltaremos a seguir — mas outra parcela é parte integrante de uma política de inovação tecnológica, especialmente no caso das indústrias de ponta. Por exemplo, no caso de semicondutores e circuitos integrados, o Departamento de Defesa dos Estados Unidos concedeu importantes financiamentos para as linhas iniciais de produção, que permitiram &s firmas beneficiárias reduzir o tempo e o custo do desenvolvimento comercial desses produtos. Tomando-se como outro exemplo o Reino Unido, na década passada, a parcela referente a P&D representa apenas um quarto do total do apoio financeiro governamental à indústria. Este apoio, embora mantendo as prioridades vistas no financiamento a PAD, passa a incluir outras indústrias intensivas em tecnologia (notadamente química), que se beneficiam pouco do financiamento direto à pesquisa e desenvolvimento.

Nota-se aqui uma característica da intervenção do Estado para o desenvolvimento tecnológico nos países centrais: uma relativa convergência entre a política de fomento  industrial, lato senso, e as medidas destinadas especificamente ao desenvolvimento tecnológico o que, no jargão da política científica e tecnológica, convencionou-se chamar a “convergência entre as políticas explícitas e implícitas de tecnologia”. (Poe tecnologia. políticas explícitas são aquelas que têm o propósito definido e identificado de influenciar as atividades e funções de ciência e tecnologia; políticas implícitas são aquelas que, embora elaboradas com outros propósitos, p.ex. regular importações, afetam aquelas funções e atividades). Análises de reações empresariais à medidas destinadas a fomentar o desenvolvimento industrial e tecnológico mostram que as medidas mais importantes são aquelas relacionadas com o desenvolvimento industrial em sentido amplo. Dentre estas medidas, aponte-se, inicialmente, aquelas que contribuem para minorar a incerteza associada ao processo de pesquisa, desenvolvimento e inovação, especialmente nas indústrias tecnologicamente “de ponta”, um exemplo é a proteção nos mercados nacionais, através da preferência em compras governamentais (os “buy national acts”) e, menos frequentemente, de medidas de controle de importações (como tarifas, cotas e, mais indiretamente, política de câmbio). O caso do Japão constitui, talvez, a melhor evidência do uso dessas medidas, aliadas a uma cuidadosa discriminação setorial de entrada de capitais estrangeiros. Também no caso das indústrias de ponta nos Estados Unidos, diversos estudos mostram o papel crucial desempenhado pelas compras militares e espaciais, no sentido de propiciar a realização das economias de aprendizado e permitir a difusão comercial dos seus produtos, De fato, mesmo quando o Estado não é um comprador direto, influi com frequência sobre a demanda privada, orientando-a para a aquisição de inovações em larga escala, normalmente como parte de políticas de modernização setorial e de competição internacional. Tal foi, por exemplo, o resultado da política de subsídios às linhas de aviação nos Estados Unidos, combinada com a regulamentação de tarifas aéreas e com a depreciação acelerada para aviões, e dos financiamentos subsidiados para compra de máquinas-ferramentas com controle numérico em vários países da OECD. No Reino Unido, implementou-se um sistema de apoio intermediário entre as compras diretas e a mera orientação da demanda acima citada: máquinas-ferramentas com controle numérico são compradas pelo Governo, emprestadas sem ônus a possíveis compradores para teste e, a seguir, vendidas a preços reduzidos. O mercado estatal espacial/militar propiciou ainda importantes efeitos secundários para as indústrias de ponta (como computadores e aeronáutica) em suas aplicações civis. Primeiro, as vendas para o mercado espacial militar permitiram às empresas financiar níveis elevados de P&D em geral e, consequentemente, manter uma liderança tecnológica em outros mercados. Segundo, a demanda espacial/militar conferiu às firmas fornecedoras o domínio de técnicas altamente sofisticadas que, no entanto, tinham frequentemente aplicações civis. Por fim, a demanda espacial/militar teve importantes efeitos-demonstração para a área civil, estimulando a demanda desse segmento da economia. A ação governamental nos países desenvolvidos têm contemplado também viabilizar a presença no mercado externo dos produtos resultantes do esforço doméstico de P&D. A esse respeito, observe-se que! se, por um lado, as indústrias intensivas em tecnologia respondem pela maior parcela das exportações de produtos industriais dos países avançados, de outro, essas exportações são frequentemente indispensáveis ao crescimento de tais indústrias, mesmo tendo em conta a dimensão dos mercados internos desses países. Na intensa competição internacional que caracteriza essas indústrias, dois fatores, são de fundamental importância: a qualidade dos produtos e as condições de financiamento das vendas. Neste contexto, as medidas de proteção nos mercados domésticos, acima discutidas, não se cumprem uma finalidade defensiva em relação a concorrentes estrangeiros, como acarretam um fortalecimento das condições de competição das firmas  locais nos mercados externos, permitindo-lhes utilizar o mercado nacional tanto para atingir escalas de produção mais vantajosas como para comprovar a qualidade dos produtos, adiantando-se aos seus competidores na introdução de inovações no mercado internacional. Possivelmente, o melhor exemplo desta estratégia & dado pela atuação japonesa em produtos eletrônicos. Os Estados dos países avançados têm também apoiado as exportações de suas indústrias mediante esquemas de financiamento especiais, frequentemente coadjuvados por medidas de “a diplomacia comercial”, especialmente no caso dos países subdesenvolvidos. Assinale-se, por fim, que os governos de países desenvolvidos, especialmente os europeus e o Japão, tem adotado políticas que visam alterar a estrutura de algumas indústrias, notadamente nos setores de ponta, de modo a, entre outros efeitos, assegurar-lhes poder de competição no mercado internacional, inclusive em termos de tecnologia. São exemplos de iniciativas neste sentido as fusões de empresa patrocinadas pelos governos da Alemanha e da Inglaterra nas indústrias aeronáutica ‘ e nuclear e pelos governos da Inglaterra e da França na indústria de computação.

 

1.3 – Conclusões

A análise da participação do Estado no processo de desenvolvimento científico e tecnológico dos países capitalistas centrais sugere algumas conclusões: embora o nível de desenvolvimento da acumulação de capital e da divisão de trabalho nessas economias favoreçam O processo de desenvolvimento científico e tecnológico, tais condições favoráveis são não apenas reforçadas pela ação do Estada, como, em parte, criadas pela interferência estatal as medidas de apoio do Estado ao processo de desenvolvimento científico e, especialmente, tecnológico, transcendem o apoio direto às atividades de P&D. No entanto, tais medidas estão, em regra, associadas a outros objetivos que não o desenvolvimento tecnológico em si, entre os quais se destacam o poder militar e o reforço das condições de competição das empresas nacionais tanto no mercado interno como internacionalmente, em termos comerciais e de investimento. O desenvolvimento tecnológico é um meio de atingir tais objetivos mais amplos, especialmente no caso das indústrias de ponta. Nas demais indústrias, o desenvolvimento tecnológico & um subproduto da política econômica geral.

As medidas de apoio ao desenvolvimento científico e tecnológico estão fortemente concentradas em alguns setores industriais, as chamadas “indústrias de ponta”. Essa concentração se dá tanto em termos do apoio direto às atividades de P&D , como nas medidas de apoio indireto, Para os demais setores, inexistente, na prática, uma “política explicita de inovações”.- O apoio do Estado ao desenvolvimento tecnológico ê altamente seletivo, tanto em termos de setores como de empresas. Com isso, forma-se nas indústrias de ponta uma articulação de interesses entre empresas, instituições de pesquisa e aparatos estatais, que tende a se expandir e a assegurar a continuidade daquele apoio.

– As medidas de apoio direto do Estado ao desenvolvimento científico e tecnológico dos setores de ponta tendem a convergir com outras medidas de política econômica, que representam um apoio indireto a esse desenvolvimento, essas medidas de política tecnológica “implícita” são uma condição necessária para o sucesso da política tecnológica “explícita” e, frequentemente, são dominantes nas decisões empresariais.

2 — O Caso Brasileiro

2.1 – Evolução Histórica

As diversas análises históricas da atuação do Estado na área de ciência e tecnologia no Brasil mostram que só a partir do fim da década de 60, com o Programa Estratégico de Desenvolvimento (PED), define-se, ao nível do Governo Federal, uma política explícita de ciência e tecnologia, Embora anteriormente o Estado interviesse na área científica e tecnológica propiciando a institucionalização de certas atividades cientificas (na área de saúde, por exemplo) e mesmo constituindo instituições de política para ciência e tecnologia (como a criação do Conselho Nacional de Pesquisas em 1951), essa intervenção era fragmentada e descontínua, refletindo conjunturas específicas (febre amarela no Rio, broca em café em São Paulo). Atendidos os interesses imediatos que o suscitaram, o apoio estatal à atividade científica e/ou tecnológica, tornava-se rarefeito e minguavam as instituições e as atividades nelas realizadas. Quando, como no caso da política atômica, as  implicações de uma intervenção estatal eram maiores envolvendo modificações na estrutura de relações internas ou externas, faltou força aos grupos interessados para, mesmo iniciada a intervenção estatal na área, dar-lhe a continuidade e força necessárias. Em outras palavras, os estudos sobre a atividade científica e sobre a dependência tecnológica sugerem que, até recentemente, tanto o padrão de crescimento econômico no Brasil, como as características do seu sistema político e a forma de inserção do país no sistema internacional, não propunham ao Estado razões econômicas e políticas suficientes e necessárias a uma maior intervenção na área da ciência e tecnologia, a não ser em casos específicos de alcance limitado. No período que se inicia em 1968, o desenvolvimento científico e tecnológico passa a ser objeto específico de política. Estabelecem-se mecanismos financeiros especiais para essas atividades, passa-se a controlar a importação de tecnologia e implanta-se uma estrutura institucional para o planejamento, que produz três Planos Básicos para o Desenvolvimento da Ciência e tecnologia (PBDCT) cobrindo, respetivamente, os períodos 1973/1974, 1975/79 e 1980/85. Essas atividades do Governo Federal são espelhadas, em escala menor, ao nível de alguns Governos Estaduais, especialmente em São Paulo. Embora todos os planos de desenvolvimento desde o PED enfatizem a necessidade de criar uma maior capacidade científica e tecnológica no país, além de aumentar a incorporação e conhecimento proveniente do exterior, hã diferenças importantes entre suas prioridades. Enquanto no PED a maior capacitação científica e tecnológica tinha por objetivo o desenvolvimento de tecnologias mais ajustadas à dotação de fatores de produção no país, de modo a assegurar maior absorção de mão-de-obra e criar um mercado de massas para garantir um crescimento auto sustentado, nos demais planos a ênfase recai sobre o aumento da competitividade da indústria brasileira e o fortalecimento da empresa nacional. No período coberto pelo II PND e II PEDCT, o discurso oficial passou inclusive a privilegiar o papel a ser exercido pela ciência e tecnologia no processo de desenvolvimento brasileiro como uma força motora, o conduto, porém excelência da ideia de progresso e modernização. Esta ênfase é substancialmente abrandada no III PBDCT que elege como objetivos prioritários a aplicação da ciência e tecnologia aos problemas energéticos, de desenvolvimento agrícola e desenvolvimento social. A distância entre o discurso oficial e a prática é, como se sabe, grande mas, mesmo assim, mo passado recente, o Brasil reforçou consideravelmente a sua capacidade científica e tecnológica, expressas numa população de pesquisadores ativos de cerca de 30 mil pessoas, em cerca de mil cursos de pós-graduação, onde estudam mais de 40 mil alunos e, por exportações, tanto de tecnologia (equivalentes às importações) e de produtos manufaturados de relativa sofisticação, inclusive de instalações fabris completas. Embora persistam sérias deficiências na estrutura científica e tecnológica brasileira, agravadas com a atual crise, os sucessos alcançados podem em boa medida ser creditados à política científica, e tecnológica explícita do Estado brasileiro.

 

2.2 – Execução e Financiamento das atividades de Ciência e Tecnologia

Os dados disponíveis sugerem que O Brasil gasta entre 0, 4 e 0,6% do PIB em ciência e tecnologia, Esta percentagem é semelhante a de outros países em desenvolvimento como o México, Argentina, Coreia do Sul e India, mas substancialmente inferior à dos países desenvolvidos. Embora os gastos brasileiros em volume (medidos em dólares) não sejam insignificantes em termos internacionais, cabe registrar que tais dispêndios destinam-se inclusive a montar uma estrutura de atividades científicas e tecnológicas, ao passo que os investimentos dos países desenvolvidos incidem sobre uma estrutura já constituída e eficiente. O quadro a seguir apresenta a evolução dos gastos em ciência e tecnologia para O período 1979/82 discriminados por entidades executoras com fontes financiadoras, segundo informações recentes do CNPq. Tais dados, no entanto, representam uma aproximação muito parcial da realidade. Assim, provavelmente subestimam o montante de gastos em tecnologia realizados pelo setor privado e incluem gastos públicos que apenas em sentido, muito amplo são atribuíveis a despesas em ciência e tecnologia (por exemplo, o aumento do capital da Nuclebras responde por 5.2% dos recursos em moeda local do Orçamento da União para Ciência e Tecnologia). O crescimento em valor real destes gastos em 1982 resulta, em proporção difícil de avaliar, da ampliação do tipo de dispêndios considerados como pertencentes ã categoria de ciência e tecnologia e do alargamento da base de informantes. Apesar dessas qualificações, o quadro mostra o papel crucial que o Estado brasileiro tem desempenhado tanto na execução de atividades científicas e tecnológicas no país, como no financiamento por meio dos Governos Federal e, em menor medida, Estaduais e das Empresas Estatais. Estas últimas financiaram com recursos próprios a maior parte (72%) dos seus gastos em ciência e tecnologia no período 1979/82, uma proporção substancialmente maior que o autofinanciamento do setor privado no mesmo período (50%). A outra metade dos gastos realizados pelo setor privado & financiada com recursos do Tesouro Nacional (28%) e por agências financeiras (22%). No passado recente, vem se modificando o peso relativo dos instrumentos financeiros utilizados pelo Estado brasileiro para cobrir os gastos nacionais em ciência e tecnologia, com a queda acentuada do papel desempenhado pelo FNDCT (Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) administrado pela FINEP. Tendo em 1976 atingido um pico de 1,168%, sua participação no Orçamento da União em 1984 (0.24%), foi inferior ao valor observado quando da sua constituição em 1970 (0.343).Em termos reais, o FNDCT reduziu-se a cerca da metade do valor  meta correspondente a 1976. Quanto à distribuição dos dispêndios nacionais em ciência e tecnologia, os dados disponíveis (apenas para o ano de 1983) sugerem que a prioridade atribuída pelo III PBDCT — a agropecuária e energia — vem sendo obedecida: estes dois setores respondem por mais da metade do referido gasto. Se a estes somam-se os recursos destinados a do “desenvolvimento científico e tecnológico” (provavelmente pós-graduação. e pesquisa na universidade) (14%) e as atividades destinadas à’ indústria (11%) atinge-se mais de três quartos do dispêndio total no ano. No entanto, a terceira prioridade do Plano, o desenvolvimento social, parece: ter recebido apenas 3,5% dos recursos. Em termos de gastos em atividades científicas e tecnológicas pelo setor empresarial privado e estatal, estimativas do CNPq para 306 empresas em 1979 sugerem que, entre as empresas privadas, os. gastos concentram-se no setor de material de transportes (um terço do total privado), ‘seguido pelo setor químico (14%) e autopeças (10%), predominando as despesas realizadas por empresas nacionais. Entre as empresas estatais nota-se uma concentração substancial em 10 empresas que respondem por 90 dos gastos de 97 empresas pesquisadas. Tais gastos concentram-se na área agropecuária (46%), geração e distribuição de energia (18%), química (11%) e telecomunicações (10%).2.3 – Política de compras das Empresas Estatais. A exigência de uso da tecnologia do exterior para a aquisição de serviços de engenharia e bens de capital, comum nas empresas estatais brasileiras na década de setenta, tendia a gerar um círculo vicioso em que seus fornecedores, por não terem experiência prévia do prestamento, eram forçados a usar licenciamento e, por usarem licenciamento, não desenvolviam uma capacidade própria de projetamento. Por conseguinte, dentre as medidas implementadas para fazer face aos problemas de balanço de pagamentos e ao peso que as importações de bens de capital haviam assumido na mesma época, incluiu-se a criação nas empresas estatais de Núcleos de “Articulação com a Indústria -NAIS. Estes Núcleos, que respondiam a uma Comissão de Coordenação cuja Secretaria Executiva era a FINEP, tinham por objetivo aumentar o conteúdo local das compras dessas empresas . Em fins de 1978 já haviam sido criados 106 NAIS, número que tem se mantido constante desde aquela data. A atuação dos NAIS’s no sentido de substituir importações de tecnologia e incentivar o desenvolvimento tecnológico autóctone dos fornecedores das empresas estatais varia bastante de setor em setor, à destacando-se os sucessos obtidos nas áreas de telecomunicações, energia elétrica e petróleo. Significativamente estes são os setores onde as empresas estatais vem investindo mais em pesquisa e desenvolvimento próprio e em “contratação de pesquisas extramuros. A eficácia tecnológica dos NAIs tem sido limitada tanto por fatores que fogem ao controle das empresas estatais (como o padrão de financiamento de seus projetos) como pela resistência interna ao uso de tecnologia local. Embora essa resistência se justifique em parte (e seja sempre justificada) por fatores de risco, contêm também elementos políticos e de preconceito que normalmente não são explicitados mas pesam substancialmente. Este viés cultural e político &, por vezes, agravação pela distância dos NAIs em relação aos centros decisórios das empresas estatais. A FINEP, como Secretaria Executiva do CCNAI, vem tentando minorar os problemas acima mencionados, pelo estabelecimento de dois tipos de convênio, de natureza complementar: (1) Acordo de Cooperação Técnica e Financeira com as empresas estatais, através do qual a FINEP coloca recursos para a fabricação pioneira de bens de capital em empresas nacionais selecionadas pelas empresas estatais, buscando inclusive a articulação dos fornecedores de equipamentos com instituições de pesquisa; (2) Acordo de Cooperação Financeira com a FINAME, tendo por objetivo garantir recursos para as empresas nacionais de bens de capital desde a fase de investimento em tecnologia até a comercialização e garantindo também às empresas apoiadas pela FINEP as taxas de juros favorecidas do Programa Especial da FINAME. Mais recentemente, o INPI bajula um ato normativo, cujo intuito é evitar que as empresas estatais, em suas licitações, imponham a seus possíveis fornecedores a obrigação de contratar tecnologia no exterior.

 

2.3 – Política de Compras das Empresas Estatais

A exigência de uso da tecnologia do exterior para a aquisição de serviços de engenharia e bens de capital, comum nas empresas estatais brasileiras na década de setenta, tendia a gerar um círculo vicioso em que seus fornecedores, por não terem experiência prévia do projetamento, eram forçados a usar licenciamento e, por usarem licenciamento, não desenvolviam uma capacidade própria de projetamento. Por conseguinte, dentre as medidas implementadas para fazer face aos problemas de balanço de pagamentos e ao peso que as importações de bens de capital haviam assumido na mesma época, incluiu-se a criação nas empresas estatais de Núcleos de Articulação com a Indústria -NAIS. Estes Núcleos, que respondiam a uma Comissão de Coordenação cuja Secretaria Executiva era a FINEP, tinham por objetivo aumentar o conteúdo local das compras dessas empresas. Em fins de 1978 já haviam sido criados 106 NAIS, número que tem se mantido constante desde aquela data. A atuação dos NAIS’s no sentido de substituir importações de tecnologia e incentivar o desenvolvimento tecnológico autóctone dos fornecedores das empresas estatais varia bastante de setor em setor, à destacando-se os sucessos obtidos nas áreas de telecomunicações, energia elétrica e petróleo. Significativamente estes são os setores onde a empresa estatal vem investindo mais em pesquisa e desenvolvimento próprio e em contratação de pesquisas extramuros

A eficácia tecnológica dos NAIs tem sido limitada tanto por fatores que fogem ao controle das empresas estatais (como o padrão de financiamento de seus projetos) como pela resistência interna ao uso de tecnologia local. Embora essa resistência se justifique em parte (e seja sempre justificada) por fatores de risco, contêm também elementos políticos e de preconceito que normalmente não são explicitados mas pesam substancialmente. Este viês cultural e político, por vezes, agravaram pela distância dos NAIs em relação aos centros decisórios das empresas estatais. A FINEP, como Secretaria Executiva do CCNAI, vem tentando minorar os problemas acima mencionados, pelo estabelecimento de dois tipos de convênio, de natureza complementar: (1) Acordo de Cooperação Técnica e Financeira com as empresas estatais, através do qual a FINEP coloca recursos para a fabricação pioneira de bens de capital em empresas nacionais selecionadas pelas empresas estatais, buscando inclusive a articulação dos fornecedores de equipamentos com instituições de pesquisa; (2) Acordo de Cooperação Financeira com a FINAME, tendo por objetivo garantir recursos para as empresas nacionais de bens de capital desde a fase de investimento em tecnologia até a comercialização e garantindo também às empresas apoiadas pela FINEP as taxas de juros favorecidas do Programa Especial da FINAME. Mais recentemente, o INPI baixou um ato normativo, cujo intuito é evitar que as empresas estatais, em suas licitações, imponham a seus possíveis fornecedores a obrigação de contratar tecnologia no exterior.

 

2.4 – Política da transferência de tecnologia

Desde 1972, com o novo Código de Propriedade Industrial, cabe ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) a apreciação e averbação dos contratos de importação de tecnologia, de uso das patentes e marcas e de serviços técnicos. A atuação desse instituto tem refletido, em primeiro lugar, a preocupação com a situação cambial do país. Assim, o INPI dá prioridade à importação de tecnologias que sirvam à substituição das importações ou à exportação. Ao mesmo tempo, busca e reduzir os gastos decorrentes da importação de tecnologia e do uso da propriedade industrial (patentes e marcas) estrangeira, tanto pela redução dessas importações como pela melhoria das condições de negociação dos empresários nacionais. Neste contexto, o INPI limita a duração e os níveis de pagamento à conta de tecnologia e proíbe cláusulas restrictivas nos contratos (por exemplo, restrições a exportações, importações “atadas” , sigilo apôs o término do contrato). O desenvolvimento tecnológico nacional constitui outra de suas prioridades. Neste sentido, tem procurado incentivar as empresas a ampliarem suas atividades tecnológicas no país e utilizarem a capacidade nacional existente, exigindo, em e certos casos, a realização de investimentos em pesquisa e de raça e tem no desenvolvimento como contrapartida a importação de. tecnologia e º uso de tecnologia nacional quando disponível. Mantêm também do Banco de patentes, que informa às empresas sobre tecnologias não patenteadas no país e, portanto, de livre uso pelas em meio Ta presas locais. Ao mesmo tempo, o INPI vem 1 estreitando « os seu usam laços com os institutos de pesquisa tecnológica e estimulando as empresas a fazerem o mesmo, não se dispõe de uma avaliação detalhada dos resultados das medidas tomadas pelo INPI, algumas de prazo recente. No entanto, informações setoriais, como no caso da indústria de bens de capital, sugerem que alguns desses objetivos, como o de reforço da capacidade de barganha na importação de tecnologia da parte de empresários nacionais, estão sendo atingidos . Do ponto de vista financeiro, os gastos com importação de tecnologia demonstram tendência cadente (US$ 218 milhões em 1983 contra US$ 321 milhões em 19805).

 

2.5 – Incentivos Fiscais

Os incentivos fiscais foram largamente utilizados como instrumento de política econômica para fomentar ampla gama de setores, até o passado recente. No entanto, para as atividades em ciência e tecnologia, o uso desse instrumento de fomento tem sido restrito, No presente, são concedidas isenção do imposto de importação (a empresas estatais, instituições e centros de pesquisa oficiais) e redução até zero da alíquota deste imposto (para empresas privadas) para produtos utilizados em pesquisa que não tenham similar no país. Segundo informações do CNPq, órgão que coordena e administra a concessão desses incentivos, as empresas públicas e privadas são suas maiores beneficiárias, destacando-se em termos setoriais um aumento da demanda provinda das áreas de comunicações, eletrônica e informática. No ano de 1983, os incentivos atingiram o montante de 25 bilhões; equivalentes a cerca de 4% dos gastos locais em ciência e tecnologia.

 

2.6 – Contradições entre a política de ciência e tecnologia e outras políticas

Ao lado das iniciativas acima descritas o Governo brasileiro adotava uma série de políticas que contradizem a orientação da política cientifica e tecnológica. A produção científica do país, por exemplo, foi prejudicada sensivelmente pelo afastamento compulsório do país de inúmeros-cientistas-e-pesquisadores e pelas restrições impostas à atividade interna-de-outros.- Tais medidas não afetam somente os indivíduos atingidos mas provavelmente tiveram importantes “efeitos de encadeamento”, dado o caráter coletivo do trabalho científico e o papel de liderança intelectual que os atingidos, com frequência, exerciam numa comunidade que já não era grande. É na área tecnológica, contudo, onde se constata uma contradição mais flagrante entre a política tecnológica explícita e as demais políticas econômicas executadas ao longo da última década. Enquanto a política tecnológica explícita postulava a busca de uma maior autonomia tecnológica como elemento de reforço da capacidade de competição da empresa nacional, as demais políticas tinham como efeito aumentar a importância da tecnologia vinda do exterior, embutida em bens de capital ou mesmo sob forma de acordos, quer pelo estímulo a entrada de capitais estrangeiros, quer pelo estímulo aos empresários nacionais a usar tecnologia importada como elemento de expansão e competição, entre si e com seus concorrentes estrangeiros. Apenas em alguns setores, notadamente em mini computadores e material aeronáutico, nota-se uma coerência entre a política tecnológica e as demais medidas dirigidas ao setor — notadamente a reserva de mercado para empresas nacionais, o controle de importações e o financiamento para instalação de capacidade de produção, nos mesmos moldes que ocorrem nos países centrais. As contradições observadas entre as políticas implícita e explícita de ciência e tecnologia no Brasil contrastam com a convergência constatada entre ambas nos países centrais. O sentido da política implícita encontra sua explicação no padrão de desenvolvimento, cujas características de crescimento “associado e dependente” são bem conhecidas. Cabem, no entanto, alguns comentários sobre a gênese da política explícita de ciência e tecnologia. Neste sentido, é importante notar que tal política surgiu a partir das iniciativas de um segmento do aparelho estatal — notadamente aquele sediado no Ministério (mais tarde total — notadamente aqui » Secretaria) do Planejamento e agências vinculadas (BNDE e FINEP). A este segmento, articulam-se grupos de interesse cuja constituição estão associada à expansão do sistema de pós-graduação e pesquisa e que tende a pressionar o Estado no sentido de assegurar a continuidade e a ampliação do seu apoio e área cientifica e tecnológica. A esses grupos, vêm se somando as empresas já beneficiadas ou potencialmente beneficiárias dos programas de fomento, especialmente aquelas que atuam em áreas onde a tecnologia é efetivamente um elemento importante de competição e expansão, como na indústria eletrônica. A atuação desses grupos empresariais pode induzir a maior atenção de outros segmentos do aparelho de Estado a questão do desenvolvimento tecnológico do país e propiciar a necessária convergência entre as políticas explicita e implícita de ciência e tecnologia. Mesmo porque à continuidade e expansão do suporte estatal ã área de ciência e tecnologia é condição necessária para que esta se consolide, ganhando massa crítica e escalas mínimas de produção de forma que os investimentos passados venham a ser efetivamente produtivos.

 

PARTE II – Uma Agenda de Médio Prazo

I – Introdução

Conforme enfatizamos na primeira parte deste trabalho, a principal atribuição da política tecnológica é gerar os mecanismos através dos quais os diversos segmentos da economia se tornam tecnicamente aptos a responder aos objetivos gerais da política econômica. Deste ponto de vista, no que diz respeito ao setor manufatureiro, a definição da política tecnológica deve ser derivada da estratégia que se pretende imprimir à evolução do setor industrial, onde duas preocupações centrais estarão presentes nos próximos anos: a retomada do crescimento econômico e a geração de superávits no balanço comercial. São conhecidas as trajetórias que podem ser perseguidas em resposta a tais preocupações: o aumento das exportações; a reativação e expansão do mercado interno; e a extensão devoção e à expo pauta de produção do país. Dado que cada uma destas trajetórias é individualmente insuficiente para assegurar os resultados desejados, compete à política industrial a tarefa de perseguir-las simultaneamente e de forma coordenada. Neste contexto, a política tecnológica deve ser orientada no sentido de criar as condições necessárias à viabilização das trajetórias apontadas. Além disso, a vontade de que a sociedade brasileira venha assumir maior grau de controle sobre os rumos do seu próprio processo de desenvolvimento impõe também o objetivo de aumentar a capacitação tecnológica do país, visando fortalecer o poder de competição da empresa nacional e responder às demandas específicas da sociedade e da economia brasileira. A persecução dos objetivos acima apontados pressupõe “reações de duas naturezas por parte do setor manufatureiro. Em a alguns casos, requer-se a ampla difusão, no âmbito do parque industrial brasileiro, de conhecimentos técnicos existentes no país ou no exterior; em outros, mais do que simplesmente utilizar técnicas disponíveis, requer-se das empresas industriais em mm o quantas a o pleno domínio da tecnologia utilizada, de modo a ensejar sua adaptação as especificidades do país e fortalecimento do poder de “competição “aos agentes produtivos nacionais. Estes dois requerimentos manifestam-se de forma diferenciada, em relação aos diversos setores industriais. Por conseguinte, a política tecnológica deve ser, ao mesmo tempo, uma política de difusão e uma política de geração e absorção de tecnologia, revestindo-se da necessária flexibilidade para enfatizar diferenciadamente cada uma destas faces em distintos setores.

2 – As implicações tecnológicas da estratégia de desenvolvimento industrial

Analisam-se a seguir as implicações tecnológicas das distintas partes que compõem a estratégia de desenvolvimento industrial a ser implementada na segunda metade dos anos oitenta.

 

2.1 – O desempenho exportador da indústria brasileira

Como um instrumento de sustentação do desempenho exportador da economia, a política tecnológica deve atuar sobre as três principais fontes de competitividade internacional da indústria brasileiras) idade tecnológica da capacidade produtiva, das vantagens comparativas específicas no comércio com outras economias em desenvolvimento já os custos relativos de mão-de-obra. Uma consequência relevante do processo de crescimento industrial que marcou o período 1968/1980 é a de que as principais indústrias estabelecidas no país dispõem no momento de uma capacidade produtiva cuja idade tecnológica &, em média, inferior a quinze anos. Para a maioria das indústrias responsáveis pela expansão das exportações de manufaturados nos  últimos dez anos, isto significa operar nas adjacências da fronteira tecnológica internacional. Exemplos notáveis neste sentido são os de celulose, petroquímica, siderurgia e diversos outros versos o segmentos do complexo metal mecânico. Ademais, a experiência adquirida através do esforço de vendas no exterior durante anos consecutivos, conduziu a uma expressiva melhoria dos níveis de eficiência empresarial, em termos de controle de qualidade, escolha de instrumentos adequados de comercialização, maior perceção dos sinais emitidos pelos mercados importadores, formação de equipes qualificadas para atuar na área internacional ,etc. recessão da década dos oitenta parece ter alterado as condições de competitividade em duas direções opostas. De um “lado, a queda dos investimentos, aliada à escassez de divisas, devem ter retardado a adoção de eventuais inovações tecnológicas em algumas indústrias. De outro, existe certa evidência de que as empresas de grande porte tenham sido forçadas pela crise a promover amplas reformas organizacionais, visando aprimorar as rotinas de controle sobre os custos correntes de produção, maior seletividade nas aplicações financeiras, e conferir maior precisão aos objetivos de médio prazo da empresa. A julgar pelos dados de balanço dos últimos dois anos, tais iniciativas produziram resultados compensadores. O impacto final sobre as condições de competitividade advindo desses dois tipos de eventos ainda estão por ser avaliado. contudo, é inequívoco que durante o período de retomada do crescimento competirá à política tecnológica a atribuição de corrigir as disparidades intra industriais de eficiência-provocadas . las pela recessão. Ao lado das condições genéricas acima referidas, importante tratar das vantagens comparativas específicas adquiridas pelo país quanto ao suprimento de produtos manufaturados e serviços de engenharia e assistência técnica a outras economias em desenvolvimento. Tais vantagens são oriundas do fato de que, em toda experiência de industrialização, alguma parcela da oferta de tecnologia é gerada localmente. A magnitude desta parcela varia directamente. com o. tamanho do mercado interno” e o grau de integração vertical alcançado pelo sistema industrial, estabelecido no pais. No caso brasileiro, a componente endógena de progreso técnico consistiu esencialmente, durante os últimos trinta anos, em mudanças adaptativas realizadas a partir de conhecimentos básicos importados dos países industrializados. Uma experiência desta natureza tende a gerar vantagens comparativas específicas quando a fronteira tecnológica internacional de determinados ramos de produção permanece relativamente inalterada. Neste contexto, as firmas brasileiras tornam-se mais habilitadas do que suas congêneres dos países tese industrializados para disputar os mercados daquelas economias com características estruturais sejam mais similares, às nossas NO area mapear eme e do que as do mundo desenvolvido. Entretanto, a manutenção no médio prazo dos atuais níveis de competitividade das firmas brasileiras não depende apenas de sua capacidade de prosseguir o desenvolvimento das técnicas produtivas vigentes, sob uma conjuntura de inércia relativa da fronteira tecnológica internacional, mas também de estarem habilitadas a enfrentar os impactos advindos de inovações que alterem radicalmente a concepção dos atuais processos produtivos. com efeito, quando o ritmo de progresso técnico não é muito intenso, os instrumentos usuais de competição, como redução de custos, diferenciação de produtos, novas estratégias de comercialização, etc., costumam ser suficientes para assegurar O desempenho exportador. Mas o advento de inovações radicais constitui um desafio de outro estilo, posto que -não se trata de uma perturbação conjuntural no ritmo dos negócios mas de uma mudança de caráter definitivo no modus operandi da industria. Neste caso, ao contrário do que acontece com à situação anterior, a pressão que estão sendo exercida sobre as firmas não é a de aumentar o poder de competição, dentro de um contexto em que os padrões de aferição &e desempenho estão razoavelmente definidos, mas de serem capazes de descobrir quais são as novas regras do jogo criadas pelo progresso técnico. Este esforço compreende decisões cujo risco é elevado, e que passam por: avaliar as características de nova estrutura de poder econômico que estiver sendo construída no plano internacional; identificar as estratégias de expansão compatíveis com o novo formato da base técnica do ramo; abandonar linhas de produção anteriormente rentáveis, com O ônus eventual do sucateamento de instalações recém-adquiridas, etc. As observações acima também se aplicam às indústrias onde o baixo custo da mão-de-obra é um fator importante de competitividade internacional, como têxtil e calçados. Por isso, a recente onda de automação nas atividades de confecção, que vem, ocorrendo em algumas economias industrializadas, representa uma ameaça não desprezível às perspetivas de médio prazo de nossas exportações de artigos de vestuário. É verdade que o padrão de competição dessa indústria oferece às firmas que resolverem retardar a adoção de determinadas inovações diversos mecanismos de defesa temporária de posições de mercado, como economias nos custos de comercialização, diferenciação de produtos, segmentação de mercado, etc. Contudo, a eficácia desses mecanismos: É inversamente proporcional à magnitude dos diferenciais de produtividade introduzidos pela mudança tecnológica. assim, caso se acelere a difusão internacional dos métodos automáticos, a indústria brasileira será forçada a enfrentar, O difícil dilema da geração de empregos versus a geração de divisas. As próximas seções deste trabalho procuram situar esta opção num contexto mais amplo.

 

2.2 – A ampliação da pauta de produção industrial

A extensão da pauta de produção ao longo do processo de industrialização se deu, fundamentalmente, através da substituição de importações. Mais do que a redução do coeficiente de importação da economia, foram a diversificação da produção local e os investimentos que lhe deram origem que caracterizaram o processo de substituição de importações. Neste contexto, inicialmente a pauta de importações e suas modificações constituíram indicadores da direção a ser imprimida às sucessivas ondas de investimento que fizeram avançar a constituição do parque industrial do país. Não obstante, o desdobramento do processo de substituição de importações não esteve restrito às indicações propiciadas pela pauta de importação; frequentemente, antecipando-se às importações, o parque produtivo local empreendeu a produção de bens ainda não consumidos de forma significativa no país, seja daqueles cuja demanda emergia como resultado do próprio avanço do processo de industrialização, seja daqueles cuja produção recém aparecia nas economias industrializadas. Deste ponto de vista, é possível distinguir, dentre os investimentos que propiciaram a extensão da pauta de produção do país, aqueles que promoveram a substituição de importações efetivas e aqueles que estiveram associados a importações virtuais, ou apenas emergentes. Ao contrário do observado no passado, quando a substituição de importações efetivas constituiu a principal fonte de dinamismo do processo de expansão industrial, é de se esperar que as respostas a importações virtuais representem, na segunda metade dos anos oitenta, uma contribuição mais significativa ao crescimento. De fato, embora seja previsível um aumento expressivo do volume das importações tradicionais no contexto de uma retomada do processo de crescimento, o avanço já alcançado na constituição do parque industrial e as características da pauta de produtos manufaturados ainda importados limitam as possibilidades de ampliação da pauta de produção do país através da produção local de bens tradicionalmente importados. “Por outro, lado, a resposta ao aparecimento de novos produtos nas economias mais desenvolvidas através da produção local desses bens permite transferir ao setor manufatureiro do país pelo menos parte do dinamismo gerado por aquelas. inovações. Evidentemente, a importância destas substituições antecipadas de importações como fator de crescimento dependerá do ritmo de inovação e progresso técnico daquelas economias. As possibilidades abertas, em particular, pelas inovações no campo da microeletrônica fazem prever, no entanto, um fluxo significativo de novos produtos, capaz de conferir elevado dinamismo a determinados segmentos do setor manufatureiro. Dado que esta extensão da pauta de produção se apelar na reprodução no país. de um percurso externo de inovações, as subsidiárias de empresas estrangeiras aparecem, mais uma Vez, com as. promotoras naturais dessas substituições antecipadas de importações. Estas empresas podem ser induzidas a assumir escola” de papel através da mobilização de instrumentos tradicionais de política industrial, tais como proteção tarifária e incentivos ao investimento. ademais, independentemente de tais instrumentos, a própria competição entre estes produtores estrangeiros e a tentativa de assegurar vantagens sobre seus rivais podem ser suficientes, em alguns casos, para induzi-los a empreender coprodução local. Uma atuação governamental mais efetiva e direta será elos requerida, no entanto, ao se » pretender a participação de produtores nacionais neste processo de extensão da pauta de produção. Face o elevado, conteúdo te tecnológico da maioria dos novos produtos, esta atuação-deverá-privilegiar a capacitação técniproduicio, tsca de empresas nacionais. O grau de capacitação requerida poderão diferir; em alguns casos, a simples transferência de tecnologia. do exterior será suficiente; em outros, os produtores locais deverão assimilar efetivamente o know-how envolvido de modo a se habilitarem a acompanhar, com maior autonomia, os possíveis desdobramentos de tais inovações. Esta maior capacitação tecnológica deverão ser perseguida, em particular, em relação a àquelas; inovações potencialmente mais férteis em inovações secundárias e capazes de impacto mais profundo no nível de eficiência do sistema produtivo. A eficácia de uma ação governamental neste sentido dependerão, no entanto, de se associar a mobilização de instrumentos específicos de política tecnológica a um conjunto de medidas de política industrial capaz de garantir a sobrevivência dos produtores nacionais durante o período de tempo requerido para sua efetiva capacitação. Assinale-se que, dentre os novos produtos passíveis de serem incorporados à pauta de produção do país, deverão incluir-se igualmente bens de consumo e de produção. Em relação a estes últimos, em particular, a ação governamental deverá revestir-se da necessária cautela para que o esforço para viabilizar a extensão da pauta de produção do país e para assegurar a existência de produtores nacionais não tenha como resultado dificultar excessivamente a utilização destes novos produtos no parque produtivo do país, com eventuais prejuízos para seu nível de eficiência. Aponte-se, por fim, que as medidas de estímulo à extensão da pauta de produção do país não devem estar restritas as possibilidades associadas à substituição de importações efetivas e virtuais. Na verdade, a política tecnológica deve ter presente igualmente a necessidade de inovações que venham a responder a demandas específicas da sociedade e da economia brasileira — seja no tocante ã satisfação de necessidades básicas da população, seja com vistas ao aproveitamento de matérias-primas peculiares ao país. Em relação ao atendimento de tais demandas, as possibilidades de recorrer & tecnologia proveniente do exterior são certamente limitadas.

2.3 – A expansão do consumo interno

No que diz respeito ao setor industrial, a reativação e expansão do mercado interno poderão manifestar-se através da recuperação dos níveis de consumo de camadas de rendas médias e altas da população ou através da ampliação do mercado de consumo de massa. Embora as duas alternativas não sejam completamente excludentes, as condições necessárias a avanços significativos em uma destas direções, notadamente aquelas referentes à estrutura de distribuição de renda, se constituem, em certa medida, em obstáculos a progressos no caminho alternativa. Ao contrário da experiência do final dos anos sessenta, não parece possível perseguir agora prioritariamente a primeira alternativa acima apontada. Não obstante, a reativação do consumo das camadas de rendas médias e altas pode ainda constituir um fator de crescimento na segunda metade desta década, cujo impacto, ainda que de propagação limitada no âmbito do setor industrial, seria suficiente para conferir dinamismo a alguns de seus segmentos. Como no passado, essas reativações tenderão a resultar da absorção de padrões de consumo gás economias desenvolvidas, apoiando-se no fluxo de novos produtos originados, naquelas economias. Neste contexto, estaria associada à extensão de pauta de produção local, através da antecipação de produtores estabelecidos no país à importação daqueles bens. Deste ponto de vista, os comentários anteriores referentes à substituição de importações virtuais descrevem adequadamente as implicações e exigências, relativas à política tecnológica, da reativação do consumo dos grupos de maior renda. No tocante à ampliação do mercado de massa, seus requerimentos tecnológicos são contraditórios. De um lado, a necessidade de avançar sucessivamente na direção de estratos de renda mais baixa impõe transformações técnicas que ensejem aumentos de produtividade e reduções de custo e viabilizem preços menores. Em particular, face à elevação dos salários reais que, ê de se esperar, deverá ocorrer nos próximos anos, estas mudanças técnicas voltadas para O aumento da produtividade aparecem como necessárias para evitar que estes ganhos salariais acentuam as pressões inflacionárias. Por outro lado, tais transformações estão associadas, em geral, a menores requisitos de mão-de-obra; as consequências desta tendência são sobretudo significativas no caso dos segmentos produtores de bens de consumo popular, uma vez que estes segmentos respondem por parcela expressiva do emprego industrial. Neste contexto, os requerimentos para a ampliação do mercado a nível de indústrias específicas tendem a apresentar um efeito perverso do ponto de vista da expansão da demanda por bens de consumo da economia como um todo. Não cabe certamente sacrificar o processo de mudança tecnológica e os ganhos de produtividade daí derivados às preocupações quanto à absorção da mão-de-obra. Embora, a curto prazo, o efeito redutor do emprego daquelas mudanças possa ser, pelo menos parcialmente, compensado pela contribuição positiva resultante da expansão do mercado e do aumento de produção, há que reconhecer que; a longo prazo, o problema do emprego no Brasil não poderá ser resolvido com base na indústria de transformação. Não obstante, não cabe também ignorar os efeitos daquele processo do ponto de vista da questão do emprego. Assim, a política tecnológica deve ser articulada, no âmbito da política industrial, a uma política de emprego de modo a eventualmente identificar setores nos quais a manutenção do nível de emprego deva ser enfatizado; a evitar o sacrifício desnecessário de postos de trabalho; e a promover o treinamento e a reabsorção da mão-de-obra dispensada em virtude do processo de mudança tecnológica.

 

3 – Características e principais medidas da política tecnológica

Os comentários anteriores relativos às experiências internacional e brasileira de atuação governamental na área de ciência e tecnologia e às implicações tecnológicas da estratégia de desenvolvimento industrial sugerem as principais características de que se deve revestir a política tecnológica na segunda metade dos anos oitenta. Em primeiro lugar, caberá dar prosseguimento aos esforços feitos nos últimos quinze anos de modo a consolidar e reforçar a infraestrutura científica (notadamente pesquisa e ensino de pós-graduação) e tecnológica (sistemas de treinamento, informação, normalização, metrologia, controle de qualidade e as instituições de pesquisa tecnológica). Estas infraestruturas, de natureza diferenciada embora inter-relacionadas , requerem políticas igualmente diferenciadas. Por outro lado, a consecução dos objetivos de desenvolvimento industrial antes discutidos requerem políticas seletivas destinadas a fomentar a geração de progresso técnico interno e absorção efetiva dos conhecimentos gerados no exterior. Para que isso se dê, necessário que as medidas de política tecnológica propriamente dita (política explicita) estejam articuladas de forma consistente e coerente com as demais medidas política econômica , notadamente a politica industrial. Por fim, a importância do progresso técnico para O futuro da sociedade brasileira e o caráter coletivo do processo de geração e aplicação dos conhecimentos técnicos impõem um amplo escopo à política tecnológica. No entanto, as condições que regem a produção e apropriação de conhecimentos científicos “e técnicos são tais que os estímulos de mercado, isoladamente |, não são suficientes para gerar o resultado socialmente desejável. Cabe, portanto, ao Estado um papel fundamental no projeto acima mencionado, no Brasil como em outros países. No nosso país, a necessidade dessa participação é acentuada pelo subdesenvolvimento histórico da estrutura de produção de ciência e tecnologia e pelo entranhamento da dependência tecnológica no corpo produtivo nacional. Não obstante, se não houver um decidido engajamento do setor empresarial, notadamente O nacional, a intervenção do Estado tenderá a fracassar.

3.1 – Políticas de Redução de Custos das Atividades Tecnológicas

1) Via Instrumentos Creditícios

Esta tem sido a forma mais tradicional de apoio ao desenvolvimento tecnológico industrial. Conforme já foi mencionado, em diversas agências governamentais de financiamento existem linhas de-crédito com esse propósito abrangendo toda a gama de atividades tecnológicas. Essas linhas, no entanto, o precisam ser revitalizadas com recursos e seus procedimentos o operacionais expedita dos., Ao mesmo’ tempo, deveriam ser implementados mecanismos eficazes de coordenação entre agências, visando especialmente programas setoriais, de acordo com a seletividade já mencionada. Cabe notar, porém, que os custos das atividades de pesquisa e desenvolvimento respondem apenas por uma parcela dos custos prévios à introdução de uma inovação (cerca da metade, nos países desenvolvidos). Os demais custos são em regra financiados, no caso brasileiro, por outras instituições ou linhas de crédito que não as de fomento tecnológico. Tal financiamento & geralmente concedido com base em critérios que não privilegiam o desenvolvimento tecnológico total, mas antes frequentemente o desestimulam por conservadorismo excessivo. Assim, esta área constitui um exemplo típico da necessidade de integrarem-se políticas explícitas e implícitas de tecnología. Ao mesmo tempo, esta integração sugere a necessidade de manter os laços entre entidades de crédito e instituições de pesquisa e aí informação tecnológica que asses: soram as decisões de financiamento.

2) Via Incentivos Fiscais Embora largamente utilizados nos países desenvolvidos, os incentivos fiscais à pesquisa e desenvolvimento são reduzidos no Brasil, limitando-se, como vimos anteriormente, a isenção dos impostos de importação e do IPI para produtos sem similar nacional, destinados a atividades de pesquisa e desenvolvimento. Face à crise fiscal brasileira, a concessão de novos incentivos deveria ser precedida de estudos cuidadosos que levem em conta a experiência de outros países. Sua eventual implementação deveria ser provida de salvaguardas que garantam a efetiva aplicação dos recursos das empresas em atividades de P&D.

3) Via Associações de Pesquisa A associação entre empresas para dividir os custos de atividades tecnológicas de interesse comum & frequentemente erram me reta tem a meme observada na Europa e no Japão e começa a se difundir nos. Estados Unidos. É um mecanismo de especial utilidade para pequenas e médias empresas, permitindo-lhes um progresso técnico que, à isoladamente, não alcançariam. Embora iniciativas desse tipo não necessitem da participação do Estado, podendo ser promovidas por entidades patronais de forma independente, o Estado deve fomentá-las de maneira seletiva, utilizando instrumentos financeiros e fiscais e o poder catalítico das compras das empresas estatais, as quais reúnem várias empresas privadas com problemas técnicos frequentemente similares.

 

3.2 – Políticas de Redução de Riscos

1) Via Capital de Risco

O maior obstáculo à inovação tecnológica provém da incerteza quanto a seus resultados, o que implica altos riscos técnicos, econômicos e financeiros. Inexistente, no mercado de capital brasileiro, instituições privadas dispostas a investir capital de risco em empresas inovadoras, notadamente pequenas e médias empresas. Iniciativas neste sentido .por parte de tais instituições, como aquelas que apoiaram o desenvolvimento do setor eletrônico nos Estados Unidos, teriam evidentemente impactos importantes. Ao mesmo tempo, O Estado brasileiro pode participar deste processo através de suas instituições de crédito, buscando inclusive a participação das entidades privadas. Os mecanismos legais para esta atuação já existem (por exemplo na FINEP e no Sistema BNDES) cabendo ativá-los em condições operacionais eficazes e, preferencialmente, no âmbito de programas setoriais seletivos.

2) Via Proteção no Mercado Interno

A produção de tecnologia nacional tem as características de uma “indústria nascente”, marcada por economias de aprendizado ao longo do tempo e produtividade crescente, justificando-se assim sua proteção contra a competição externa, dentro de certos limites dados pela necessidade de aproveitamento do progresso técnico gerado no exterior e pelos custos adicionais eventualmente impostos aos usuários do conhecimento técnico endogenamente gerado. Assim, dentro destes limites, cabe desnível no mercado interno ou quando sua maturação esteja próxima, sob pena de inibir o desenvolvimento tecnológico nacional. Mesmo quando a importação de tecnologia seja necessária, cabe tomar medidas que assegurem que essa tecnologia seja efetivamente absorvida, posto saber-se que o funcionamento espontâneo do mercado faz com que apenas parte dos conhecimentos sejam internalizados, ficando outras partes (p.ex. o “desenho básico” de produtos) sob posse e controle do, detentor original da tecnologia. Este esforço de absorção, obviamente, também deverá ser seletivo, dado que nem todas as tecnologias importadas terão condições de serem absorvidas nem será conveniente que sejam gastos recursos escassos (humanos, materiais e financeiros) para esse fim. Conforme já foi mencionado, o ÍNPI vem atuando dentro da perspectiva acima esboçada, devendo manter-se e reforçar esta política, tanto pelo aperfeiçoamento dos recursos do Instituto como pela consolidação dos seus vínculos com entidades de pesquisa, empresas industriais e de consultoria. Onde a ação do INPI parece necessitar de modificações maiores é no uso do instrumento clássico de proteção à atividade tecnológica, as patentes, cujo processamento poderia ser substancialmente a rara armar? Aperfeiçoado. Dada a sua importância em setores tecnologicamente estratégicos, as compras das empresas estatais constituem um instrumento básico nessa política. A experiência brasileira e de outros países demonstra, no entanto, que não é suficiente proteger as atividades tecnológicas nacionais. Se a proteção meti. em ma temente, mas não mesmo a não se estende aos produtos. e processos em que estas atividades resultam, a, proteção ã tecnologia acima mencionada tende a frustrar-se. Aqui, mais uma vez, encontra-se a necessidade de que ” : integrar a política tecnológica com a política industrial, utilizando instrumentos como a proteção tarifária, preferências nas aquisições estatais, etc. Este tipo de proteção abrangente, a ser administrada de forma seletiva, afigura-se especialmente importante para aqueles produtos e processos para os quais se almeja uma “substituição de importações preventiva”, um dos pilares da estratégia industrial brasileira antes discutida.

3) Via Proteção ao Mercado Externo

As receitas cambiais provindas da venda direta de tecnologia brasileira e de produtos e serviços que incorporam tecnologia gerada internamente tem aumentado de importância. No Brasil, até agora, o sistema de patentes tem sido utilizado principalmente por firmas de origem externa para reservar o mercado brasileiro aos seus produtos e/ou tecnologia. No entanto, na medida em que as firmas brasileiras patenteiam suas inovações no país e utilizem os direitos de prioridade internacional dados pelo sistema internacional de propriedade industrial, este poderão ser utilizado a seu favor no exterior. Para tanto, seria útil o apoio do INPI e do Ministério de Relações Exteriores, bem como dos mecanismos de financiamento às exportações, inclusive financiando os gastos de patenteamento. A essa proteção legal dever-se-iam acrescentar instrumentos que certifiquem a qualidade técnica dos produtos nacionais, a exemplo do que foi feito pela indústria aeronáutica junto a entidade certificadora americana, sem prejuízo de que se montem no Brasil entidades certificadoras de rigor semelhante que, no futuro, sejam reconhecidas como tal no exterior. No entanto, analogamente ao que ocorre no mercado interno, a capacidade tecnológica brasileira não gerará exportações significativas se não forem adotadas medidas de proteção aos produtos em que se incorpora. Entre curtos, mesmos financeiros adequados é essencial para a venda no exterior de sistemas de produtos e processos, como no caso de serviços de consultoria e bens de capital.

 

3.3 – Políticas de Atualização Técnica e. Difusão Tecnológica

As medidas acima discutidas orientam-se prioritariamente para o esforço de inovação tecnológica endógena. Os objetivos do desenvolvimento industrial brasileiro requerem, no entanto, que, ao mesmo tempo, o parque industrial se engaje num esforço contínuo de atualização tecnológica, conforme indicado nas seções anteriores deste trabalho. Surgem nesse contexto. Alguns trade-offs entre importação de tecnologia e geração interna nas atividades tecnológicas em que não são complementares (p.ex. projeto básico de produtos e processos), Os quais terão que ser resolvidos caso a caso, em função do custo e do tempo de maturação das alternativas locais e importadas. Existem, porém, medidas que servem a estimular a atualização tecnológica, quer se utilizem tecnologias nacionais ou importadas. Entre estas destacam-se:

1) Reforço da infraestrutura tecnológica

Entende-se aqui por infraestrutura tecnológica os serviços de informação, controle de qualidade, normalização e treinamento de pessoal especializado. Estes serviços são notoriamente deficientes no Brasil, sendo necessário, como já foi mencionado, reforçá-los substancialmente.

2) Medidas para utilização de equipamentos e processos mais modernos. Como a tecnologia industrial se incorpora em processos e equipamentos, o Estado pode fomentar a sua substituição por “safras” mais modernas mediante o uso de mecanismos fiscais, p.ex. admitindo a depreciação acelerada de ativos fixos em setores selecionados. Adicionalmente, tanto por instrumentos fiscais como creditícios, o Estado pode incentivar o leasing de máquinas mais modernas em setores escolhidos. Finalmente, cabe uma vez mais notar o papel que as empresas estatais podem desempenhar nesse processo, difundindo junto aos seus fornecedores o progresso técnico a que tem acesso tanto no país como no exterior.

 

4 – O aparato institucional da política científica e tecnológica

Conforme foi visto em seção anterior, na última década estruturou-se no Brasil um sistema institucional de formulação e implementação de política científica e tecnológica bastante complexo. A localização desse aparato dentro da máquina do Estado brasileiro parece adequada, especialmente a vinculação do seu órgão central, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) à secretaria de Planejamento da Presidência da República. Esta solução parece mais apropriada às características das atividades cientificas e tecnológicas, que permeiam vários Ministérios, do que a solução, frequentemente aventada, de um Ministério específico de Ciência e Tecnologia que, situado no mesmo plano dos demais Ministérios, faria face a problemas insuperáveis de coordenação e implementação de políticas. No entanto, do ângulo da política institucional de ciência e tecnologia, persistem alguns problemas importantes no sistema nacional, vistos a seguir.

4.1 – Informações

Apesar dos esforços feitos pelo CNPq, as informações disponíveis sobre as atividades científicas e tecnológicas seus executores, financiadores e sua aplicação ainda são muito precárias. A primeira parte deste trabalho sugeriu’ que o crescimento destas atividades no país no passado recente estão provavelmente substancialmente sobrestimado. Em contrapartida, há um grande desconhecimento do que É feito no setor industrial privado, O que limita seriamente a + formulação da política tecnológico. Um dos requisitos importantes ã execução da política tecnológica & a disponibilidade de informações acuradas sobre as diversas modalidades de mudança tecnológica vigentes no interior do sistema, industrial, bem como os respetivos papéis que desempenham no processo de crescimento de firmas e setores. Isto requer a compilação periódica de estatísticas sobre a geração, incorporação e difusão de inovações na «economia, permitindo assim a caracterização da natureza e do ritmo do progresso técnico em curso. Tal como ocorre com os demais indicadores econômicos, o levantamento de tais estatísticas só e factível quando amparado por critérios metodológicos nítidos e consistentes. Além dos levantamentos estatísticos tradicionais sobre a execução e gastos em pesquisa e desenvolvimento, tais como são feitos nos países da OECD e que deveriam ser adequados a as condições nacionais, explicitando-se as diferenças para efeitos &e comparação, uma metodologia que atende às finalidades acima é a da construção de matrizes de fluxos intersectorial de tecnologia, que descrevam as fontes geradoras e áreas. de aplicação das técnicas produtivas em uso na economia. «A partir deste tipo de matriz, e possível estabelecer uma classificação de indústrias segundo o poder de comando que estas exercem sobre a variável tecnológica, Existem indústrias cujo progresso técnico é predominantemente exógeno, no sentido de que são consumidoras de inovações produzidas em outros ramos de economia. O exemplo clássico & da têxtil: desde a revolução industrial o desenvolvimento tecnológico dessa indústria tem se baseado fundamentalmente na incorporação de inovações concebidas por fabricantes de equipamentos ou firmas da indústria química. Ao lado de facilitar o acesso às fontes de tecnologia aos competidores potenciais, isso retira das firmas dessa indústria a capacidade de influir no curso e no ritmo do progresso. Em contraposição, existem indústrias cujo progresso técnico e predominantemente endógeno. Nestas indústrias produtoras de inovações, o poder de comando de algumas empresas sobre a direção e a cadência do progresso técnico consiste no mecanismo primordial de competição.

Outras aplicações imediatas desta metodologia são a de indicar o grau de dependência das diferentes indústrias em relação a tecnologias importadas, o horizonte potencial de difusão de determinadas inovações, e os impactos macroeconômicos advindos de diferentes’ composições dos gastos em pesquisa e desenvolvimento. A Colaboração do setor privado industrial para o levantamento de informações como as acima sugeridas evidentemente, crucial. Esta cooperação trará, no entanto, retornos nível de cada empresa, – não sô através de um maior conhecimento do contexto macroeconômico que circunscreve suas atividades tecnológicas. Como pelos efeitos de uma política científica e tecnológica melhor concebida e executada

 

4.2 — Articulação entre a política científica e tecnológica e as demais políticas

 

N decorrer deste trabalho enfatizou se que a eficácia da política científica e tecnológica industrial depende de sua articulação com as demais medidas de política econômica. Apesar dos esforços feitos para o maior entrosamento do Conselho Científico e Tecnológico do CNPq com outros conselhos de política industrial (ex. Conselho de Desenvolvimento Industrial) e das “Ações Programadas” do CNPq, de âmbito setorial, às deficiências nesta área são enormes e tem frequentemente frustrado os propósitos da política tecnológica especialmente no que toca à indústria.

Cabe ressaltar que, mesmo completando-se a estruturação formal do Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia (SNDCT) mediante a (SNDCT) mediante a criação de órgãos setoriais no âmbito de cada Ministério, o problema radica mais fundo — na ausência de uma política industrial com objetivos setoriais e tecnológicos definidos. Somente com essa política, e a convergência das ações dos vários instrumentos da política econômica para alcançar os seus objetivos, será possível lograr a necessária articulação entre as políticas tecnológicas industriais explícitas e implícitas

 

4.3 – Representação dos Interesses Industriais

O Conselho Científico e Tecnológico do CNPq é composto de 31 membros, dos quais 16 são ex-officio (representantes de instituições governamentais e da Academia Brasileira) e 15 são membros individuais. A representação dos interesses industriais é, como se vê, não institucional e limitada

Esse fator limita seguramente a – fi a formulação de uma política científica e tecnológica adequada às necessidades e condições da indústria nacional. Dado o papel que esta deverá desempenhar no Processo de desenvolvimento tecnológico e científico parece legítimo, e útil para todos, que a representação industrial privada na formulação da política tecnológica nacional seja ampliada e institucionalizada.

 

 

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  1. Introdução: PNI e NPI
A Política Nacional de Informática (PNI) brasileira tem seis características principais: - A identificação da eletrônica como area estratégica do ponto de vista econômico, político e militar; - Estar baseada no mercado...

José Pelúcio Ferreira: a pesquisa dentro do Governo

Fabio S. Erber, FINEP- Homenagem à Pelúcio

Fabio Erber participou diretamente de duas iniciativas de José Pelúcio Ferreira visando institucionalizar atividades de pesquisas no âmbito do Estado: o Grupo de Pesquisas da FINEP, do qual foi o organizador e Coordenador de 1971 a 1974, e o Instituto de Estudos de Política Científica e Tecnológica do CNPq, em 1978, que não vingou. As duas iniciativas são brevemente descritas nesta Nota. A participação de Pelúcio na criação do atual Instituto de Economia da UFRJ mereceu mais destaque do que lhe foi dado no texto, mas detalhá-la iria além do propósito da Nota, que se concentra nas pesquisas feitas intra-muros governamentais.

Uma das facetas do apoio de José Pelúcio Ferreira às atividades de pesquisa no país foi a institucionalização desse tipo de atividades no interior das organizações que dirigiu.

Sua preocupação com o tema estava baseada na percepção de que era importante para os aparelhos de Estado contarem com fontes próprias de informação e análise para melhor elaborar, monitorar e modificar as políticas públicas de que estavam encarregados. A contratação de outras instituições, acadêmicas e de consultoria, não substituía o conhecimento decorrente da realização de pesquisas intra-muros.

Provavelmente, a longa experiência de Pelúcio no Departamento Econômico do BNDES, dedicado a estudos econômicos setoriais e regionais, foi importante para esta percepção. A forte presença no Rio de Janeiro de órgãos federais dedicados à pesquisa, como o IPEA e o IBGE, também vinculados ao Ministério do Planejamento, provavelmente reforçou sua orientação.

Da mesma forma, a vivência de Pelúcio no BNDES mostrou-lhe os problemas envolvidos na convivência, na mesma instituição, de departamentos operacionais e de pesquisa, cujos prazos e requisitos de informação são distintos. Pelúcio sempre teve presente que subordinar a área de pesquisa às áreas operacionais significava transformar a primeira em assessoria da segunda, acabando por eliminar as atividades de pesquisa propriamente ditas. Esta segunda percepção levou-o a dar forma institucional específica às atividades de pesquisa intra-muros, a proteger essas atividades contra as demandas por assessoria imediata advindas das áreas operacionais e dar aos gestores da pesquisa o tempo e as condições necessárias para a realização de seus trabalhos.

O autor desta Nota participou diretamente de duas iniciativas de Pelúcio visando institucionalizar atividades de pesquisas no âmbito do Estado: o Grupo de Pesquisas da FINEP, do qual foi o organizador e Coordenador de 1971 a 1974, e o Instituto de Estudos de Política Científica e Tecnológica do CNPq, em 1978, que não vingou. As duas iniciativas são brevemente descritas a seguir. A participação de Pelúcio na criação do atual Instituto de Economia da UFRJ merece mais destaque do que lhe é dado no texto, mas detalha-la iria além do propósito da Nota, que concentra-se nas pesquisas feitas intra-muros governamentais.

1. O Grupo de Pesquisas da FINEP

A primeira experiência que Pelúcio fez no sentido de estabelecer atividades de pesquisa orientadas para a política científica e tecnológica foi feita em 1971, através da constituição de um Grupo de Pesquisas no âmbito do Ministério do Planejamento, onde era Secretário Geral Adjunto. Por razões administrativas (por exemplo, a contratação de pessoal), esse Grupo (GPq) foi transferido para a FINEP em 1972, onde existiu até 1980.

Cabe notar que, no início da década de setenta, os temas de política científica e tecnológica não eram explorados pela comunidade acadêmica. Na área governamental, o IPEA tinha recém concluído três estudos pioneiros sobre a transferência de tecnologia e atividades dos institutos de pesquisa tecnológica1, mas não manifestou interesse em dar continuidade a essa linha de trabalho.  Mesmo na área internacional, a literatura sobre esses temas ainda era incipiente.

Ou seja, o GPq veio a ocupar um campo em que a tradição de pesquisa no Brasil era muito limitada2. A isto associou-se a juventude dos seus membros e sua limitada experiência acadêmica3.  Visto em retrospecto, Pelúcio era um tomador de riscos.

Em sua primeira fase (1971/74), o GPq concentrou suas atividades em projetos que tinham forte proximidade com as prioridades da política econômica do período, como o desenvolvimento tecnológico da indústria de bens de capital e da indústria petroquímica e a demanda das empresas estatais por equipamentos e serviços tecnológicos. Composto por uma equipe multidisciplinar, em que haviam economistas, sociólogos e um engenheiro, desenvolveu métodos de pesquisa qualitativos apropriados a esses temas e inseriu-se na comunidade internacional, participando de projetos de pesquisa multinacionais.

Entre 1975 e 1978, sob a direção de José Tavares de Araújo Jr e, no fim do período, de Marcelo Paiva Abreu, o GPq abriu substancialmente o leque de pesquisas e recrutou diversos pesquisadores sênior, como Luciano Martins, Maria da Conceição Tavares e Simon Schvartzman, que realizaram importantes projetos sobre a burocracia brasileira, a organização da indústria nacional e a evolução da comunidade científica no país, além de dar continuidade aos estudos setoriais (a exemplo das indústrias farmacêutica  e de alimentos).

A partir de 1979, o afastamento de Pelúcio da FINEP coincide com a saída de vários técnicos sênior do GPq. Parte destes técnicos foi, junto com Pelúcio, montar o programa de pós-graduação e pesquisa da Faculdade de Economia da UFRJ, que, a seguir ganhou personalidade específica como o Instituto de Economia Industrial4. Pelúcio teve importante participação neste processo, tendo sido o Vice-diretor do Instituto, até afastar-se para dedicar-se à Fundação Leonel Franca da PUC/RJ.

Em 1980, com a nova mudança na direção da FINEP, o GPq foi extinto.

Foge aos propósitos desta Nota avaliar plenamente os resultados obtidos pelo GPq, mas cabe ressaltar que, entre estes destacam-se:

  • Uma robusta produção acadêmica
  • Legitimar e ajudar a consolidação da área de pesquisa em ciência e tecnologia na academia
  • Importantes contribuições para a política científica e tecnológica do país, como a concepção e avaliação de programas de apoio
  • Formar quadros técnicos, parte dos quais permaneceu na FINEP e outra parte foi trabalhar na academia e no setor público federal e estadual

2. O Instituto de  Estudos de Política Científica e Tecnológica

Em 1978, Pelúcio era Vice-Presidente do CNPq (além de Presidente da FINEP). Aproximando-se o fim do Governo Geisel, resolveu tentar uma institucionalização das atividades de pesquisa em política científica e tecnológica mais ambiciosa, estabelecendo um Instituto com esse fim junto ao CNPq. Uma proposta de constituição do referido Instituto foi elaborada pelo Dr. L. F. Candiota e pelo autor e submetida ao Conselho. No entanto, dissensões internas dentro do CNPq impediram que fosse implementada antes do fim do Governo. A administração subseqüente do CNPq abandonou a proposta. Na segunda metade dos anos oitenta, a idéia foi retomada no MCT, mas teve curta duração.

Escolha de tecnologias, preços dos fatores...

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Escolha de tecnologias, preços dos fatores de produção e dependência – uma contribuição ao debate

Fabio S. Erber, Pesquisa e Planejamento Econômico, Rio de Janeiro, 2(1): 105-116, jun 1972

Este artigo é uma contribuição ao debate sobre os resultados finais, em termos de emprego, do processo de industrialização no mundo subdesenvolvido. Ele discute os trabalhos realizados pelo IPEA por Sena, Goodman e Cavalcanti e por Bacha, da Mata e Modenesi. Resumidamente, diagnosticaram esses autores o custo relativamente baixo de capital em relação ao custo da mão de obra, que teria levado os empresários a adotar técnicas altamente intensivas de capital e sugere que a manipulação dos preços relativos dos dois fatores, através da redução do custo do trabalho, levaria os empresários a dotar técnicas mais intensivas de mão de obra. A análise do custo e da composição do capital foi realizada nas seções 1 e 2, enquanto a suposição de homogeneidade do fator trabalho foi discutida na seção 3. Erber chamou também a atenção, na seção 4, para a fato de que a escolha de tecnologias ocorre no momento da opção pelo produto e na formulação do projeto. Na última seção, coloca algumas dúvidas adicionais.

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