José Pelúcio Ferreira: a pesquisa dentro do Governo

Fabio S. Erber, FINEP- Homenagem à Pelúcio

Fabio Erber participou diretamente de duas iniciativas de José Pelúcio Ferreira visando institucionalizar atividades de pesquisas no âmbito do Estado: o Grupo de Pesquisas da FINEP, do qual foi o organizador e Coordenador de 1971 a 1974, e o Instituto de Estudos de Política Científica e Tecnológica do CNPq, em 1978, que não vingou. As duas iniciativas são brevemente descritas nesta Nota. A participação de Pelúcio na criação do atual Instituto de Economia da UFRJ mereceu mais destaque do que lhe foi dado no texto, mas detalhá-la iria além do propósito da Nota, que se concentra nas pesquisas feitas intra-muros governamentais.

Uma das facetas do apoio de José Pelúcio Ferreira às atividades de pesquisa no país foi a institucionalização desse tipo de atividades no interior das organizações que dirigiu.

Sua preocupação com o tema estava baseada na percepção de que era importante para os aparelhos de Estado contarem com fontes próprias de informação e análise para melhor elaborar, monitorar e modificar as políticas públicas de que estavam encarregados. A contratação de outras instituições, acadêmicas e de consultoria, não substituía o conhecimento decorrente da realização de pesquisas intra-muros.

Provavelmente, a longa experiência de Pelúcio no Departamento Econômico do BNDES, dedicado a estudos econômicos setoriais e regionais, foi importante para esta percepção. A forte presença no Rio de Janeiro de órgãos federais dedicados à pesquisa, como o IPEA e o IBGE, também vinculados ao Ministério do Planejamento, provavelmente reforçou sua orientação.

Da mesma forma, a vivência de Pelúcio no BNDES mostrou-lhe os problemas envolvidos na convivência, na mesma instituição, de departamentos operacionais e de pesquisa, cujos prazos e requisitos de informação são distintos. Pelúcio sempre teve presente que subordinar a área de pesquisa às áreas operacionais significava transformar a primeira em assessoria da segunda, acabando por eliminar as atividades de pesquisa propriamente ditas. Esta segunda percepção levou-o a dar forma institucional específica às atividades de pesquisa intra-muros, a proteger essas atividades contra as demandas por assessoria imediata advindas das áreas operacionais e dar aos gestores da pesquisa o tempo e as condições necessárias para a realização de seus trabalhos.

O autor desta Nota participou diretamente de duas iniciativas de Pelúcio visando institucionalizar atividades de pesquisas no âmbito do Estado: o Grupo de Pesquisas da FINEP, do qual foi o organizador e Coordenador de 1971 a 1974, e o Instituto de Estudos de Política Científica e Tecnológica do CNPq, em 1978, que não vingou. As duas iniciativas são brevemente descritas a seguir. A participação de Pelúcio na criação do atual Instituto de Economia da UFRJ merece mais destaque do que lhe é dado no texto, mas detalha-la iria além do propósito da Nota, que concentra-se nas pesquisas feitas intra-muros governamentais.

1. O Grupo de Pesquisas da FINEP

A primeira experiência que Pelúcio fez no sentido de estabelecer atividades de pesquisa orientadas para a política científica e tecnológica foi feita em 1971, através da constituição de um Grupo de Pesquisas no âmbito do Ministério do Planejamento, onde era Secretário Geral Adjunto. Por razões administrativas (por exemplo, a contratação de pessoal), esse Grupo (GPq) foi transferido para a FINEP em 1972, onde existiu até 1980.

Cabe notar que, no início da década de setenta, os temas de política científica e tecnológica não eram explorados pela comunidade acadêmica. Na área governamental, o IPEA tinha recém concluído três estudos pioneiros sobre a transferência de tecnologia e atividades dos institutos de pesquisa tecnológica1, mas não manifestou interesse em dar continuidade a essa linha de trabalho.  Mesmo na área internacional, a literatura sobre esses temas ainda era incipiente.

Ou seja, o GPq veio a ocupar um campo em que a tradição de pesquisa no Brasil era muito limitada2. A isto associou-se a juventude dos seus membros e sua limitada experiência acadêmica3.  Visto em retrospecto, Pelúcio era um tomador de riscos.

Em sua primeira fase (1971/74), o GPq concentrou suas atividades em projetos que tinham forte proximidade com as prioridades da política econômica do período, como o desenvolvimento tecnológico da indústria de bens de capital e da indústria petroquímica e a demanda das empresas estatais por equipamentos e serviços tecnológicos. Composto por uma equipe multidisciplinar, em que haviam economistas, sociólogos e um engenheiro, desenvolveu métodos de pesquisa qualitativos apropriados a esses temas e inseriu-se na comunidade internacional, participando de projetos de pesquisa multinacionais.

Entre 1975 e 1978, sob a direção de José Tavares de Araújo Jr e, no fim do período, de Marcelo Paiva Abreu, o GPq abriu substancialmente o leque de pesquisas e recrutou diversos pesquisadores sênior, como Luciano Martins, Maria da Conceição Tavares e Simon Schvartzman, que realizaram importantes projetos sobre a burocracia brasileira, a organização da indústria nacional e a evolução da comunidade científica no país, além de dar continuidade aos estudos setoriais (a exemplo das indústrias farmacêutica  e de alimentos).

A partir de 1979, o afastamento de Pelúcio da FINEP coincide com a saída de vários técnicos sênior do GPq. Parte destes técnicos foi, junto com Pelúcio, montar o programa de pós-graduação e pesquisa da Faculdade de Economia da UFRJ, que, a seguir ganhou personalidade específica como o Instituto de Economia Industrial4. Pelúcio teve importante participação neste processo, tendo sido o Vice-diretor do Instituto, até afastar-se para dedicar-se à Fundação Leonel Franca da PUC/RJ.

Em 1980, com a nova mudança na direção da FINEP, o GPq foi extinto.

Foge aos propósitos desta Nota avaliar plenamente os resultados obtidos pelo GPq, mas cabe ressaltar que, entre estes destacam-se:

  • Uma robusta produção acadêmica
  • Legitimar e ajudar a consolidação da área de pesquisa em ciência e tecnologia na academia
  • Importantes contribuições para a política científica e tecnológica do país, como a concepção e avaliação de programas de apoio
  • Formar quadros técnicos, parte dos quais permaneceu na FINEP e outra parte foi trabalhar na academia e no setor público federal e estadual

2. O Instituto de  Estudos de Política Científica e Tecnológica

Em 1978, Pelúcio era Vice-Presidente do CNPq (além de Presidente da FINEP). Aproximando-se o fim do Governo Geisel, resolveu tentar uma institucionalização das atividades de pesquisa em política científica e tecnológica mais ambiciosa, estabelecendo um Instituto com esse fim junto ao CNPq. Uma proposta de constituição do referido Instituto foi elaborada pelo Dr. L. F. Candiota e pelo autor e submetida ao Conselho. No entanto, dissensões internas dentro do CNPq impediram que fosse implementada antes do fim do Governo. A administração subseqüente do CNPq abandonou a proposta. Na segunda metade dos anos oitenta, a idéia foi retomada no MCT, mas teve curta duração.