//

A Indústria Petroquímica Brasileira: Regulação e Desempenho

Fabio S. Erber, Este artigo (paper avulso) foi escrito para a CEPAL, Comissão Econômica para a America Latina e o Caribe, entre maio e agosto de 1995.

O artigo é composto por quatro seções. Na introdução apresenta as características socioeconômicas da indústria petroquímica. A seção seguinte expõe a história do setor, seguindo uma periodização. A terceira seção comenta a evolução da capacitação tecnológica do setor. A última seção volta ao tema da regulação e do desenvolvimento do setor, analisando a situação à época.

1. Introdução

O complexo petroquímico, entendido como o conjunto de atividades industriais que vai do petróleo a transformação de plásticos, resinas e outros derivados do petróleo constituem um dos pilares da industrialização moderna. O cerne deste complexo é constituído pelas atividades industriais que, partindo da nafta ou do gás, através de processamentos sucessivos, produzem os insumos que serão posteriormente utilizados em bens finais – a indústria petroquímica. Este artigo centra-se sobre esta cadeia produtiva, tratando os problemas atinentes às suas duas pontas – de um lado, a oferta de matéria-prima (nafta, no caso brasileiro) e, de outro, a transformação dos produtos petroquímicos em bens finais (p.ex. artefatos de plástico, tintas, etc.) – somente na sua interseção com a indústria petroquímico estrito senso.

A base técnica da indústria petroquímico e caracterizada pela dominância de processos contínuos, intensivos em capital e sujeitos a margens de tolerância restritas. A cadeia produtiva também obedece a margens restritas, com elos fortemente vinculados. O progresso técnico na indústria e intenso, embora tenha características distintas ao longo da cadeia: a jusante, junto às centrais de matérias primas, os produtos e processos são padronizados e o progresso técnico centra-se em atividades de engenharia. Descendo a cadeia, produtos e processos tornam-se mais heterogêneos e cresce a importância de atividades de pesquisa e desenvolvimento, estrito senso. Os produtos tornam-se mais especializados e substitutos entre si. No passado recente, uma grande gama de novos produtos, fabricados em menor escala e de alto valor agregado (“especialidades”) foram introduzidos. Em todos os elos da cadeia há grandes esforços de otimização de processos (p.ex. visando reduzir o consumo de energia e de insumos) e há uma tendência ao crescente uso de instrumentação eletrônica digital. 

A indústria petroquímica e marcada por fortes economias de escala, estáticas e dinâmicas, e por economias de escopo, seja na produção seja em atividades de pesquisa e desenvolvimento, comercialização, administração e financiamento. Economias de verticalização e aglomeração são igualmente significativas. As escalas econômicas mínimas apresentam tendência crescente e, assim, a indústria tende a expandir-se descontinuamente, ampliando a capacidade a frente da demanda. As características técnico-econômicas da indústria e o padrão de intensa competição oligopólica, a nível internacional, tendem a produzir ciclos de investimento, produção e preços. Quando o mercado internacional de produtos petroquímicos se encontra sobre-ofertado, como no fim dos anos oitenta e início dos noventa, as empresas frequentemente praticam preços de exportação que não cobrem os custos totais de produção mas apenas os custos variáveis, caracterizando uma situação de dumping estrutural. Embora o progresso técnico confira a petroquímico uma fronteira de expansão, criando novos usos para seus produtos e mercê da substituição de outros insumos (p.ex. papel, madeira e metais), a demanda por seus produtos e fortemente afetada pela evolução da renda pessoal disponível. 

Como decorrência das suas características técnico-econômicas, a configuração natural da indústria petroquímico e o oligopólio. O cerne deste oligopólio, desde suas origens, e constituído por empresas petrolíferas que avançaram a jusante da cadeia e por grandes empresas químicas que diversificaram sua produção. A estas empresas, de porte verdadeiramente gigantesco e de atuação mundial, integradas vertical e horizontalmente, somam-se outras, de menor porte, que atuam em mercados específicos, explorando vantagens sejam tecnológicas sejam de canais de comercialização1. Nas duas últimas décadas, a estrutura empresarial do setor foi alterada pela entrada de novos produtores, localizados no Oriente Médio e Extremo, atuando principalmente em commodities e por fortes movimentos de reestruturação dos ocupantes tradicionais, que reforçaram suas posições na ponta da cadeia, orientando-se para especialidades de maior valor agregado. Não obstante, a dinâmica da indústria e sua regulação continuam a depender fundamentalmente dos dois primeiros tipos de empresas. 

As características técnico-econômicas da indústria petroquímico, notadamente sua integração vertical e horizontal, a indivisibilidade e o caráter cíclico de seus investimentos e a variedade de produtos intensivos em tecnologias específicas, levam-na a uma trajetória em que estão combinados mecanismos de regulação hierárquica (p.ex. via integração vertical) com mecanismos de mercado e mecanismos de cooperação (p.ex. acordos de divisão de mercados e de troca de tecnologia). Este complexo regime de regulação induz a participação dos Estados nacionais, tanto pelo seu sucesso como pelos seus fracassos. O sucesso da regulação, que define privilégios para os que dela participam, estimula o Estado a envolver-se, estabelecendo condições para que firmas locais entrem e permaneçam em uma indústria que e considerada estratégica para o desenvolvimento econômico. Os fracassos da regulação, que produzem os ciclos da indústria, também levam o Estado a participar, defensivamente. Em consequência, a regulação da indústria petroquímico também envolve mecanismos de atuação estatal, além dos citados acima. Em muitos países (França, Itália, Holanda, os NICs asiáticos, México, Venezuela) o Estado participa diretamente da indústria através de empresas total ou parcialmente sob seu controle2, embora esta forma de regulação tenha se reduzido no passado recente. Mesmo quando não é um produtor, o Estado participa da regulação da indústria, p.ex. estabelecendo condições de entrada (inclusive quanto a escala de produção e fonte de tecnologia) e suprimento de matéria-prima ou monitorando sua reestruturação mediante instrumentos de coordenação, como o MITI no caso japonês, e de regulação da competição, como a legislação antitruste e de defesa contra práticas desleais de comércio exterior. De forma mais indireta, em todos os países o Estado afeta a competitividade sistêmica das indústrias locais mediante a provisão de infraestrutura econômica e tecnológica e mediante as políticas fiscal, cambial e educacional. 

No Brasil, dados do Censo de 1985 sugerem que o setor petroquímico respondia por 4% do valor bruto da produção da indústria de transformação e 3.2% do valor agregado desta. Refletindo sua natureza intensiva em capital, sua participação no pessoal ocupado era de 0.73% e no número de estabelecimentos de 0.28%3. Dados mais recentes da ABIQUIM levam a uma estimativa de vendas totais do setor da ordem de US$ 12 bilhões em 19944.

Criado em menos de três décadas, o setor petroquímico brasileiro foi implantado e amadureceu dentro de um complexo aparato regulatório estatal, que também foi se transformando com o tempo. Em consequência, a periodização adotada a seguir tem dois fios condutores que se entrelaçam: a expansão do setor e o aparato regulatório que o rege.

A história da indústria petroquímico brasileira pode assim ser dividida em quatro etapas: a primeira abarca a década que vai da metade dos anos cinquenta até meados dos sessenta, quando são feitos os primeiros investimentos no setor, notadamente em São Paulo e o regime de regulação do setor mantém-se indefinido. A etapa subsequente marca a implantação da indústria pela instalação sequencial dos três pólos petroquímicos, em São Paulo (1965/72), Camaçari /Bahia (1972/78) e Triunfo /Rio Grande do Sul (1978/82), dentro de um regime regulatório estatal específico, que vai amadurecendo de pólo a pólo. A terceira etapa, que se estende até o fim dos anos oitenta, e caracterizada, especialmente na segunda metade da década, pelo simultâneo amadurecimento da indústria e pelo início da deterioração do aparato regulatório do Estado. Os anos 1990/92 assinalam uma nova fase no seu desenvolvimento, caracterizada pela crise econômica e de regulação do setor. Finalmente, durante o período 1993/95 mantém-se a indefinição quanto ao regime regulatório mas a recuperação dos mercados externo e interno dão um fôlego adicional ao setor. O Quadro 1, a seguir, apresenta a estrutura das vendas totais, vendas internas e externas e importações por produtos petroquímicos em 1994 e as Figuras 1 a 3 mostram a configuração dos três pólos.

O artigo é composto por três seções, além desta. A seção seguinte expõe a história do setor, seguindo a periodização acima. A terceira seção comenta a evolução da capacitação tecnológica do setor. A última sessão volta ao tema da regulação e do desenvolvimento do setor, analisando a situação presente. 

2. A Evolução da Petroquímico no Brasil

2.1. Fase I: Primeiros Investimentos e Indefinição Institucional

A história da indústria petroquímico brasileira está intimamente associada à da PETROBRAS, criada em 1954 como empresa de capital misto sob controle da União e a qual está atribui o exercício do seu monopólio da exploração e refino do petróleo. Este monopólio tornava a PETROBRAS um ator necessário a petroquímico. Embora não houvesse menção explícita a essa indústria na Lei que criou a PETROBRÁS, havia receios que o monopólio fosse estendido a jusante do refino, abrangendo a petroquímico. Para afastá-los, o Conselho Nacional do Petróleo (CNP), órgão regulador do setor, estabeleceu, em 1954, que a implantação da petroquímico caberia prioritariamente e sempre que possível ao capital privado. Este, constituído principalmente por filiais de empresas multinacionais, concentrou seus investimentos em produtos finais.

Face aos reduzidos investimentos privados, em 1957, o CNP autorizou a PETROBRAS a atuar no setor para garantir o suprimento de matérias-primas básicas e produtos essenciais, prefigurando uma divisão de tarefas entre o Estado e a iniciativa privada que mais tarde seria consolidada.

Assim, neste período, os investimentos no setor são liderados pela PETROBRAS, que produz quantidades reduzidas de aromáticos, eteno e propeno na refinaria de Cubatão em São Paulo e borracha de butadieno-estireno (SBR) na FABOR (atualmente Petroflex) e por firmas multinacionais nos setores finais, principalmente termoplásticos, elastômeros e intermediários para fibras. A participação de capitais privados nacionais e quase negligenciável.

A escala das plantas é muito reduzida (28 mil t para eteno, 10 mil t para PVC, 7000 t para PEAD, etc.) e a tecnologia e toda importada. Não obstante, registram-se importantes esforços de assimilação da tecnologia na FABOR e de nacionalização dos serviços de engenharia e de bens de capital, fruto dos investimentos da PETROBRAS em formação de recursos humanos e domínio da tecnologia na área de refino.

2.2. Fase II: Constituição da Indústria e do Regime de Regulação

O regime político que se estabelece após o golpe de 1964, atribui prioridade à indústria petroquímico, com forte orientação privatista. Assim, em 1965, Resolução do CNP estabelece que o setor caberia a iniciativa privada, inclusive os produtos básicos, definindo as normas para instalação de plantas. No mesmo ano definem-se vários incentivos que gozavam os projetos aprovados pelo Grupo Executivo da Indústria Químicas (GEIQUIM) do Conselho de Desenvolvimento industrial: isenção de impostos para equipamentos importados, redução de impostos para importação de matérias-primas, garantias de financiamento ou aval do Governo para empréstimos externos, proteção tarifária e administrativa contra importações de produtos similares e, finalmente, a não-aprovação de projetos competitivos. Em paralelo, porém, técnicos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE) e da PETROBRAS elaboravam estudos visando ampliar a participação estatal na petroquímico.

Neste quadro, a Union Carbide inicia um projeto de produção de eteno de 120 mil t/ano e uma joint-venture entre grupos nacionais (Ultra, Moreira Salles e Capuava) e a Phillips Petroleum constitui a Petroquímico União (PQU) visando a produção de 167 mil t/ano de eteno. Em paralelo, segundo Suarez (1986), o grupo Capuava articulou uma série de empreendimentos nas gerações intermediárias e finais sob a forma de joint-ventures entre empresas privadas nacionais e estrangeiras. 

Problemas técnicos inviabilizaram porém o projeto da Union Carbide e problemas financeiros levaram a Phillips a abandonar o projeto da PQU, criando um vácuo que iria mudar a história da petroquímico brasileira. Para preencher este espaço, a PETROBRAS criou, no fim de 1967, com base nos estudos realizados em conjunto com o BNDE, uma subsidiária – Petroquisa, PETROBRAS Químicas S.A.

A Petroquisa assume em 1968 participação acionária na PQU (central de matérias-primas), tornando-se, poucos anos depois, o acionista majoritário. A jusante, várias filiais de grupos internacionais já estabelecidos no país, como Rhodia, Dow, Union Carbide e Solvay, ampliam seus investimentos e grupos nacionais, especialmente Ultra, Capuava (mais tarde Unipar) e Cevekol, estabelecem joint-ventures com firmas estrangeiras. Algumas destas joint-ventures assumem a forma tripartite com a participação acionária da Petroquisa e o sócio estrangeiro fornecendo a tecnologia, modelo que mais tarde será generalizado.

As plantas deste pólo, que entram em operação no período 1972/74, já são de escala internacional (eteno: 300 000 t, cloreto de vinila monômero (MVC): 100 000 t, etc) e, para sua implantação, contaram com financiamentos externos importantes, especialmente sob a forma de créditos de fornecedores, geralmente negociados pelo fornecedor de tecnologia, além dos incentivos governamentais acima mencionados. Em consequência, a participação local no suprimento de bens de capital e serviços de engenharia foi bastante reduzida.

A expansão da economia brasileira no período do “milagre”, multiplicou o consumo de produtos petroquímicos por 2,3. Este foi atendido principalmente por importações, que passam de 35% da demanda em 1968 a 42% em 1972 As importações cresceram especialmente em produtos intermediários, onde respondem por 54% do consumo em 1972, contra 35% em 1968 (dados de Erber e Vermulm 1993, p. 80).

Em consequência, ao mesmo tempo em que completava-se o pólo de São Paulo iniciava-se um debate sobre a estratégia de expansão do setor, contrapondo-se a alternativa de ampliar o pólo paulista, situado junto ao principal mercado consumidor do país, a de implantar um novo pólo, localizado na Bahia. Ao cabo de dois anos de intensa disputa, técnica e política, prevaleceu a segunda alternativa, justificada principalmente por critérios de descentralização das atividades industriais e de de desenvolvimento industrial do Nordeste brasileiro.

Do ponto de vista produtivo, o pólo de Camaçari foi concebido de forma integrada, articulando os investimentos das centrais de matérias-primas e utilidades com os das plantas a jusante, de forma a maximizar as economias de escala e aglomeração. As plantas tinham escala internacional (p.ex. eteno 388 mil t, MVC 150 mil t, PEBD 100 mil t). Conforme pode ser visto no Quadro 2, a participação nacional em engenharia de detalhe e outros serviços técnicos foi substancial e em equipamentos e materiais foi de 60%. A tecnologia de processo foi suprida do exterior, seja contratada (para as centrais) seja como aporte de capital dos sócios estrangeiros (nas empresas a jusante).

Do ponto de vista empresarial, definiu-se que a central de matérias-primas (COPENE), responsável também pelas centrais de utilidades (água, energia) e manutenção, seria de propriedade conjunta da Petroquisa, encarregada de sua implantação, e das firmas a jusante, cabendo a primeira a maioria do capital. Para as firmas a jusante, o modelo adotado foi de participação tripartite, entre sócios privados nacionais e estrangeiros e o Estado, de forma a assegurar, simultaneamente, a maioria privada e a maioria nacional no capital. Este modelo foi implementado de forma flexível: das dezenove empresas que constituíam inicialmente o pólo, 15 seguiam o modelo do tripé, das quais 13 tinham a Petroquisa como sócio estatal e duas o BNDE5 (Bastos, 1989).

Os sócios estrangeiros das firmas a jusante eram, na maioria, entrantes no mercado brasileiro, destacando-se a participação de firmas japonesas6. Poucas empresas estrangeiras participaram de mais de um empreendimento, caracterizando uma intervenção sem sinergia7. Os sócios estrangeiros participaram dos empreendimentos principalmente através da capitalização da tecnologia. Segundo as estimativas de Suarez (1986), esse aporte teria correspondido a 3.4% do total de recursos investidos no pólo.

Os sócios nacionais privados eram, em sua maioria, inexperientes no setor petroquímico e, mesmo, em atividades industriais, destacando-se a participação de grupos da construção civil e do setor financeiro, normalmente oriundos da região. Dos grupos já atuantes no pólo de São Paulo, participaram mais ativamente apenas dois (Ultra e Cevekol), tendo o principal grupo paulista (Unipar) ficado de fora, seja por razões financeiras seja por discordar da interferência do Estado no pólo.

É importante notar que, mesmo que a escala das plantas fosse competitiva, o tamanho das empresas era muito pequeno em termos internacionais e que estas tendiam a concentrar sua produção em uma gama muito reduzida de produtos, contando com uma ou duas plantas apenas. Em consequência, a sinergia do sistema dependia do pólo.

Coube a Petroquisa o papel de principal articulador do pólo. Cabe lembrar que a nafta que abastecia o pólo era suprida pela PETROBRAS, em regime de monopólio. Como vimos, a Petroquisa participava como sócio majoritário nas centrais e minoritário na maioria das firmas a jusante, o que lhe dava uma visão de conjunto que nenhum outro sócio detinha. Este poder era reforçado pelo conhecimento técnico derivado da experiência do pólo de São Paulo e dos recursos humanos disponíveis na PETROBRAS, onde, além da experiência de implantar e operar refinarias, contava-se com um Centro de Pesquisa (CENPES)8, dotado, a partir de 1972, de uma Divisão de Petroquímico e Polímeros. 

Na constituição das empresas a jusante a Petroquisa participou ativamente no processo de escolha dos projetos (produtos e tecnologia) do pólo e dos respectivos sócios, escolhas intimamente vinculadas pelo papel do sócio estrangeiro como fornecedor da tecnologia9. Finalmente, na implantação desses projetos a participação do corpo técnico da Petroquisa foi também muito ativa. Não obstante, os acordos de acionistas estabelecidos para a constituição das empresas conferiam aos demais acionistas virtual poder de veto em decisões estratégicas.

A intervenção do Estado na constituição financeira do pólo de Camaçari foi igualmente abrangente. Os incentivos fiscais concedidos pelo CDI para aquisição de equipamentos nacionais e importados foram ampliados e a estes somaram-se os incentivos regionais que envolviam a isenção do imposto de renda, a redução do imposto de circulação de mercadorias para aplicação em programas de expansão e mecanismos de capitalização das empresas através de participações acionárias vinculadas a incentivos fiscais (principalmente o FINOR – Fundo de Investimentos do Nordeste). 

Ao mesmo tempo, o BNDE e suas subsidiárias acionaram diversos mecanismos de financiamento de longo prazo para os investimentos fixos e o capital de giro inicial e para capitalização das empresas do pólo, seja com recursos próprios seja de outras fontes institucionais. Parte destes financiamentos, concedidos nos anos 1974/75, continha uma forte taxa de subsídio ao prefixar a correção monetária em 20% a.a., muito inferior às taxas inflacionárias efetivas.

O Quadro 3, que apresenta as fontes dos investimentos do pólo da Bahia, ao não registrar todos os incentivos fiscais, capta apenas parcialmente a participação do Governo. Não obstante, atesta a importância dos instrumentos acima mencionados, especialmente o sistema BNDE e o FINOR, responsáveis por quase dois terços dos recursos utilizados. O mesmo Quadro registra ainda a baixa aplicação de fundos próprios pelos acionistas privados, nacionais e estrangeiros, estes ainda mais que aqueles. Considerando que esses acionistas viriam a deter, em regra, um terço das empresas a jusante e uma participação proporcional na central, a alavancagem propiciada por seu investimento era, sem dúvida, excepcional, aumentada pelo poder conferido pelos acordos de acionistas. Assim, é possível que uma parte dos incentivos concedidos tenha sido redundante.

Finalmente, o referido Quadro mostra a reduzida participação dos financiamentos externos na constituição do pólo, o que explica o alto conteúdo nacional no suprimento de equipamentos e engenharia acima citado. Conforme apontam Araujo Jr. e Dick (1974), o tratamento dado ao financiamento externo, definido residualmente e em função das reais necessidades de importação, distingue o processo de implantação do pólo de outros programas setoriais contemporâneos, como o siderúrgico, onde a disponibilidade de recursos externos era definida ex-ante e condicionava o suprimento local. Embora tenha constituído um importante estímulo à indústria de bens de capital sob encomenda local, consentâneo com as prioridades da época, essa estrutura de financiamento e suprimento deve ter contribuído para encarecer o pólo, devido a tendência dos bens locais de custarem mais que os importados, justificando, em parte, os incentivos recebidos. 

Do ponto de vista tecnológico, a atuação da Petroquisa, PETROBRAS e do INPI (Instituto Nacional da Propriedade industrial) constituíram os principais instrumentos utilizados, posto que a FINEP teve atuação restrita no período. Completava a regulação estatal da tecnologia o controle da CACEX sobre as importações de bens de capital.

Finalmente, é importante recordar que a combinação de um número muito pequeno de ofertantes no mercado interno, frequentemente monopolistas, com uma proteção contra importações na prática infinita, assegurava as firmas que se implantavam no pólo condições de mercado excepcionais, ampliadas pela demanda crescente de produtos petroquímicos.

Este complexo aparato regulatório encontrava seu locus de articulação no CDI, também responsável pela concessão de benefícios fiscais. Embora em tese um projeto pudesse prescindir de uma aprovação do Conselho, na prática, dada a extensão dos incentivos governamentais e a necessidade de integrar-se ao pólo para receber insumos, essa chancela constituía condição necessária ao estabelecimento de uma empresa petroquímico.

No contexto da política de alto crescimento da década de setenta, as estimativas de crescimento do mercado interno apontavam para a necessidade de ampliar substancialmente a oferta de produtos petroquímicos. O debate entre as alternativas de expandir os pólos existentes ou criar um novo pólo repete-se e, uma vez mais, a segunda opção é escolhida, decidindo-se, em 1975, localizar o novo complexo em Triunfo, no Sul do país, região que respondia na época por cerca de 20% do mercado interno de produtos petroquímicos, tinha acesso fácil a outros mercados, inclusive da América Latina, e atendia aos objetivos de descentralização econômica.

Apesar das estimativas otimistas e da prioridade atribuída a petroquímico no II Plano de Desenvolvimento Nacional (1975/79), o pólo do Sul só teve início em 1978, possivelmente como reflexo dos percalços sofridos pelo Plano a partir de 1976, com o recrudescimento da inflação e os conflitos entre os objetivos de expansão industrial e estabilização de preços. Provavelmente pelos mesmos motivos, sua dimensão inicial (e atual) é muito menor que a dos outros pólos, tendo partido em 1982 apenas com a Central (COPESUL) e duas empresas a jusante, as quais vieram a somar-se três outras até 1984 e duas mais até o presente. Pelo menos seis projetos foram desativados e/ou suspensos. No entanto, as plantas estabelecidas tinham dimensão internacional e capacidade maior que a dos outros pólos (eteno: 420 mil t, PEBD: 115 mil t, PEAD: 104 mil t).

Embora pautada pela experiência dos dois pólos anteriores e seguindo o modelo de Camaçari, a implantação do pólo de Triunfo apresenta algumas modificações importantes em relação ao modelo original.

A mais importante diz respeito à ênfase atribuída ao domínio da tecnologia, em consonância com os objetivos do II PND. Para o novo pólo o CDI baixa em 1976 um edital que convoca as empresas que desejassem ali se implantar a apresentarem propostas, que seriam priorizadas segundo os seguintes critérios: “contratos de transferência de tecnologia de acordo com os princípios estabelecidos no Ato n. 15 do INPI; propostas contemplando programa de absorção e desenvolvimento de tecnologia; internalização dos serviços de engenharia de detalhamento e estabelecimento de condições para maior participação local na engenharia básica e maximização da oferta de equipamentos e materiais de origem nacional” (Bastos, 1989 p.101). 

Para tanto, convergiam vários instrumentos de política: o reforço pelo INPI (através do Ato Normativo 15), das exigências de transferência de tecnologia e de condições de barganha das empresas nacionais; o estabelecimento pela FINEP de linha de crédito para desenvolvimento tecnológico de empresas nacionais; pressões do BNDE para a internalização de atividades tecnológicas nos projetos que financiasse; a criação pela Petroquisa de uma Gerência técnica (GETEC) com funções de avaliar tecnologias e coordenar e estimular as atividades de absorção e desenvolvimento de tecnologias pela empresa e suas controladas/coligadas e, finalmente, o fortalecimento da capacidade de engenharia básica e de petroquímico do CENPES. 

No entanto, ao lado desse reforço dos instrumentos de política tecnológica, o novo pólo contava com menores incentivos governamentais para investimentos que Camaçari: não existiam os benefícios fiscais e mecanismos de capitalização específicos a região Nordeste e o aporte de recursos pelo sistema BNDE foi mais reduzido, ampliando-se a participação no financiamento dos investimentos de agências internacionais (BID e BIRD) e de créditos de fornecedores.

Provavelmente por essas razões a capacidade de “chamada” de novos grupos nacionais privados foi também mais reduzida: a central do novo pólo (COPESUL) foi montada apenas com recursos públicos (Petroquisa e BNDE) e, das sete firmas a jusante, quatro representavam extensões de empresas já atuantes no setor, uma das quais era subsidiária da Petroquisa. Nas demais, os sócios privados eram grupos regionais.

As seis firmas privadas foram estabelecidas, direta ou indiretamente, sob o modelo tripartite. No entanto, a diferença de Camaçari, nenhuma contava com capitais japoneses. A participação dos sócios estrangeiros, fragmentada como na Bahia, foi feita pela capitalização da engenharia de processo e, em alguns casos, dos serviços de engenharia básica e equipamentos, sugerindo Teixeira (1985) que sua participação no risco foi maior que no pólo baiano.

Apesar das diferenças acima apontadas, o padrão de regulação do processo de implantação do novo pólo era ainda o mesmo que, esboçado no pólo paulista, fora plenamente desenvolvido em Camaçari, na forma acima descrita.

Com o pólo gaúcho conclui-se a etapa de implantação da indústria petroquímico brasileira. Este processo, que envolveu investimentos de cerca de US$ 5 bilhões a preços correntes (Oliveira,1990), transformou a petroquímico em um dos principais setores industriais do país, multiplicou por oito a produção local de bens petroquímicos no período 1968/83 (em peso), reduziu o coeficiente de importações de 33% a 1% do consumo e permitiu que o setor se tornasse um ganhador líquido de divisas a partir de exportações significativas.

Apesar da sua rapidez, que limitou a sedimentação de experiências, a sequência de implantação dos pólos petroquímicos trouxe consigo importantes processos de aprendizado, de natureza distinta, para todos os atores envolvidos.

Do ângulo tecnológico, o Quadro 2 sintetiza estimativas da participação nacional no suprimento de insumos tecnológicos na implantação dos três pólos. A maior descontinuidade observa-se entre o pólo de São Paulo e o da Bahia, refletindo provavelmente a maior experiência da Petroquisa. Enquanto em São Paulo o domínio da tecnologia limitava-se às tarefas de montagem, na Bahia este já abarcava plenamente os estudos preliminares e, em boa medida, a engenharia de detalhe, que, no pólo Sul, já era totalmente internalizada. Mesmo com a maior participação de financiamentos externos, no último pólo aumenta o suprimento local de equipamentos. O mesmo autor (Teixeira, 1985) assinala o aprendizado na negociação de contratos de um pólo ao outro.

Ao mesmo tempo, o referido Quadro ilustra o não-aprendizado – a limitação nacional em processos e engenharia básica, supridas seja por contratos (nas centrais) seja pelos sócios estrangeiros (na maioria das firmas a jusante da cadeia). Conforme é discutido em maior detalhe a seguir, essa limitação tem caráter estrutural.

O processo de implantação da indústria demandou também outros aprendizados, menos intencionais que o tecnológico. Boa parte dos empresários petroquímicos nacionais formou-se nesse processo, no que pode ser descrito como um tipo específico de “on-the-job training”. As empresas multinacionais tiveram que exercitar sua capacidade de adaptação a contextos institucionais distintos. Finalmente, os policy-makers do setor desenvolveram o complexo aparato regulatório acima descrito ao longo da experiência de implantação dos três pólos, adaptando-o, como vimos, a circunstâncias distintas. 

2.3. Fase III: Amadurecimento da Indústria e Deterioração da Regulação 

Ao findar a implantação do pólo de Triunfo interrompe-se a dinâmica de encadeamento de pólos, em que um novo pólo já começa a ser planejado antes mesmo de finalizado o anterior. Ao contrário, em um contexto em que se somam o segundo choque do petróleo e a política de ajuste recessivo, em 1981 a indústria faz face, pela primeira vez na sua história, em vez de uma demanda crescente, a uma queda substancial (12%) no consumo aparente, localizada principalmente nos produtos finais da cadeia (Guerra, 1991)

A solução é encontrada na busca do mercado externo: as exportações, que até 1980 eram negligenciáveis em peso, valor e participação na produção, aumentam 300% em peso e 250% em valor entre 1980 e 1981 e saltam novamente após a entrada em operação de Triunfo: 188 e 174%, respectivamente, entre 1982 e 1983 (Guerra 1991). Embora a menores taxas, as exportações seguem crescendo até 1985, quando representam 18% da produção nacional. Com o boom do mercado interno em 1986, a tonelagem exportada se reduz e sua participação na produção se estabiliza em torno de 12% até o fim da década, conforme pode ser visto no Quadro 4. Apesar de constituírem excedentes do mercado interno, as exportações haviam passado a integrar o horizonte operacional da petroquímico brasileira, especialmente para os produtos termoplásticos, para os quais o mercado externo e significativo, representando um quarto do consumo aparente em 1989. 

Embora marginal do ponto de vista mundial, esse desempenho exportador e significativo em termos nacionais. Para tanto, a participação do aparato regulatório foi decisiva, estabelecendo preços ao longo de toda a cadeia que viabilizassem as exportações, feitas normalmente a preços que cobriam apenas os custos variáveis, e mobilizando os serviços da trading company da PETROBRAS, INTELBRAS. Posteriormente, o setor passou também a usar os incentivos fiscais da BEFIEX: em 1982 apenas duas empresas, uma produtora de básicos e outra de acrilatos, utilizaram esses incentivos. No entanto, após um interregno, a partir de 1987, outras 17 empresas passaram a usar a BEFIEX, notadamente para exportações de termoplásticos e resinas (informações diretas da BEFIEX, em Erber e Vermulm, 1993). Essa lentidão pode ser devida a processos de aprendizado de uso do instrumento.

A debacle de 1981 e singular na década. Segundo os dados de Guerra (1991), já no ano seguinte o consumo interno de produtos petroquímicos voltará aos níveis de 1980 e, a seguir, cresce continuadamente até o fim dos oitenta, conforme mostra o Quadro 4, apesar de todas as oscilações da economia durante o período10. Comparadas porém com as vertiginosas taxas de crescimento dos anos setenta, as taxas da última década parecem modestas (veja-se o Quadro 5). Oliveira (1990) estima altos coeficientes de elasticidade do consumo per capita de produtos petroquímicos em relação ao PIB per capita no período 1982/88: 6,35 para o eteno, 6,21 para o polietileno de alta densidade, 8,21 para o polipropileno e 15,88 para a acrilonitrila. Não obstante, em 1989 o nível de consumo per capita brasileiro (10,3 kg/hab) ainda é baixo, quando comparado ao dos países desenvolvidos: 56,2 kg nos Estados Unidos, 64,2 no Japão e 69,8 na Alemanha. E’ também inferior ao da Argentina (11,4 kg/hab), indicando uma extensa fronteira de expansão (ibid). A estrutura de produção, mantém-se relativamente estável, com os produtos básicos representando cerca de um terço do total em peso, os intermediários para plásticos aproximadamente 17% e os orgânicos diversos cerca de 15%. A principal alteração e a elevação da participação de termoplásticos, que passa de de 15 para 18% do total.

O nível de investimentos do setor também se reduz no período: utilizando os dados de Oliveira (1990), estima-se que no período 1973/82 o setor teria investido em média US$ 466 milhões (correntes) por ano, ao passo que no período 1982/88 esse investimento teria sido de US$ 287 milhões anuais. Essa redução parece responder a uma dupla determinação: macroeconômica, expressa pela queda no crescimento do PIB, que passa de 8.6% a 2.1% anuais, e, principalmente, setorial, correspondente a passagem de um período de implantação da indústria a um período de absorção de capacidade e amadurecimento. Mesmo assim, como resultado desses investimentos e de esforços de desengargalamento e otimização de processos, a capacidade produtiva do setor continua ampliando-se no correr da década, embora a taxas inferiores a década anterior (Oliveira 1990).

Os preços dos produtos petroquímicos apresentam uma forte redução ao longo da década de oitenta e tendem a situar-se em níveis inferiores aos dos vigentes nos mercados dos países desenvolvidos (Limoeiro, 1991 e Erber e Vermulm, 1993). Assim, apesar da proteção infinita contra as importações, os consumidores nacionais também se beneficiaram do desenvolvimento da indústria. Os preços da cadeia petroquímico eram administrados pelo Governo, através da PETROBRAS (nafta) e do Conselho Interministerial de Preços. O preço da nafta, principal insumo da cadeia, ao longo da década, foi, em regra, inferior ao prevalecente em outros países. Em consequência, as relações de preços básicos/nafta e finais/básicos tendiam a ser altas em termos internacionais (ibid.). Havia, pois, uma lógica de preços na cadeia, pela qual as margens dos produtos finais eram superiores às das centrais e estas as da refinaria. Proprietária das refinarias, a PETROBRAS era, em parte, compensada pela sua participação a jusante da cadeia, através da Petroquisa. O controle de preços parece ainda ter estabilizado as margens auferidas pelos produtores petroquímicos, evitando os ciclos característicos do setor, embora, na segunda metade da década, com a aceleração do processo inflacionário, as margens tenham apresentado maior volatilidade (Erber e Vermulm,1993). 

A extensão da crise macroeconômica parece ter sido mal avaliada pelo setor, fruto, em parte, da “cultura de crescimento” estabelecida ao longo do processo de implantação da indústria. Assim, no período 1986/87, embalado pelo crescimento do Plano Cruzado, o setor estimou que haveria um déficit de produtos petroquímicos já em 1992, baseado em estimativas de crescimento anual do PIB que variavam entre 7 e 5,5% ao ano e projeções de exportações equivalentes a 20% da produção. A este otimismo quanto ao desempenho interno e externo do setor somou-se a possibilidade de utilizar o gás natural descoberto no Estado do Rio de Janeiro como matéria-prima alternativa a nafta, cujo suprimento era problemático (Oliveira 1990 e Guerra 1991).

Surgia assim a oportunidade de implantar um novo pólo ou ampliar os pólos já existentes. O setor parecia retomar a trajetória anterior. No entanto, não só o contexto macroeconômico era outro como a capacidade decisória do Estado brasileiro havia se deteriorado rápida e substancialmente. Assim, o Programa Nacional de Petroquímico (PNP), lançado em 1987, estabeleceu metas que atendiam a todos os interesses, propondo a expansão dos pólos de Camaçari e Triunfo, o desengargalamento do pólo de São Paulo e a implantação de um novo pólo no Estado do Rio de Janeiro. Definido com base em estimativas de crescimento do PIB de 5.5% anuais e com um horizonte até 1998, o PNP previa investimentos de US$ 7.4 bilhões11, dos quais 60% seriam realizados no Nordeste, 27% no Sudeste (Rio e São Paulo) e o resto no Sul (Oliveira 1990).

Conforme detalhado a seguir, o PNP foi implementado de forma muito parcial, destacando-se a duplicação da Copene, apesar de concluída apenas em 1993, com dois anos de atraso em relação ao cronograma original. Aplica-se ao Programa, com propriedade, a metáfora do copo a metade pleno, que para os otimistas está meio cheio e para os pessimistas metade vazio: os investimentos realizados, notadamente a expansão de Camaçari, são um atestado de dinamismo do setor, especialmente no contexto macro em que foram feitos, mesmo que constituíssem apenas uma parcela do planejado.

No entanto, o PNP aponta para uma crise que, camuflada na época, viria a apresentar-se plenamente na década de noventa – a crise do aparato regulatório estatal do setor. Anteriormente, este fora sujeito a grandes pressões de interesses econômicos e políticos, como nas decisões concernentes a localização dos pólos e a permissão para a Dow constituir um pólo próprio. No entanto, mesmo com delongas, este aparato fora capaz de definir opções e implementá-las – o que não parece ter sido o caso no PNP, onde tentou-se a impossibilidade: agradar a todos.

Não é só nas decisões relativas a investimentos que o sistema regulatório parece ter entrado em crise na segunda metade dos anos oitenta. Em um contexto de aceleração inflacionária, os controles impostos a operação de empresas estatais provocaram danos substanciais a eficiência da Petroquisa e suas subsidiárias (provavelmente com escassos benefícios do ponto de vista de gastos públicos). Por sua vez, conforme já mencionado, o controle de preços provocou grandes flutuações nas margens operacionais das empresas. 

  Finalmente, ao terminar a década, a política de comércio exterior apontava para a erosão de um dos pilares básicos da constituição do setor, introduzindo, em 1988, uma reforma tarifária que reduzia as tarifas médias do setor petroquímico e dos seus consumidores (veja-se Quadro 7). Embora as tarifas tivessem sido negociadas com os empresários a um nível ainda alto e persistissem as barreiras administrativas na CACEX, mais importantes que as tarifas, a reforma de 1988 era um indício importante da liberalização subsequente.

A progressiva desagregação do sistema regulatório do setor petroquímico não é um fenômeno isolado – ela constitui uma faceta específica da decomposição do Estado brasileiro durante os anos oitenta, que se acentua na segunda metade da década.

Pari passu com o processo acima descrito observa-se uma tendência de reforço do empresariado privado nacional do setor. Em 1980 as dezessete empresas de segunda geração do pólo de Camaçari que detinham ações da COPENE constituíram uma holding, Nordeste Químicas S.A – NORQUISA, transferindo-lhe as referidas ações, que representavam uma participação no capital votante da Central (47.2%) equivalente a da Petroquisa (48.1%). Considerando o papel estratégico da COPENE no pólo e a massa de lucros que gerava, a NORQUISA atendia a um duplo propósito, fruto da centralização de capitais: participar nas decisões da Central e aglutinar recursos para investimentos. Adicionalmente, ao “privatizar” a COPENE, cujo restante do capital votante estava nas mãos do público, retirava-se a empresa da órbita de controle da SEST. No pólo de Camaçari como um todo, a participação do Estado no capital reduziu-se de 42% para 38% entre 1978 e 1985 (Teixeira 1987), diferença tomada pelo empresariado nacional.

No correr da década, a NORQUISA, além de participar da expansão da COPENE, iria envolver-se pesadamente na constituição do pólo cloroquímico de Alagoas e na tentativa, inspirada na estratégia do II PND, de estabelecer uma indústria de químicas fina sob controle nacional, investindo principalmente em produtos intermediários dessa indústria.

Ao mesmo tempo, processa-se uma “nacionalização” das joint-ventures tripartites. Tomando como referência o início dos pólos (dados de Bastos, 1989), das 24 joint-ventures originais, restavam, em meados dos oitenta, apenas 11, sendo significativo que esse processo avance na proporção direta da idade dos pólos. No pólo de Camaçari, Teixeira (1987), mostra que, entre 1978 e 1985, os sócios estrangeiros reduzem a sua participação de 19% para 15% do capital. Este processo não parece ter obedecido a um planejamento, tendo ocorrido de forma incremental e caso a caso. Na maioria dos casos,a retirada do sócio estrangeiro deu-se por iniciativa deste, seguindo objetivos próprios (p.ex. saída dos ramos de commodities na petroquímico). Não obstante, é significativo que não se tenha buscado a sua substituição por outro sócio estrangeiro.

Finalmente, destaca-se na década de oitenta a ampliação das atividades petroquímicos do grupo Odebrecht, especialmente por meio de aquisições acionárias (inclusive no grupo Unipar), que lhe garantem presença nos três pólos e numa gama ampla de produtos, tornando-o o principal grupo privado nacional do setor.

Entre as firmas multinacionais, cabe destacar o movimento de diversificação da Rhodia, inclusive para áreas distintas da petroquímico, e a mudança de estratégia da Dow, que passa a aceitar participar de joint-ventures tripartites.

As transformações acima apontadas não mudam porém a problemática da estrutura empresarial da indústria petroquímico em termos de escala e capacidade de decisão. Enquanto as plantas são, em regra, de porte internacional (veja-se Oliveira 1990 para comparações), as empresas e grupos têm escalas muito pequenas. Embora a Petroquisa tivesse um faturamento substancial em termos internacionais, os limites que os acordos de acionistas impunham a sua participação nas empresas coligadas, dando aos demais parceiros direito de veto em decisões estratégicas, bem como as normas tácitas que regiam suas associações, restringiam sua capacidade empresarial. Na verdade, o Sistema Petroquisa não tinha as características de um grupo sujeito a um comando estratégico. Entre os grupos privados, mesmo os maiores (Odebrecht, Unipar e Rhodia) tinham um faturamento pequeno (entre US$ 1 e 1,5 bilhão brutos) para padrões internacionais. As mesmas limitações que afligiam a capacidade de decisão da Petroquisa, afetavam também o setor privado. Assim, Oliveira (1994), após estudar os vários tipos de acordos que limitam as ações das empresas do setor, caracteriza-as como quase-empresas porque “não podem de forma autônoma: dispor dos lucros gerados para financiar a expansão de vendas e/ou de ativos; alavancar recursos de terceiros para acelerar seu ritmo de crescimento; rever o escopo produtivo pela via da aquisição ou alienação de ativos; promover fusões, cisões, incorporações, trocas de portfólio ou de instalações produtivas, desativar plantas ou linhas completas de produção” (p.160) 

Tampouco modificou-se substancialmente ao longo dos anos oitenta a característica de fragmentação da participação na cadeia das empresas e grupos, que lhes impede de auferir de economias de escopo e sinergia. A estrutura de oferta por produtos permaneceu fortemente concentrada, exceto em termoplásticos, onde, para os polietilenos e polipropileno o número de firmas participantes cresceu durante a década e, ao fim desta, havia vários projetos de expansão.

Em termos de bens fabricados, a petroquímico brasileira concentrava-se em produtos relativamente padronizados – commodities e quase-commodities, não tendo seguido de perto a trajetória internacional rumo a produtos de maior valor agregado como especialidades, plásticos de engenharia e químicas fina. Entretanto, em direção a esta última, seriam feitas importantes tentativas de diversificação pelas empresas do pólo baiano, notadamente pela Norquisa, na segunda metade da década de 80, seguindo, conforme mencionado, uma estratégia de substituição de importações, posteriormente liquidada pela abertura às importações.

Finalmente, cabe observar que os problemas estruturais de localização de produção e consumo de produtos petroquímicos já apontados agravaram-se durante a década em virtude da deterioração da rede de transportes e portuária, fruto das crescentes dificuldades de investimento do setor público.

2.4. Fase IV: Crise Econômica e da Regulação: Os Anos 1990/92 

O início dos anos noventa e marcado pelo fracasso das políticas de estabilização de preços, indefinição da problemática dívida externa do país e queda no PIB e no produto industrial. A política industrial e de comércio exterior12 e concebida como uma “pinça”, em que se contrapõem instrumentos de aumento da competição (notadamente a abertura às importações e a privatização) a outros instrumentos que visam aumentar a competitividade da indústria brasileira, principalmente pelo uso de incentivos fiscais para o desenvolvimento tecnológico. No entanto, além da “pinça” ser estruturalmente desequilibrada, pela diferença entre as duas “pernas” em termos de timing e de incidência dos instrumentos, a sua implementação aumentou esse desequilíbrio, posto que os instrumentos de competição foram mais ativados que os de competitividade. O fracasso da política de estabilização agrava ainda mais esse desequilíbrio e induz o Governo a usar as tarifas como mecanismo de controle de preços internos, sob uma perspectiva de curto prazo, distorcendo sua função de parâmetro de decisões de prazo mais longo.

O antigo aparato regulatório e desmontado e aumentam os conflitos entre o Governo e o setor privado. Em 1992 a crise assume face política explícita, culminando com o impeachment do Presidente da República, sob acusações de corrupção. Convergem assim, de modo interdependente, duas crises internas de âmbito macro – econômica e de regulação – que vão rebater sobre a petroquímico filtradas pelas características do setor (Erber e Vermulm 1993). 

O setor petroquímico internacional também apresenta uma situação de crise, com sobre-oferta e preços deprimidos, que tende a aumentar pela entrada de novas plantas, localizadas no Oriente Médio e Extremo.

Assim, o setor petroquímico brasileiro inicia a década de noventa fazendo face a um quadro interno e externo bastante desfavorável. Antes de examinar o seu desempenho, convém detalhar as modificações do contexto regulatório, posto que essas transformações amontam a um verdadeiro choque.

Ao nível do mercado, a abertura às importações e significativa, especialmente a luz de uma proteção prévia praticamente infinita: em 1990 eliminam-se os controles administrativos das importações e introduz-se uma nova estrutura tarifária, desdobrada até 1994 ; decide-se acelerar a formação do MERCOSUL para 1995 e mantém-se a taxa de câmbio sobrevalorizada. Como pode ser visto no Quadro 7, os níveis de tarifas nominais caem drasticamente: para produtos petroquímicos básicos e intermediários a tarifa reduz-se de 27.8% em 1988 para 7.9% em 1992 e para resinas, fibras artificiais e sintéticas a queda e de 40.2% para 15%. As tarifas efetivas, também cadentes, são porém superiores, finalizando o período em, respectivamente, 15.2% e 20.2%. No entanto, não se alteram a legislação antidumping e o restrito aparato governamental encarregado de executá-la. Do lado da abertura exportadora o movimento tem sentido inverso, sendo abolidos os incentivos fiscais para essas atividades, extinta a Interbras e mantida a taxa de câmbio sobrevalorizada.

No mercado interno, o controle de preços dos produtos petroquímicos e abolido em 1990 e a seguir reestabelecido, para novamente ser cancelado no fim de 1991, desta vez de forma definitiva. No entanto, o preço da nafta, que é o principal componente dos custos da cadeia, continua a ser fixado administrativamente e sujeito a forte polêmica quanto aos critérios de fixação13. Apenas no fim de 1991 este critério viria a ser definido – 120% do preço do petróleo “Brent”, contrariando a proposta da indústria que reivindicava um multiplicador menor (110%), fixado sobre outro tipo de petróleo. Este critério representava um aumento importante nos custos da cadeia petroquímico. Embora a Petrobras não tenha implementado essa política, mantendo os preços abaixo do nível de mercado internacional, o diferencial entre o preço interno e o internacional estreita-se, passando o preço interno de 58% do preço internacional em 1990 a 93% em 1993 (veja-se Quadro 8). Igualmente grave, a indefinição quanto aos critérios representava uma espada de Damocles sobre a cabeça da indústria, aumentando a incerteza quanto ao seu desenvolvimento.

Embora representassem uma ruptura com o passado, as medidas acima descritas eram, com ajustes, compatíveis com o sistema regulatório que presidirá o setor. O cerne deste sistema seria atingido, porém, pela eliminação dos mecanismos de seleção de projetos e articulação institucional e pela política de privatização.

A extinção do CDI marca mais que o fim dos incentivos fiscais que este administrava – assinala a abolição dos mecanismos vigentes de seleção de projetos e articulação de políticas entre os vários órgãos que afetam o setor – que não são substituídos por mecanismos alternativos. Ao contrário, a política de privatização, abaixo discutida, estabelece uma cisão entre os dois principais responsáveis pelo “ancien régime”: o BNDES e a PETROBRAS.

Tendo o Governo conferido prioridade máxima a privatização das empresas estatais e atribuído ao BNDES a função de executor deste programa, seguiu-se a decisão de incluir a petroquímico entre os primeiros setores alvo do Programa Nacional de Desestatização (PND). Posto que a maioria das participações da Petroquisa nas empresas do setor eram minoritárias (excetuando-se as centrais do Rio Grande e de São Paulo e a Petroflex, grande produtora de elastômeros), tratava-se aqui de desestatização estrito senso. Os empresários privados do setor apoiaram entusiasticamente o Programa, embora, conforme detalhado a seguir, não lograsse acordar-se quanto a uma configuração que superasse a fraqueza da estrutura empresarial, por todos reconhecida.

Por sua vez, a PETROBRAS tinha motivos políticos e econômicos para opor-se a uma amputação do seu braço petroquímico. Até o presente momento, a Petrobras controla o fornecimento da nafta como executora do monopólio que a Constituição confere à União. Esta condição cria obrigações e direitos para a PETROBRAS face o setor petroquímico: de um lado, torna a Empresa responsável pelo funcionamento de um setor estratégico da economia, e, de outro, faz com que ela tenha um interesse comercial no abastecimento do setor, sugerindo que explore as vantagens monopólicas. Este conflito entre os lados estatal e empresarial, típico de toda empresa do Estado, era resolvido compensando a perda de rendas monopólicas nas refinarias com o que auferia na petroquímico, via Petroquisa. A prática de preços de transferência ao longo da cadeia petroquímico e usual no setor, conferindo vantagens a empresas verticalmente integradas, como são os principais competidores internacionais da PETROBRAS. Pelas razões já apontadas (ver nota 13), a existência de um subsídio para a cadeia petroquímico nos preços cobrados pela nafta e controversa. 

 Três alternativas foram originalmente contempladas para a privatização do setor:

a) Venda, isoladamente, das centrais de matérias primas e das participações minoritárias da Petroquisa nas empresas de segunda geração;

b) Privatização da Petroquisa cindida em três ou quatro empresas, aglutinando em torno de cada uma das centrais as participações minoritárias da Petroquisa nos respectivos pólos;

c) Privatização da Petroquisa em bloco.

A conveniência de formação de grandes grupos empresariais capazes de competir internacionalmente, fazendo face a abertura às importações, favorecia as duas últimas alternativas. Não obstante, a celeridade que, por razões políticas, se desejava imprimir a privatização, as dificuldades impostas pelos acordos de acionistas e pela presença de sócios estrangeiros nas empresas a serem privatizadas (veja-se a seguir), bem como a falta de acordo quanto ao modelo a ser adotado, levaram a Comissão Diretora do PND a adotar a primeira alternativa, procedendo porém a privatização por pólos. Tendo em vista a menor complexidade do pólo do Sul, este foi escolhido como ponto de partida do processo. 

Buscou-se, inicialmente, formar no pólo de Triunfo uma empresa holding que congregasse as firmas de segunda geração, dando origem a uma empresa regional de Médio porte. No entanto, essa solução não foi aceita pelas referidas firmas, que argumentavam que, embora tivessem interesse em participar da central para garantir o suprimento de matérias primas, com a constituição da holding adquiririam participações em outras firmas a jusante, fora de sua estratégia. Os sócios estrangeiros dessas empresas tinham o segredo tecnológico como razão adicional para evitar fusões. Optou-se, pois, pela privatização parcelada: em primeiro lugar da central e, a seguir, das participações da Petroquisa nas empresas de segunda geração. 

Em consequência, o controle da central (Copesul) foi parcelado entre os grupos que tinham empresas a jusante e a Petroquisa. Visando manter o interesse desta na cadeia petroquímico, foi-lhe concedido manter uma participação minoritária (17%) do capital da central, embora muito inferior ao mínimo que reivindicava (um terço). O Quadro 9, a seguir, mostra a distribuição do capital votante da Copesul e das demais centrais, antes e depois do leilão de privatização.

A crise econômica leva a uma contração das vendas do setor no país, conforme mostra o Quadro 10. Face às condições do mercado internacional, esta redução é compensada apenas parcialmente pelas exportações, cujo volume aumenta muito mais que o valor (ibid.). As importações tomam uma trajetória ascendente e, entre 1989 e 1992, aumentam 2,5 vezes em volume, embora aumentem apenas 10% em valor, refletindo os baixos preços internacionais. No último ano respondem por cerca de 9,5% e 5% das vendas internas, em volume e valor. Embora as importações efetivas estejam concentradas em poucos produtos (veja-se a seguir), o efeito da abertura importadora e muito mais amplo, pois coloca um teto aos aumentos de preços dos produtos locais, teto que é rebaixado pelas condições de oferta do mercado internacional.

A reação das empresas petroquímicos a essa combinação de fatores e estritamente defensiva. Cabe notar que a estrutura fragmentada e mono-produtora da indústria brasileira reduz substancialmente a margem de manobra defensiva das empresas. Nos grandes grupos internacionais, decisões de remanejamento de produção e eventual fechamento de fábricas menos eficientes, embora dolorosas, são frequentes, facilitadas pela existência de muitas fábricas no âmbito do grupo. No caso brasileiro, porém, o fechamento de uma fábrica pode significar o fechamento de uma empresa. A estas características empresariais somava-se o excesso de capacidade de produção em relação às possibilidades de vendas internas e externas em vários produtos (p.ex. eteno, polietilenos, polipropileno), dificultando significativamente a reestruturação competitiva do setor.

Assim, as empresas brasileiras reduzem seus custos contraindo a produção, despedindo pessoal, de todos os níveis, desmantelando inclusive equipes dedicada a aperfeiçoamentos tecnológicos (veja-se a seguir) e reorientam o trabalho das equipes remanescentes para objetivos de contenção de gastos. Ao mesmo tempo, reduzem seu endividamento e cancelam, quando possível, planos de investimento ou, quando estes são indispensáveis, reduzem o seu ritmo. Do PNP implementou-se apenas a ampliação de Camaçari, onde a obra principal, a duplicação da COPENE, foi concluída em 1993, com dois anos de atraso. A implantação do pólo do Rio foi abandonada em favor da execução de alguns projetos estruturados em torno da refinaria da PETROBRAS no Estado, dos quais apenas parte teve seguimento e a ampliação de Triunfo foi postergada. A diversificação rumo a químicas fina e abandonada, em parte devido a abertura, que reorienta as filiais de firmas multinacionais, principais clientes desses produtos, para a importação, especialmente intra-grupo. Mesmo assim, as empresas do setor passam a operar com margens líquidas negativas, embora os prejuízos se reduzam ao longo do triênio 1990/92 (Oliveira, 1994).

2.5. Fase V: Recuperação e Incerteza: 1993/95

O Governo que assume no fim de 1992 não tem, a princípio, uma orientação clara como o anterior. Assim, embora mantidos os princípios da abertura e privatização, abre-se um espaço para a discussão de um desenho de uma configuração sustentável para a petroquímico brasileira. 

Para a nafta, estabelece-se uma política de preços em que este é composto de duas parcelas: a primeira, relativa a nafta produzida no país, e equivalente a 1.15 do petróleo CIF importado e a segunda corresponde ao valor CIF da nafta importada. O peso das duas parcelas e proporcional a sua participação no total consumido (Oliveira 1994). Embora no período 1993/94 o preço interno Médio da nafta tenha oscilado substancialmente14, o diferencial entre o preço interno e o internacional tende a aumentar, conforme pode ser visto no Quadro 8. 

Quanto a privatização, sustou-se o processo de leilões e estabeleceram-se negociações entre o setor privado, a PETROBRAS e o BNDES. Destas negociações emergira uma solução para as centrais de matérias-primas: a manutenção de uma “significativa” participação da Petroquisa no capital- cerca de 30%. Esta solução representava uma modificação importante na posição do setor privado, provavelmente inspirada pelo desejo de garantir o suprimento da nafta a bom preço. Permanecia porém o impasse quanto a participação da Petroquisa nas empresas a jusante da cadeia, que a PETROBRAS desejava manter, pelo menos em algumas empresas. Esta solução envolvia o poder da Petroquisa em dois níveis: o das decisões dentro das empresas em que participasse e a possibilidade de tratamento diferenciado entre empresas das quais fosse sócia e as demais empresas. O dissenso a esse respeito existia tanto entre a PETROBRAS e as empresas privadas como entre estas. Ao mesmo tempo, o conflito entre os grupos privados envolvidos na petroquímico aumentou substancialmente, inspirado principalmente pelo receio de que o grupo Odebrecht, que resultara fortalecido pela privatização do pólo de Triunfo e revelava uma estratégia agressiva, assumisse uma posição hegemônica dentro do setor. Esses conflitos inviabilizaram uma solução negociada para a estrutura empresarial da indústria.

É’ importante notar que, embora consultores da ABIQUIM tenham sugerido mecanismos de regulação baseados em contratos de longo prazo, que estabeleceriam critérios de fixação de preços e de repartição de margens ao longo da cadeia (ver Chem Systems 1992), as partes envolvidas não parecem tê-los considerado em profundidade, atendo-se a formas de regulação baseadas em relações hierárquicas, i.e. de propriedade. 

Enquanto desenrolavam-se estes conflitos, no seio do Governo grupos mais identificados com o ideário neoliberal tornavam-se hegemônicos, notadamente a partir de meados de 1993. O sistema de preços passa por uma aceleração do processo inflacionário, estabilizando-se, no segundo semestre de 1994, com o Plano Real, que leva a eleição, no fim daquele ano, do antigo Ministro da Fazenda, assinalando a continuidade da política econômica.

O Programa de Desestatização retomou seu curso, através de leilões, privatizando-se, em 1994, o pólo de São Paulo através da venda total das participações da Petroquisa nas empresas a jusante da central aos demais acionistas e dividindo o controle da central entre 16 grupos, constituídos pelos antigos controladores – Unipar e Petroquisa – que ficaram com, respectivamente 30% e 27%, empresas a jusante e bancos (ver Quadro 9). A privatização do pólo da Bahia foi iniciada, com a venda da participação da Petroquisa em um dos principais fabricantes de termoplásticos, mas a seguir foi sustada, deixando-se o seu equacionamento para o novo Governo, que toma posse em janeiro de 1995. Neste ano, a privatização da COPENE foi feita pela aquisição de parte da participação da Petroquisa pela Norquisa, que torna-se o controlador da central, e por fundos de pensão e um grande banco. A Petroquisa retem 17% da COPENE (ibid).

O processo de abertura às importações foi aprofundado. A taxa de câmbio apresenta uma forte valorização a partir de meados de 1994 e o cronograma de redução tarifária foi acelerado. O uso da tarifa como instrumento de controle de preços internos foi mantido. Para produtos básicos a tarifa nominal e nula e para importantes segmentos, como termoplásticos, situa-se em 2%. Em consequência, a proteção efetiva para, pelo menos, parte substancial da petroquímico e provavelmente negativa. 

Conforme pode ser visto no Quadro 10, as importações crescem substancialmente durante o biênio 1993/94, equivalendo a 14% do peso e quase 10% do valor das vendas internas totais. Como a gama de produtos importados e restrita, a agregação acima tende a subestimar os efeitos da abertura ao nível de produtos. No entanto, comparado com o início do processo, a gama de importações também se amplia. Enquanto em 1991 havia apenas seis produtos com importações superiores a US$ 10 milhões, em 1994 esse número triplica. Os cinco principais itens importados em 1991 respondiam por 41,8% das importações totais. Em 1994 os cinco produtos principais respondem por 35,7%. do total e, entre estes cinco, apenas dois são os mesmos de 1991, embora os produtos que saem deste conjunto continuem com importações superiores a US$ 10 milhões15. Note-se ainda que parte substancial das importações (25% do valor total de 1994), corresponde a produtos (principalmente termoplásticos) que também respondem por grande parte das exportações (43% do valor total), caracterizando uma situação de comércio intra-industrial,

Durante o ano de 1993, algumas empresas acionam os mecanismos de proteção contra práticas desleais de comércio. Em 1992 estes dispositivos foram utilizados uma vez apenas, para o PVC, com resultado favorável ao pleito das empresas. Em 1993 são julgados seis processos, quatro dos quais movidos por uma empresa. Em apenas dois casos os pedidos foram julgados procedentes, cabendo notar que, no último caso a ser julgado, em fins de 1994, a razão apresentada para a negativa e, explicitamente, o prejuízo que acarretaria ao Programa de Estabilização em curso. Os prazos entre o início formal do processo e a decisão são de 6 meses (dois casos), sete meses (dois), oito (um) e 14 meses (um caso). Em 1995 a legislação de proteção contra práticas desleais de comércio seria revista, para adequá-la aos resultados da Rodada Uruguai.

Apesar do aumento das importações, a elevação dos preços internacionais a partir de meados de 1993 atenua o efeito que estas exercem sobre os preços e margens internas. Embora permaneçam problemas de ineficiência dos mecanismos de proteção contra práticas desleais de comércio, o foco dos debates desloca-se para as ineficiências sistêmicas que afetam a indústria petroquímico. Entre estes fatores, que remetem a crise do Estado brasileiro, a indústria destaca os seguintes:

i) Carga fiscal 

Segundo as conclusões de ABIQUIM (1992) ” o volume dos impostos e a própria estrutura tributária brasileira impõem aos produtores aqui instalados uma carga bem superior à vigente nos EUA, por exemplo. Em ordem de importância, tem-se o imposto de renda, os impostos sobre custo financeiro nas vendas a prazo (não existentes no resto do mundo), o PIS e o COFINS (FINSOCIAL) [contribuições para-fiscais de natureza social], os dois últimos também não existentes no resto do mundo; assim, os impostos sobre o lucro e sobre a produção locais acabam por favorecer a importação, que não incorre em tais custos nos países de origem” (op. cit. p.69). Alguns destes encargos (PIS) foram reduzidos para as exportações em 1994. 

Estima ainda a mesma fonte que, na indústria químicas, ” o salário Médio no Brasil e baixo, da ordem de US$ 5,69/h. Entretanto, dada a atual estrutura de encargos (fiscais e parafiscais) sobre o fator trabalho, emerge um custo Médio elevado, da ordem de US$ 12,13/h, similar aos da indústria químicas americana” (op. cit. p.59). Embora a indústria seja relativamente pouco intensiva em mão-de-obra, a vantagem derivada dos baixos custos deste fator tende assim a perder-se.

ii) Custos financeiros 

Respondendo a política de estabilização, as taxas de juros cobradas no Brasil, mesmo as taxas do BNDES, fonte mais barata de crédito de longo prazo, são muito superiores às internacionais. Sendo uma indústria intensiva em capital, a petroquímico e brasileira e muito onerada em sua competitividade internacional por esse diferencial, que afeta especialmente as empresas que acabaram de investir em projetos de expansão, como as do pólo da Bahia ou as que necessitam urgentemente de novos investimentos, como a central de matérias primas do pólo de São Paulo. Respondendo, em parte, a esses problemas, o BNDES mudou, no fim de 1994, a taxa que corrigia seus créditos, que passou a depender das taxas pagas pelos títulos da dívida pública no exterior. 

iii) Infraestrutura 

Também são notórias as deficiências nacionais em termos de infraestrutura econômica (transporte, portos, energia e comunicações), social (saúde e educação) e técnico-científica, que refletem a crise do Estado brasileiro. Dadas as suas características técnicas e locacionais, estando muitas fábricas distantes dos principais mercados nacionais, as deficiências em transporte e portos parecem especialmente relevantes para a petroquímico (notadamente para o pólo do Nordeste), embora as limitações da infraestrutura social e técnico-científica também obriguem as empresas do país a internalizar maiores custos que seus competidores externos. O Governo acredita que a privatização deverá resolver os problemas de infraestrutura física. 

Apesar das limitações sistêmicas, a indústria aumenta substancialmente suas exportações em 1993 e 1994, em quantidade e valor, este mais que aquela em função do aumento de preços internacionais (Quadro 10). Preocupadas com as repercussões desses aumentos sobre os preços internos, ao fim de 1994 as autoridades governamentais oneraram fiscalmente as exportações de produtos petroquímicos. 

Assim, liderado pelas exportações, já em 1993, o nível total de vendas supera os níveis de 1989 (Quadro 10). Embora a produção industrial do país tenha se expandido 10% em 1993, apenas em 1994 o quantum de produtos petroquímicos vendido internamente volta ao nível de 1989, permanecendo porém inferior em termos de valor constante (ibid.). Em alguns produtos importantes, como eteno, PVC e PEBD, a produção em 1994 já alcançava 90% ou mais da capacidade instalada, segundo dados de ABIQUIM (1995). Embora em 1994 a rentabilidade do setor tenha sido positiva, o quadro de investimentos mantém as mesmas características do biênio anterior: são desenvolvidos apenas projetos indispensáveis, normalmente de pequeno vulto, p.ex., por razões ambientais ou pela obsolescência de instalações. 

Mantidas as condições favoráveis no mercado externo e com as perspectivas de estabilidade macroeconômica do país mais consolidadas, em 1995 alguns grupos privados já discutem planos de investimento mais ambiciosos. O principal projeto retoma a ideia de um mini-pólo no Rio de Janeiro, junto a refinaria da PETROBRAS naquele Estado, usando o gás natural como matéria-prima. Prevê-se a construção de unidades produtoras de eteno (300 mil t) e de propeno (50 mil t) e uma planta de polietileno de 300 mil t. Na proposta original, caberiam a PETROBRAS o tratamento do gás e as unidades de eteno e propeno e a uma associação dos grupos Ipiranga, Mariani e Suzano a unidade de polietileno. O esquema de financiamento e propriedade dos investimentos (cerca de US$ 700 milhões) ainda não está definido. Sendo implementado, este projeto aumentara substancialmente a concorrência em polietileno, mas não acarreta mudanças estruturais no setor, em termos da gama de produtos ou de tecnologia. Outros planos de investimento são de menor alcance, visando expansões de capacidade e modernização e adequação a normas ambientais. 

 3. A Trajetória Tecnológica do Setor 

As empresas petroquímicos, no mundo inteiro, movem-se dentro de um paradigma tecnológico relativamente maduro, onde o progresso técnico e de natureza incremental mas a inovação na fronteira tecnológica requer escalas mínimas de gastos em pesquisa e desenvolvimento elevadas. As empresas líderes do setor compensam, em parte, esse patamar via economias de escala estáticas, efeitos de aprendizado e economias de escopo nas atividades tecnológicas que realizam. A cooperação, p.ex., via licenciamento cruzado de patentes, constitui outra fonte de contenção do patamar, assim como processos de fusões entre empresas, que visam a sinergia tecnológica. Por último, cabe lembrar que as empresas líderes atuam em ambientes onde a capacidade das instituições científicas e o desenvolvimento tecnológico de fornecedores e consumidores também contribuem a rebaixar o referido patamar de gastos.

Na implantação da petroquímico brasileira a barreira a entrada posta pela tecnologia foi superada pela importação: utilizaram-se contratos com firmas independentes para as centrais, ao passo que para as firmas a jusante o recurso à tecnologia externa estava inscrito de forma institucional através de relações societárias, em que a principal contribuição do sócio estrangeiro era o valor capitalizado da tecnologia.

Segundo a análise de Bastos (1989) para 12 joint-ventures, os contratos firmados inicialmente tinham a característica de “pacotes”, abrangendo a engenharia de processo, de projeto básico, de detalhe, diligenciamento e compra de equipamentos, assistência e finalização de construção e montagem, testes de aceitação, partida e pré-operação da fábrica. Muitas vezes, principalmente para os produtos finais, eram também fornecidas informações sobre o produto e suas aplicações. Complementarmente, a autora registra “diversos contratos para inspeção e manutenção de equipamentos, assistência e desenvolvimentos de variações do produto (e novas aplicações), nacionalização de matérias-primas, estudos de viabilidade técnico-econômica para alterações nos processos e dispositivos energéticos” (op. cit. p.222). Frequentemente, a garantia do desempenho da tecnologia era condicionada a aquisição de serviços, equipamentos e catalisadores de fontes específicas.

Dois terços dos contratos analisados continham cláusulas restritivas a ampliação de capacidade ou a implantação de novas unidades sem pagamento adicional ou nova contratação e, nos contratos anteriores a 1975, restringia-se a capacidade das plantas. Embora a maioria dos contratos previsse a troca de melhoramentos introduzidos na tecnologia pelo fornecedor ou pelo recipiente da tecnologia, os direitos de uso não eram simétricos, pois as firmas locais tinham o uso do conhecimento limitado a planta objeto de licenciamento, sem poder sublicencia-lo – restrições que não pesavam sobre o fornecedor.

Bastos aponta que a incidência das restrições acima mencionadas bem como a extensão do prazo de sigilo estipulado pelos contratos tende a diminuir após 1975, o que sugere ter sido eficaz a política do INPI, que passou não só a impedir essas cláusulas como a pressionar para internalizar-se as atividades tecnológicas, associada a pressões do BNDE no mesmo sentido e a uma postura negocial mais agressiva, especialmente de parte da Petroquisa. A essas políticas veio somar-se o aumento da capacidade técnica nacional, fruto do aprendizado das empresas. 

Entre os contratos examinados por Bastos, a quase totalidade prévia treinamento de pessoal das receptoras, mas restrito “ao nível operacional, incluindo partida, com a vinda de técnicos do fornecedor e ida de técnicos da receptora para treinamento em plantas similares… Aliás, a leitura dos contratos permite afirmar que as informações envolvidas foram basicamente transmitidas através de “Manuais”, sem discussão do seu conteúdo e nenhuma preocupação substantiva com sua efetiva assimilação” (Bastos, 1989, pg. 232 e 233). Posteriormente, “começou a ser mais frequente o treinamento também em manutenção rotineira e de emergência de equipamentos (e absorção desta “tecnologia”), tratamento de efluentes, nacionalização de matérias-primas e formulações de diferentes produtos (incluindo aplicação)” (op.cit. p.232), gerando porém novos contratos ou pagamento adicional. Raros foram os casos em que foi efetuado algum tipo de treinamento relacionado especificamente ao processo e, mesmo assim, em regra, restrito ao acompanhamento pelo receptor da engenharia básica feita no exterior, sem aprofundamento sobre os princípios básicos do processo. Para compensar essas limitações a Petroquisa estabeleceu dois programas de treinamento para engenheiros químicos e petroquímicos, um voltado para a operação e projetamento de unidades e outro para engenharia básica, desenvolvimento e pesquisa. 

Não obstante, como vimos acima, de pólo a pólo aumentou o conteúdo tecnológico nacional, evidenciando um processo de aprendizado substancial, principalmente nas engenharias de detalhe, montagem e operação. O mesmo fenômeno aparece na análise da transferência de tecnologia feita por Bastos (1989) e Erber e Vermulm (1993). Com o tempo, notadamente a partir da década dos oitenta, a capacidade de busca de fontes de tecnologia amplia-se, passando as firmas locais a utilizar supridores alternativos aos sócios ou licenciadores originais e a capacidade de negociação aumenta, reduzindo a incidência de cláusulas restritivas. Do ponto de vista técnico, os contratos passam a ser “desempacotados”, restringindo-se a tecnologia de processo e engenharia básica e, conforme indicam Erber e Vermulm (1993), frequentemente, apenas a partes do processo, quando este é divisível. Também parece crescente a pressão das firmas receptoras por um aprofundamento do treinamento recebido, envolvendo maior participação no projetamento das unidades e, em alguns casos, no entendimento do processo. 

Finalmente, algumas firmas locais pressionaram seus sócios estrangeiros para colaborarem na estruturação de atividades tecnológicas internas. No entanto, a participação dos sócios estrangeiros nesse processo parece ter sido limitada. Como nota Bastos (1989 p. 254) “ficou mais ou menos evidente que se o sócio estrangeiro não impede a realização de atividades de P&D, não parece estimulá-las, a não ser quando relacionadas com as áreas operacional e de produto/aplicação”. Em alguns casos de inovações mais ousadas, o sócio estrangeiro parece ter oposto resistências a sua implementação. Erber e Vermulm (1993) apontam também que nas empresas em que o sócio estrangeiro saiu da sociedade, aumentaram os gastos com tecnologia. É também significativo que na análise do processo de transferência feita por Bastos (1989) não se notem diferenças no comportamento de fornecedores, quer sejam sócios ou firmas independentes, sugerindo que uma das principais vantagens apontadas na literatura para o estabelecimento de joint-ventures – a capacitação tecnológica da empresa e dos sócios nacionais – e mais restrita do que se argumenta. 

A cooperação entre empresas, um meio possível de superar barreiras de escala, e praticamente inexistente, mesmo entre empresas que têm as mesmas linhas de produtos e não são concorrentes, como os fornecedores de produtos básicos. As exceções a esse padrão são uma tentativa das empresas baianas de estabelecer um programa de pesquisas de interesse comum junto a um centro de pesquisas local (CEPED), que fracassou por razões internas ao Centro e a ação de uma subsidiária da Petroquisa, que, durante os anos oitenta foi direcionada, com sucesso, para desenvolver processos para outras empresas.

Exceto pelo uso do Centro de Pesquisas da PETROBRAS (CENPES), as empresas do setor parecem ter realizado suas atividades tecnológicas intra-muros, refletindo em boa medida a carência de instituições de pesquisa capacitadas no setor. Mesmo assim, Teixeira (1987) e Erber e Vermulm (1993) registram contratos com instituições geograficamente próximas dos pólos (UFBA e CEPED na Bahia e UFRGS no Rio Grande) ou com alguns centros de porte nacional como o IPT e, notadamente, a UFRJ, que tem uma longa articulação com o CENPES. No entanto, em relação a este Centro, as entrevistas feitas por Erber e Vermulm (1993) indicavam que, no passado recente, o relacionamento tornara-se mais difícil, devido a mudança de prioridades do Centro, orientado pela PETROBRAS para a exploração de petróleo.

Identifica-se, pois, nas firmas locais uma trajetória de aprendizado que leva a um reforço das atividades tecnológicas realizadas internamente, especialmente a partir do amadurecimento do setor na década de oitenta16. O processo de aprendizado das firmas nacionais, em regra, partiu da operação das plantas, envolvendo “otimizações, desengargalamentos, melhorias na estabilidade das reações, redução de perdas de matérias-primas e do consumo de utilidades, melhores taxas de conversão e aumentos de produtividade em geral” (Bastos, 1989, p.251). No início dos oitenta, a crise parece tê-las estimulado a prosseguir buscando economias de energia, nacionalização de matérias-primas antes importadas, tratamento de efluentes e reaproveitamento de produtos. O aprendizado aqui foi inequívoco: Teixeira (1987), analisando 18 empresas do pólo de Camaçari mostra que, em média, esse grupo, em 1985, operava suas plantas com capacidade 25% acima da nominal, sugerindo que haviam esgotado as possibilidades de expansão via desengargalamento e Guerra (1991) aponta que o consumo de energia por tonelada produzida pelo setor químico teria baixado de 25% entre 1979 e 1985.

O esforço relativo e as atividades que as empresas tiveram que desenvolver não se distribuem de forma homogênea ao longo da cadeia petroquímico. As transformações em produtos e processos não se dão com a mesma intensidade e de forma sincrônica ao longo da cadeia petroquímico – produtos e processos a montante desta são mais estáveis que na ponta a jusante. Enquanto os produtos básicos e intermediários são commodities, na outra ponta a diversificação de produtos e parte essencial da concorrência. Em consequência, nas firmas a montante da cadeia o desenvolvimento de produtos e limitado, enquanto nas empresas que fazem produtos finais essas atividades tecnológicas são dominantes.

No Brasil os produtores de bens finais, notadamente termoplásticos, também fizeram aperfeiçoamentos de produtos, adaptando-os às especificidades da demanda local, inclusive desenvolvendo novos “grades”, novas aplicações e composições pré-misturadas e, por força de sua posição na cadeia, criaram estruturas de assistência técnica aos clientes. No correr da década, algumas empresas de termoplásticos montaram plantas-piloto e todas investiram na modelagem de processos, sendo significativo que as primeiras se destaquem entre as que mais investem em tecnologia. 

As entrevistas de Erber e Vermulm (1993) também mostram que a intensidade de esforços tecnológicos está correlacionada com a complexidade dos processos – aqueles que envolvem maior número de etapas e menores margens de tolerância requerem maiores esforços da empresa para chegar, relativamente, aos mesmos resultados. A esse fator fizeram referência os produtores de bens intermediários que mais gastam em tecnologia. Mutatis mutandis, o mesmo se aplica aos produtos finais – as empresas que mais gastam são as que produzem bens mais complexos. Cabe porém lembrar que a indústria brasileira não seguiu a trajetória internacional rumo a “especialidades”, como os plásticos de engenharia, atendo-se a produtos de valor agregado e complexidade tecnológica relativamente baixos. O movimento rumo a químicas fina, esboçado na segunda metade da década de oitenta, foi, como vimos, abortado pela abertura às importações.

Outras características do setor no Brasil, fruto do seu processo de implantação, como a natureza monoprodutora das empresas e sua pequena escala, além de sua relativa juventude, limitam os seus gastos em tecnologia. E significativo que entre as empresas estudadas por Bastos (1989) todas realizem atividades vinculadas a capacidade operacional mas que sejam as de maior porte, mais diversificadas e mais velhas as que, relativamente, mais investem no desenvolvimento de processos e produtos.

Como sugerido anteriormente, e na área de processos que e menor o domínio logrado na tecnologia. Dos gastos feitos pelas empresas brasileiras com processos ao longo da sua história, elencados por Oliveira (US$ 565 milhões correntes), cerca de 5% correspondem a dispêndios feitos no país, destinados principalmente a conhecer e aperfeiçoar os processos em uso. E indicativo desta deficiência e das dificuldades que um país como o Brasil encontra para situar-se na fronteira tecnológica, que, a despeito do custo da tecnologia no investimento ter aumentado17, ao instalar novas plantas as empresas tendam a novamente importar a tecnologia de processo e a engenharia básica (Erber e Vermulm, 1993). Estudo recente da difusão da automação eletrônica no setor (Quadros, 1992) sugere que a falta de conhecimentos sobre o processo seria, em boa parte, responsável pela subutilização desses equipamentos. A renovação dessas importações atesta também os limites da transferência de tecnologia feita por sócios ou por licenciadores independentes, acima comentada. Até os anos oitenta, a trajetória de expansão acelerada do setor, que continuamente colocava para as empresas a necessidade de grandes ampliações de capacidade, reforçou essa tendência. 

O processo de aprendizado acima descrito levou a uma progressiva institucionalização das atividades tecnológicas dentro das empresas durante a década de oitenta, normalmente por iniciativa do seu corpo técnico e/ou estimuladas pelo diretor da área industrial, frequentemente oriundo da Petroquisa. Esta institucionalização, em regra, deu-se após a obtenção de resultados práticos, sendo raras as empresas que a previram desde o início das operações (Bastos, 1989). Teixeira (1987) mostra que, em 1985, praticamente todas as empresas de Camaçari tinham estabelecido atividades de controle de qualidade de processos, dois terços dos fabricantes de bens finais e intermediários tinham atividades de controle de qualidade de produto e metade das empresas declarava possuir um setor de pesquisa e desenvolvimento. Oliveira (1990) mostra que, ao fim da década, das 32 empresas do Sistema Petroquisa, onze contavam com centros especializados em P&D e igual número realizava essas atividades em outros laboratórios.

Outro indicador, o montante de gastos em P&D do Sistema Petroquisa, medido em dólares constantes, cresceu quase quatro vezes entre 1985 e 1989, especialmente em produtos finais (notadamente polímeros), que correspondiam a 70% do total no último ano (Erber e Vermulm 1993). Mesmo assim, esse montante ainda era irrisório em termos internacionais – US$ 53 milhões em 1989. Da mesma forma, tomando o percentual de vendas gasto em P&D como medida do esforço nesta área, os dados da Petroquisa indicam que no período 1985/89 esse percentual praticamente triplicou, mas ainda era diminuto – cerca de 1.2% das vendas líquidas do Sistema. Raras (apenas 6 entre 27) eram as empresas que devotavam mais de 1% do seu faturamento a essas atividades. O número de pessoas empregadas nos laboratórios de P&D era igualmente modesto, não excedendo 32 técnicos de nível superior em qualquer empresa e totalizando 281 para 22 empresas (ibid). 

Nesse contexto, o projeto do Centro de Pesquisas da Petroquisa (CENTEP), representava um salto de escala significativo. Criado em 1989, o Centro tinha por objetivos apoiar os trabalhos das subsidiárias e coligadas da Petroquisa e avançar na fronteira tecnológica. Previa-se que seria concluído em 1992, demandaria investimentos de US$ 35 milhões e empregaria 180 pessoas, dois terços das quais de nível superior. Vale lembrar que na implantação dos pólos a Petroquisa, além dos papéis estratégicos antes descritos, tivera uma atuação crucial na escolha e negociação de tecnologias e na montagem das plantas, pressionando para uma gradual nacionalização dos insumos tecnológicos. Posteriormente, investira diretamente, através de sua subsidiária Petroflex e do Centro de Pesquisas da PETROBRAS (CENPES) na absorção e desenvolvimento de processos, atuando por vezes em conjunto com a PETROBRAS e com outras empresas do setor18. O CENTEP representava assim um desdobramento desta trajetória mas, ao mesmo tempo, visava introduzir uma mudança qualitativa na dimensão e complexidade das atividades tecnológicas realizadas pelo Sistema.

As subsidiárias de firmas estrangeiras, menos estudadas que as firmas nacionais, parecem ter seguido uma trajetória similar. Apoiados na P&D do grupo, desenvolveram no país a capacidade de realizar melhorias de processo e, notadamente, modificações de produtos visando atender as especificidades da demanda local. Os dois principais grupos estrangeiros apresentavam intensidades de gastos em tecnologia semelhantes às firmas nacionais, embora em volume fossem superiores devido ao seu maior faturamento. Comparados com os gastos das casas-matrizes esses gastos eram, obviamente, marginais. 

Em síntese, até o fim dos anos oitenta, as estratégias tecnológicas das empresas petroquímicos movem-se num âmbito relativamente restrito, entre um patamar mínimo de atividades tecnológicas e um teto as ambições destas. Os limites desse campo são definidos estruturalmente, ao nível setorial19. O patamar mínimo e determinado pelas especificidades do mercado local e pelas limitações do processo de transferência de tecnologia, que impõem o desenvolvimento de capacidades tecnológicas atinentes a melhorias de processos e produtos. Esse patamar, conforme foi visto, vai se elevando ao longo do tempo em função do aprendizado – de produção e de interação com os usuários – e do próprio desenvolvimento da indústria, que passa a produzir bens mais complexos com processos sujeitos a menores margens de tolerância. Trata-se pois de um processo evolutivo normal dentro do ciclo de maturação industrial.

A determinação do teto e mais complexa que a do piso. Fatores sistêmicos como a carência de instituições de pesquisa restringem esse teto. No entanto, a própria ação das empresas, ao concentrar suas atividades intramuros perpetua essa carência, em um processo cumulativo. Mais importantes, porém, que os fatores sistêmicos são as características estruturais da indústria petroquímico brasileira. Conforme já apontado, as empresas e os grupos petroquímicos são de um porte tal que, mesmo que investissem uma parcela muito maior do seu faturamento em atividades de busca e exploração tecnológica, o montante mobilizado seria pequeno em termos internacionais, provavelmente abaixo das escalas mínimas de P&D. O caráter monoprodutor dessas empresas, que limita economias de escopo, restringe ainda mais esse teto. 

Cabe, porém, indagar se deslocar o teto era uma prioridade na estratégia das empresas. As informações disponíveis sugerem que a força dos sócios estrangeiros, que torna essas empresas “quase-empresas”, na feliz caracterização de Oliveira (1994), e a estratégia desses sócios, puseram um freio ao deslocamento do teto. No entanto, mesmo para os sócios privados nacionais esse deslocamento não parece ter sido prioritário, como indica a baixa intensidade de gastos em tecnologia e outros dados acima apontados. Os limites da trajetória tecnológica seguida pelo setor pareciam plenamente internalizados pelas empresas, sugerindo uma estratégia “satisficing”, com um horizonte restrito. Raras foram as direções dos grupos entrevistados por Erber e Vermulm (op.cit.) que concediam importância a programas mais ambiciosos de pesquisa – não por coincidência suas empresas eram as que mais gastavam em tecnologia. Nesse sentido, a perspectiva da aglomeração de empresas e exemplar – justificada por economias de escala de vários gastos, administrativos especialmente, em nenhum caso a realização de atividades tecnológicas foi mencionada pelos executivos do setor como motivo de formação de grandes grupos (ibid.).

O papel desempenhado pelo aparato regulatório nesse quadro é complexo. O alcance do patamar mínimo acima estilizado foi, em boa medida, um resultado da regulação do setor, antes descrita (p.ex. via participação da Petroquisa e do INPI na negociação dos contratos de transferência e na implantação e operação das fábricas). As empresas entrevistadas por Erber e Vermulm (1993) reconhecem esse resultado, embora os autores também detectem o ressentimento quanto a hegemonia tecnológica exercida pela Petroquisa. 

A ação do aparato regulatório a partir de meados dos anos setenta, pode ainda ser interpretada como uma tentativa de elevação do teto, mediante instrumentos que combinavam a dissuasão ao uso exclusivo da tecnologia importada (INPI, Petroquisa e BNDE), a intervenção direta em atividades tecnológicas (CENPES e Petroquisa) e o estímulo creditício aos investimentos em tecnologia feitos pelas empresas (FINEP e BNDE). No fim dos oitenta, o projeto do Centro de Pesquisas da Petroquisa constituiu a última tentativa de “empurrar” o teto de atividades tecnológicas locais, modificando a sua escala e escopo.

Conforme apontado acima, a configuração empresarial do setor constitui um dos principais elementos que definem o teto de atividades tecnológicas. Essa estrutura resulta do regime de regulação definido para o setor. Argumentou-se acima que o aparato regulatório buscou empurrar esse teto para cima. A aparente contradição pode ser explicada pela hierarquia de objetivos da regulação ao longo do tempo e pelo próprio aprendizado tecnológico do aparato regulatório. Inicial e prioritariamente, tratava-se de viabilizar a implantação da indústria, sob propriedade privada e nacional – a isso serviu o modelo empresarial adotado (veja-se a seguir). A implantação dos dois primeiros pólos, feita rapidamente, foi um aprendizado tecnológico também para o aparato regulatório e, como vimos, o estabelecimento do pólo de Triunfo e marcado pelo esforço de elevar o teto de atividades tecnológicas. Vale lembrar que o domínio da tecnologia torna-se um objetivo importante para segmentos significativos do Governo apenas nessa época, a segunda metade dos anos setenta. Em outras palavras, outro aprendizado, da regulação, parece ter ocorrido. Ao objetivo de implantar atividades industriais somou-se, mesmo que secundariamente, o de aumentar o conteúdo tecnológico local, mediante os instrumentos acima descritos. No entanto, neste momento, o modelo empresarial do setor já estava definido e o objetivo tecnológico não tinha força para validar os custos de transformar esse modelo, especialmente no contexto de crise do Estado durante a década de oitenta.

Note-se ainda que o aparato regulatório tendia a agir descontinuamente, exercendo o seu poder junto às empresas principalmente em momentos de grandes expansões, mas deixando que estas definissem a trajetória tecnológica internamente. Mesmo a Petroquisa, o agente governamental que, em tese, mas poderia ter influenciado a trajetória das empresas, parece ter agido decisivamente na definição da estratégia tecnológica apenas no caso de uma subsidiária, totalmente controlada por ela. É’ possível que o projeto do Centro de Pesquisas da Petroquisa refletisse, em parte, a sua falta de poder de influenciar diretamente a trajetória de suas coligadas, onde os acordos de acionistas limitavam fortemente sua ação. Os empresários privados pouco apoiavam o projeto, seja por discordarem da sua localização junto a uma holding, distante da operação das plantas (confirmando assim a trajetória tecnológica anterior), seja por razões de poder (Erber e Vermulm 1993).

Apesar desses limites estruturais, na década de oitenta o teto de atividades tecnológicas parecia estar se deslocando, como indicam a elevação da intensidade de gastos em P&D, a crescente institucionalização das atividades tecnológicas e a implementação de programas mais ambiciosos em algumas empresas (p.ex. pesquisas de catalisadores). Esse movimento, desigual entre as empresas, e de alcance limitado, era facilitado pela maior familiaridade dos empresários com o setor, pelo amadurecimento tecnológico das equipes técnicas, inclusive pela experiência de atividades mais simples e pelo processo de saída de sócios estrangeiros, além da ação do aparato regulatório.

A crise dos noventa tem como efeito uma redução generalizada das atividades tecnológicas das empresas, especialmente as de escopo mais ambicioso, reduzindo-se a intensidade de gastos como percentual de vendas (Erber e Vermulm, 1993 e Coutinho e Ferraz, 1994). A implantação do Centro da Petroquisa e sustada e desmembra-se a equipe técnica responsável. As demais empresas tendem a manter principalmente aquelas atividades tecnológicas indispensáveis ao seu esforço de vendas, como as que estão direcionadas ao desenvolvimento de produtos no fim da cadeia e, algumas, a minoria, ao lado de reduzir suas atividades redirecionam-nas para o fim precípuo de redução de custos de operação de plantas. Desta forma, a crise tem por efeito rebaixar o “teto” dos programas tecnológicos das empresas do setor, aumentando a homogeneidade interna mas ampliando o hiato com o exterior.

Erber e Vermulm (1993) indicam que os gastos em tecnologia foram menos afetados entre os produtores de produtos finais que nos fornecedores de intermediários. Uma possível explicação para esse fenômeno residiria na maior vinculação entre vendas e gastos com tecnologia nos produtores de bens finais. Para esses fabricantes, as atividades tecnológicas que exercem, destinadas principalmente a adaptar variedades de produtos as especificações dos clientes ou a introduzir variedades desenvolvidas no exterior, constituem um prolongamento essencial das atividades de marketing, de onde, em boa medida se originam. Fazem, pois, parte dos custos fixos da empresa, indispensáveis à sua presença no mercado. É pois plausível que, face a uma retração de demanda, estes gastos sejam mantidos como parte de uma estratégia de sobrevivência. Cabe lembrar que, até a época do estudo citado (fim de 1991), o volume de vendas de termoplásticos não havia declinado.

Em contraste, entre os produtores de bens básicos e intermediários, produtos cujas especificações são padronizadas, as atividades tecnológicas vinculam-se principalmente aos processos, visando reduções de custos e, principalmente, ampliações da capacidade de produção. Dadas essas características, tanto a redução como a reorientação de gastos acima observadas são consistentes com um quadro recessivo, onde os investimentos são paralisados e torna-se urgente reduzir custos. Parece significativo que, entre esses fabricantes, sejam as empresas mais capacitadas tecnologicamente as que mais prontamente infletem sua trajetória.

Em síntese, a reação das empresas em termos de atividades tecnológicas e francamente contracionista. Mesmo atividades defensivas, que levam a uma redução de custos concomitante com aumentos de produtividade são adotadas apenas por uma minoria. Na maior parte das empresas a redução de custos e lograda mediante ajustes quantitativos na produção e demissões de pessoal, que pouco resguardam as equipes tecnológicas e não introduzem maciçamente inovações. Nesse contexto, não se registram referências aos programas governamentais de aumento da competitividade (Erber e Vermulm, op.cit.).

Em outras palavras, se a crise não traz o fim das atividades tecnológicas das empresas petroquímicos, esse resultado não deve ser atribuído a um marcado espírito schumpeteriano dos empresários nem a eficácia de mecanismos anticíclicos da política industrial mas, antes, ao patamar de intensidade tecnológica logrado pela indústria, que, especialmente entre os produtores de bens finais, não pode ser rebaixado, sob pena de inviabilizarem-se economicamente as empresas. No entanto, a crise parece conduzir, sim, a um rebaixamento do teto da trajetória tecnológica do setor, levando a descontinuidade dos programas mais ambiciosos de pesquisa. Neste sentido, aumenta, de forma perversa, a homogeneidade do setor. O esqueleto do prédio inconcluso do Centro de Pesquisas da Petroquisa simboliza bem a descontinuidade da política governamental de tentar elevar o teto da trajetória tecnológica.

No biênio 1993/94, apesar da recuperação do nível de atividade, antes discutido, não se constata a retomada dos investimentos em tecnologia, mantendo-se o achatamento do teto acima analisado.

A maior possibilidade de exportar para o Brasil, alternativa normalmente preferida por fornecedores externos, aponta para a redução da oferta de licenciamento de tecnologia, especialmente aquele em que não há vínculos societários entre as partes. Em consequência, tende a aumentar a heterogeneidade entre firmas nacionais e estrangeiras e o hiato tecnológico que separa as primeiras da fronteira internacional. 

No entanto, exceto para algumas poucas empresas, não se trata aqui de uma inflexão de trajetória, mas antes de reforço de limites estruturais já existentes. Houvesse um projeto de fazer no país uma indústria tecnologicamente inovadora, estaríamos na presença de uma grande inflexão. Este projeto foi delineado durante a década de setenta principalmente por aparatos estatais e acadêmicos, mas é duvidoso que tenha sido seriamente perfilhado pelo empresariado nacional, devido aos próprios limites estruturais antes discutidos. Para as empresas estrangeiras, atuando seja sob a forma de filiais ou joint-ventures, a internalização de atividades de P&D no Brasil não oferecia qualquer vantagem locacional. 

Embora a retórica dos Governos da década de noventa acene, por vezes, com um projeto fortemente inovador, a combinação de instrumentos que caracteriza a sua política industrial e de comércio exterior aponta para um projeto tecnologicamente mais modesto, de capacitar a indústria brasileira a, essencialmente, produzir com mais eficiência utilizando os resultados da inovação externa. No entanto, mesmo dentro deste âmbito mais restrito, a redução das atividades tecnológicas acima descrita torna-se relevante pelo que implica em termos de redução de capacidade competitiva num processo de abertura às importações. É possível que, conforme auspiciava a política do Governo Collor, as empresas venham a retomar suas atividades tecnológicas sob o acicate das importações, nos limites acima expostos. Nada porém aponta nessa direção e, é importante reiterar, mesmo que ocorra, seus resultados levarão tempo a amadurecer, seja porque os prazos nesse campo tendem a ser largos, seja porque muitas equipes foram desmanteladas e sua recomposição e efetiva operação também demandam tempo.

4. – Quo vadis regulation ?

Conforme vimos acima, a implantação da indústria petroquímico brasileira foi feita sob um regime de regulação predominantemente estatal, que abrangia desde a seleção e fomento dos participantes até a determinação dos preços de venda dos produtos, sintetizado no Quadro 11, a seguir. Os mecanismos de regulação via mercado eram frágeis e os de cooperação fora da alçada estatal praticamente inexistentes.

Esta regulação surge em consequência do fracasso das forças de mercado em gestar no país uma indústria petroquímico e visava, primordialmente, sanar esta lacuna, sujeita a duas restrições políticas: que o controle das empresas fosse nacional e privado. O modelo empresarial tripartite surge como uma solução para o objetivo e suas restrições, saudado a época como um verdadeiro ovo de Colombo. O mesmo modelo obviava outra restrição importante: o acesso a tecnologia. A implementação do modelo viria a resolver outra restrição – a falta de empresários locais, atraindo para o setor grupos de origem distinta, mediante incentivos que reduziam drasticamente o custo e o risco da entrada na indústria. 

Pode-se, obviamente, questionar o objetivo da regulação. No entanto, esta questão só tem sentido quando colocada no seu contexto histórico. Neste, no Brasil do fim dos anos sessenta e início dos setenta, em pleno período do “milagre”, em que a substituição de importações aparecia como a via mais fácil e consensual de desenvolvimento industrial, visto por sua vez como caminho de realização de uma trajetória natural de expansão econômica e de soberania nacional, a resposta era inequívoca: havia necessidade de ter no país uma indústria petroquímico. Em verdade, historicamente, a questão nunca foi posta. Mesmo atualmente, com todos os ventos liberais, não se coloca. Embora a sustentabilidade da atual estrutura petroquímico seja questionável à luz da abertura às importações, conforme enfatizado a seguir, no quadro político brasileiro a desindustrialização do setor não parece um objetivo legitimado.

Aceito o objetivo de implantação da indústria e considerado o quadro mais amplo da substituição de importações, o regime de regulação adotado foi muito eficaz em termos de constituir a produção local e, inclusive, conquistar mercado externos, conforme avalia o Banco Mundial, instituição insuspeita de simpatias por aquele tipo de regime (World Bank 1989). Embora os incentivos ao investimento tenham provavelmente sido redundantes especialmente no caso do pólo da Bahia, e as empresas atuassem protegidas contra a entrada de novos competidores e de importações, a regulação da operação, baseada no controle de preços e no suprimento da nafta pela PETROBRAS, repartiu as rendas entre produtores e consumidores. Os piores excessos normalmente atribuídos a industrialização substitutiva de importações parecem ter sido, pois, evitados. No entanto, o regime não logrou expandir a produção petroquímico brasileira para os ramos presentemente mais dinâmicos e de maior valor agregado – as especialidades. Quando tentou substituir importações em químicas fina, já era demasiado tarde: o padrão substitutivo já havia se esgotado no resto da economia, sendo submerso pela onda liberal. Talvez a regulação petroquímico tenha sido, neste aspecto, vítima do dinamismo das cadeias de commodities, cuja expansão e operação absorveram suas energias.

Mais duvidoso e o sucesso dos outros dois objetivos do regime: controle privado e nacional. Quanto ao primeiro, embora a maioria das empresas estivessem sob controle acionário privado, o sistema de regulação condicionava estreitamente sua dinâmica. Em consequência, fortes conflitos de poder eram inerentes ao regime, especialmente a medida em que os grupos privados nacionais ganhavam familiaridade com o setor e passavam ressentir a interferência estatal. O controle nacional, do setor e das empresas, também é questionável. Embora a tentativa de uma filial estrangeira de estabelecer um pólo independente tenha sido obstada, estas empresas continuaram a desempenhar um papel importante no setor. Nas empresas estabelecidas sob o modelo tripartite, os acordos de acionistas e a baixa capacidade de inovação lograda, garantiam aos sócios estrangeiros um forte controle das decisões. 

Os comentários acima remetem aos dois problemas principais legados a atualidade pelo antigo regime de regulação: a estrutura empresarial e a capacidade de inovação. Os critérios e procedimentos do sistema regulatório que gestou a indústria petroquímico brasileira associados às características de porte e experiência dos grupos empresariais nacionais que entraram nesta indústria, produziram uma estrutura empresarial singular no quadro mundial da petroquímico: embora as fábricas sejam frequentemente de porte internacional, as empresas não são. As firmas brasileiras são pequenas, contando apenas com uma ou poucas fábricas, frequentemente monoprodutoras, com um faturamento da ordem de US$ 100/200 milhões, ínfimo em termos internacionais. Mesmo os maiores grupos têm pequeno porte, pouco superando o bilhão de dólares. A participação dos grupos empresariais nacionais e estrangeiros na cadeia e em empresas e fragmentada, com baixa sinergia. O controle das empresas e compartilhado e os acordos de acionistas permitem vetos sobre decisões estratégicas que têm efeitos paralisantes. A multiplicidade de sócios estrangeiros, que competem em escala internacional, limita o processo de aglutinação no Brasil. Ou seja, uma estrutura empresarial singular na morfologia e na inadequação dinâmica para competir em condições de igualdade com os grupos internacionais.

Conforme visto anteriormente, objetivos tecnológicos ganharam peso no sistema de regulação quando a estrutura empresarial do setor já estava definida. Apesar dos esforços do sistema de regulação para elevar o piso e o teto das atividades tecnológicas entre os quais movia-se a indústria petroquímico brasileira, minorando os problemas que ele próprio gestara, esta estrutura empresarial define um teto bastante baixo para a trajetória tecnológica do setor, limitando fortemente a constituição de uma capacidade de inovação interna e reforçando os laços de dependência e a vulnerabilidade externas. Cabe reiterar que, salvo algumas exceções, a mudança de patamar tecnológico não aparece como uma prioridade para os empresários privados do setor. Neste sentido, não se distinguem dos demais empresários estabelecidos no país (nacionais e estrangeiros), refletindo um dos problemas estruturais da industrialização brasileira.

Constituído o setor, o regime de regulação apresentava, já na segunda metade dos oitenta, fortes sinais de erosão, evidenciados pelas dificuldades, já apontadas, de arbitragem no PNP, no excesso de capacidade de produção de alguns produtos e nas flutuações de margens acarretadas pelo controle de preços. O aprendizado do ofício empresarial petroquímico pelos grupos privados nacionais tornava-os mais avessos ao controle estatal, reduzindo a legitimidade da regulação vigente. Tal declínio, não acidentalmente, dava-se em um contexto em que o Estado brasileiro, incapaz de manter a estabilidade de preços e os investimentos em infra-estrutura, havia perdido completamente a visão estratégica que dera sentido a regulação substitutiva de importações. 

Os anos noventa testemunham o desmonte desse sistema de regulação, na forma antes descrita. Os eventos desta década, antes relatados, mostram que, na petroquímico como em outros setores, a regulação através de mecanismos hierárquicos estatais não foi substituída por mecanismos de cooperação. – ao contrário, o nível de conflito parece ter aumentado. Embora a retórica governamental e dos agentes privados enfatizasse a regulação através de mecanismos de mercado, a prática dos atores privados sugere uma forte preferência por mecanismos hierárquicos, estabelecidos por meio de relações de propriedade – o que talvez constitua outro exemplo do peso da história em decisões estratégicas. 

A concepção do desmonte e o seu timing já foram comentados, brevemente acima e mais extensamente em trabalhos anteriores (Erber 1993; Erber e Vermulm 1993), bastando reiterar seus pontos mais salientes: a ausência de um desenho estratégico para o setor; as dificuldades causadas pela conjugação do desmonte com uma situação de crise macroeconômica no país e no setor petroquímico internacional e, finalmente, a falta de políticas compensatórias, mesmo as medidas defensivas existentes em qualquer economia aberta, como mecanismos eficazes de defesa contra práticas de comércio desleal. 

Embora tenha sido feito no bojo de um movimento mais amplo de mudança do regime regulatório nacional, em que se pretendia conferir papel predominante ao mercado, reduzindo drasticamente as funções do Estado, é importante notar que o desmonte do regime setorial petroquímico não foi apenas exógeno – contou com o forte apoio das empresas privadas do setor, confirmando a erosão da legitimidade da velha regulação. Em outras palavras, os atores privados do setor petroquímico criticavam o processo de desmonte no que este ameaçava sua rentabilidade e, em última instância, sua sobrevivência – notadamente as provisões relativas a abertura e ao preço da nafta – mas não a ideia do desmonte em si.

As consequências negativas do desmonte, na forma em que foi executado, já foram expostas: o aumento da incerteza, a paralisação de investimentos, o rebaixamento do teto dos programas tecnológicos, pondo-se termo as iniciativas mais ambiciosas, o corte na diversificação rumo a químicas fina e o aumento da vulnerabilidade externa. Mais grave, porém, é a falta de um desenho estratégico para a estrutura empresarial do setor, que é inadequada ao contexto de abertura às importações. 

No período 1990/92, a contestabilidade do mercado brasileiro pelas importações e a conformação de grupos empresariais capazes de enfrentar a competição internacional estavam visivelmente articuladas, posto que a estrutura empresarial vigente dificultava a competição com as importações e estas impunham tetos as margens de acumulação dos grupos. Assim, a reestruturação empresarial constituía um elemento fundamental de enfrentamento da abertura.

No entanto, no Brasil como alhures, a incidência e o timing das medidas de abertura e reestruturação são distintos. As primeiras medidas incidem direta e imediatamente sobre o mercado, o faturamento e a rentabilidade das empresas. As segundas, operando inicialmente sobre a estrutura patrimonial, apenas mediatamente vão incidir sobre os custos. Da mesma forma, a implementação das medidas de abertura tem caráter imediato enquanto as medidas de reestruturação requerem um longo tempo de gestação e prazos relativamente longos de realização20.

As especificidades brasileiras agravavam substancialmente o desequilíbrio acima descrito, de natureza estrutural. Do lado da política de abertura, a tradição do uso de barreiras não tarifárias legou uma estrutura institucional pouco preparada, em termos de recursos humanos e financeiros e instrumentos legais, para a defesa dos produtores nacionais contra práticas desleais de comércio, que são corriqueiras no mercado petroquímico internacional. Do lado da política de reestruturação, a complexidade da estrutura empresarial petroquímico brasileira dificultava lograr, em prazo relativamente curto, uma configuração competitiva, objetivo que a política de privatização logo abandonou. Abertura e reestruturação tornavam-se ainda mais imbricadas pelo controle do fornecimento da nafta pela PETROBRAS, que a tornava parte fundamental na definição da competitividade internacional da indústria e na configuração da sua estrutura empresarial.

Durante o período 1990/92 as vinculações acima descritas tornaram-se muito visíveis devido ao baixo nível de preços e a sobre-oferta de produtos petroquímicos no mercado internacional e, como vimos, apesar da PETROBRÁS ter mantido os preços da nafta abaixo dos níveis internacionais, as margens de rentabilidade das empresas petroquímicos tornaram-se negativas. No entanto, o processo de privatização, naquele período e no biênio posterior, não conduziu a uma configuração empresarial competitiva em termos internacionais. A reversão do ciclo de preços internacionais em 1993, causada em parte por fatores conjunturais como acidentes, mascarou o problema mas não o resolveu. Em consequência, o setor permanece extremamente vulnerável a uma contestação externa. 

Em 1995, o desmonte deve ser concluído. Prevê-se para este ano a finalização da privatização do pólo da Bahia e a flexibilização do monopólio da União, no âmbito das reformas constitucionais em curso, cujas consequências para o abastecimento e preços da nafta não são claras.

A conjuntura atual, em que estão combinados condições expansivas do mercado interno com uma fase de ascensão dos preços internacionais, abre um espaço para a transformação estrutural da petroquímico brasileira em termos de configuração empresarial, gama de produtos e capacitação tecnológica. A indústria e o Estado ganharam um tempo para definir um novo regime de regulação para o setor, que permita sua sobrevivência e crescimento em um quadro de abertura a competição internacional. Esse tempo não é infinito e está fora do controle nacional, posto que é definido pela evolução do mercado internacional, cuja natureza cíclica e agravada pela entrada de novos grandes produtores. O prazo de maturação de um novo regime aumenta a urgência de dar início ao processo. 

Mesmo atendo-se a perspectiva ortodoxa, atualmente hegemônica, ao Estado caberiam papéis importantes na configuração de um novo regime de regulação, atuando onde o mercado e notoriamente falho, como na busca de uma visão estratégica para o futuro do setor, na coordenação de agentes públicos e privados e no suprimento de recursos financeiros de longo prazo para investimentos em produção, tecnologia e reestruturação empresarial. Essas medidas redutoras de custos e, especialmente, de riscos para as empresas poderiam ter como contrapartida o reforço da legislação de defesa contra abusos do poder econômico e compromissos de desempenho das empresas. Dada, porém, a orientação do atual Governo, parece provável que caberá aos empresários o principal papel no processo de definição desse regime. A capacidade do setor privado de estabelecer um novo regime de regulação, envolvendo mais mecanismos de cooperação, será o teste decisivo do seu amadurecimento e, consequentemente, do sucesso do antigo regime de regulação. 

Para concluir, retomando um tema subjacente à análise anterior, vale a pena enfatizar que o regime de regulação setorial realiza-se em um quadro de regulação mais ampla, de âmbito nacional. Assim como a antiga regulação tinha sentido e legitimidade pela sua inserção em um padrão de desenvolvimento substitutivo de importações, fundado sobre uma aliança entre o Estado e o empresariado e o desmonte dessa regulação faz parte de um processo igualmente abrangente, a nova regulação só será possível em um quadro econômico e político que lhe garanta eficácia. A incerteza quanto à existência futura desse quadro constitui a principal ameaça a sobrevivência da indústria petroquímico brasileira.

* F. Erber, Professor da Faculdade de Economia e Administração e do Instituto de Economia industrial da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Agradeço a colaboração de José Clemente de Oliveira e José Eduardo Pessoa de Andrade e os comentários de Daniel Chudnovsky a uma versão preliminar do artigo, eximindo-os, porém, de qualquer responsabilidade. Este artigo foi escrito para a CEPAL, Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe, entre maio e agosto de 1995. 

 

QUADRO 11

REGULAÇÃO ESTATAL NO SETOR PETROQUÍMICO

1) Mecanismos redutores de incerteza do investimento

1.1) Proteção contra importações – CACEX e CPA

1.2) seleção de participantes do setor – CDI

1.3) Fornecimento de matérias-primas – PETROBRAS (nafta) e Petroquisa (centrais dos pólos)

1.4) Aporte de capital de risco – Petroquisa, BNDE e FINOR

1.5) Escolha de tecnologia – Petroquisa

2) Mecanismos redutores de custo do investimento

2.1) Crédito favorecido para capital fixo – BNDE

2.2) Crédito para atividades tecnológicas – FINEP

2.3) Apoio técnico para implantação de fábricas e atividades tecnológicas – Petroquisa e PETROBRAS

2.4) Incentivos fiscais para equipamentos nacionais e importados – CDI

3) Mecanismos redutores de custos de operação

3.1) Preço da nafta – PETROBRAS

3.2) Incentivos fiscais – isenção de imposto de renda (Bahia), crédito de imposto de circulação de mercadorias (Bahia) e depreciação acelerada (todos).

4) Mecanismos de apoio à exportação

4.1) Preços diferenciados – Petroquisa, PETROBRAS

4.2) Incentivos fiscais – BEFIEX

4.3) Comercialização – INTERBRAS/PETROBRAS

5) Pressões para realização de atividades tecnológicas no país

5.1) Na contratação de tecnologia importada – INPI

5.2) Na concessão de crédito – BNDE

5.3) Diretamente – Petroquisa

6) Mecanismos de coordenação 

6.1) Bilaterais: diversos, especialmente PETROBRAS/BNDES

6.2) Multilaterais: CDI

Referências Bibliográficas

ABIQUIM, Associação Brasileira da Indústria Químicas e Produtos Derivados (1992) Estudo da Competitividade da Indústria Petroquímico Brasileira, ABIQUIM, São Paulo

ABIQUIM, Associação Brasileira da Indústria Químicas e Produtos Derivados (1995) Relatório Anual do SDI - 1994, ABIQUIM, São Paulo

Araújo Jr, J. e Dick, V. (1974) Governo, Empresas Multinacionais e Empresas Estatais: o Caso da Indústria Petroquímico, Pesquisa e Planejamento Econômico, v.3 n.4.

Bastos, V. (1989) A Questão Tecnológica nas Joint-ventures Petroquímicos Brasileiras, Tese de Mestrado, Instituto de Economia industrial, Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Baumler, E. (1963) Baumler, E. , Econ-Verlag, São Paulo

Chem Systems Inc. (1992) Developing a Strategy for the Brazilian Petrochemical Industry, workshop para a ABIQUIM, Rio de Janeiro, mimeo.

Coutinho, L. e Ferraz, J. (1994) Estudo da Competitividade da Indústria Brasileira, Editora da UNICAMP/Papirus, São Paulo.

Erber, F. (1988) A Transformação dos Regimes de Regulação: Desenvolvimento Tecnológico e Intervenção do Estado nos Países industrializados e no Brasil, A Transformação dos Regimes de Regulação: Desenvolvimento Tecnológico e Intervenção do Estado nos Países industrializados e no Brasil

Erber, F. (1991) A Política industrial e de Comércio Exterior: Uma Avaliação, em Perspectivas da Economia Brasileira 1992, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, Brasília.

Erber, F. (1993) A Indústria Petroquímico: Crise, Regulação e Mercado, nstituto Nacional de Altos Estudos, Rio de Janeiro, mimeo

Erber, F. e Vermulm, R. (1993) Ajuste Estrutural e Estratégias Empresariais, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, Rio de Janeiro

Guerra, O. (1993) Estrutura de Mercado e Estratégias Empresariais: O Desempenho da Petroquímico Brasileira e suas Possibilidades Futuras de Inserção Internacional, Tese de Doutorado, Universidade Estadual de Campinas.

Limoeiro, C. (1991) Análise da Sensibilidade dos Preços dos Produtos Petroquímicos, Petrorio, Rio de Janeiro, mimeo.

Oliveira, J. (1990) Desenvolvimento Tecnológico da Indústria e a Constituição de um Sistema Nacional de Inovação: o Setor Petroquímico, Fundação Economia de Campinas, mimeo.

Oliveira, J. (1994) Firma e Quase-Firma no Setor industrial - O Caso da Petroquímico Brasileira, Tese de Doutorado, Instituto de Economia industrial, Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Quadros, R. (1992) Why the Market Reserve is not Enough: Lessons from the Diffusion of industrial Automation Technology in Brazilian Process Industries, em H. Schmitz e J. Cassiolato (comp.), Hi-Tech for industrial Development: Lessons from the Brazilian Experience in Electronics and Automation, Routledge, Londres.

Silva Filho, A. (1990) A Empresa Estatal no Desenvolvimento da Petroquímico Mundial, Petroquisa, Rio de Janeiro, mimeo.

Steinbaum, C. e Fernandes, V. (1992) Structural Initiatives for Competitiveness, Arthur D. Little, São Paulo, mimeo.

Teixeira, F. (1985) he Political Economy of Technological Learning in the Brazilian Petrochemical Industry, Tese de Doutorado, University of Sussex, Brighton.

Teixeira, F. (1987) Dinâmica Empresarial e Tecnológica das Empresas do Complexo Petroquímico de Camaçari, em Associação Nacional de Pós-Graduação em Economia, Anais 1987 v.1

World Bank (1989) industrial Regulatory Policy and Investment Incentives in Brazil, Washington, mimeo.

A Problemática do Emprego no Mundo e no...

2. A crise do emprego no mundo: o desemprego aberto,  a precariedade do emprego e a pobreza

As condições de emprego no mundo constituem um problema nada menos que dramático. Segundo o último relatório da Organização Internacional do Trabalho (OIT,...

The Political Economy of Technological Development: The Case of the Brazilian Informatics Policy

Fabio S. Erber, M. I. Bastos; C. Cooper. (Org.). Politics of Technology in Latin America. 1ed. Londres: Routledge, 1995, v. 1

The paper is divided into three sections. In the first the history of the Brazilian Informatics Policy (BIP) is recounted, from its origins to its end, focusing on the evolution of its objectives, instruments and the political alliances which supported and opposed the policy. It is based on the literature (notedly, Bastos 1992; Dantas 1988; Gaio 1992, Piragibe 1985 and Schmitz and Hewitt 1992), on interviews with policy-makers and on first-hand experience. The second section is more analytical and tries to explain the fate of BIP. It begins by restating the "model" of BIP and then proceeds to discuss its assumptions, first the technical and economic assumptions and the problems it met in its attempt to manage the technological gap and then the values and interests at stake and how it failed to retain social support. The last section comments on some of the results of BIP.

1. The BIP: a capsule chronology

Historical periodization of a policy necessarily involves a degree of arbitrariness because of the cumulative nature of the processes underlying the policy. As an example, it may be claimed that the origins of BIP lay in early fifties, when the ITA (Instituto Tecnológico da Aeronáutica – Air Force Technology Institute) started its electronics engineering course, which provided a considerable part of the technical expertise upon which the Policy was grounded and where a significant number of cadres responsible for the Policy was formed. Because we are dealing with a policy under an evolutionary approach the main criteria adopted here were life-cycle and institutional.

Following such criteria, we may say that the BIP’s life-span covers twenty years: from the creation of the Special Working Group (GTE – Grupo de Trabalho Especial) jointly established by the Navy and the National Economic Development Bank (BNDE) in 1971 to the new Informatics Policy Law of 1991, which drew BIP to a close. Such history may be subdivided into three periods, detailed below:

1.1. Infancy: From the GTE to CAPRE – 1971/75

During the fifties and sixties the Brazilian State (mainly the Federal Government but also the State of São Paulo) fostered the development of technical and scientific capabilities in fields related to BIP by supporting local academic institutions and by providing training abroad. However such support lacked any specific industrial purpose – the use of the resources thus developed was left to the market. The demand for electronic equipment was supplied either by imports or by local production by subsidiaries of multinational companies. As a consequence, employment of skilled personnel was directed mainly to selling equipment and using it, with a minority being absorbed by the academia. State agencies were major users of such equipment.

One of the main souces of funding for graduate education and research was the BNDE, the main industrialization financial agency of the country. Although the Bank’s department for science and technology (FUNTEC) was marginal to the agency, institutionally and resource-wise, it became an important breeding-ground for science and technology policy-makers. In 1968 the department had floated the idea of developing a computer prototype in the local universities. Independently, the Navy had adopted in 1969 a policy of fostering the local production of electronics equipment used for its vessels and airplanes. The purchase of British frigates equipped with computers brought the two agencies together, under a Special Working Group (GTE 111) which led to a project aiming at designing, developing and producing computers for naval use. As a consequence, in 1974 a company (COBRA – Computadores Brasileiros S.A. – Brazilian Computers) was established to produce such equipment – a joint-venture between the Navy supplier of computers to its frigates (Ferranti), a local supplier of other electronic equipment to the Navy (Equipamentos Eletrônicos) and the Bank. A second company was planned, under the same tripartite model, to produce commercial equipment, but never took off. 

In the same period the tripartite model, combining Brazilian State and private capital and foreing enterprises, the latter acting mainly as suppliers of technology, was successfully used for the establishment of the petrochemical industry in the Northeast of the country. The model was conceived in order to ensure simultaneous private and national majority of the capital of the new enterprises, at the same time it provided the enterprises access to foreign technology.

Simultaneously, other electronic data processing equipments were developed by State agencies, mainly for processing fiscal data and for cryptogaphy, and by some universities, mainly for academic purposes. In 1971, the Planning Ministry revamped a small agency dedicated to financing pre-investment studies (FINEP – Financiadora de Estudos e Projetos – Financial Agency for Studies and Projects) as a development bank for science and technology, initially run by bureaucrats from BNDES’s FUNTEC. The support of graduate education and research in computing sciences and the supply of computing equipment to universities soon became a priority of FINEP. 

At the user-end, the Ministry for Planning and Coordination established in 1972 a Commission for Electronics Processing Activities (CAPRE – Comissão de Atividades de Processamento Eletrônico) in order to rationalize the use and purchase of computers by the Federal Government as well as the training of personnel. In 1975, following the severe foreing currency restrictions due to the oil shock, CAPRE was empowered to control imports of computers, parts and components, which had become a main import item, increasing 600% between 1969 and 1974 (Piragibe 1985).

CAPRE was staffed by technical cadres originated from the bureaucracy and from the academia. In turn, CAPRE officers helped to organize scientific societies and meetings related to computing and the associations of electronics data processing professionals (e.g. systems analysts, programmers, etc). The three groups – bureaucrats (civilian and military), academics and professionals – formed BIP’s hard-core, providing its concepts and political support. Given the authoritarian nature of the regime, the former were audible within the State only but the latter two were quite vocal publicly.

Although the First National Development Plan (1972/74) and the First Plan for Science and Technology (1973/74) listed the computer industry among their priorities, singling out minicomputers, and in spite of the initiatives mentioned above, there was not a policy for the sector nor an agency in charge of it. Nonetheless, the main political and institutional building blocks of BIP had been laid down. 

1.2. From youth to maturity under bureaucratic rule: from CAPRE to SEI – 1976/1983

The Brazilian economic history of the second half of the seventies is dominated by the Federal Government Second Development Plan – a major industrialization thrust aiming at, on the one hand, completing the Brazilian industrial structure by large investments in the industries producing intermediary products and capital goods and, on the other hand, changing the energy matrix, by replacing gasoline by alcohol and by complementing the large investments in hydro power with an ambitious nuclear power program, jointly developed with the Federal Republic of Germany.

Underlying the Plan was the idea that Brazil was an “emerging international power”. Altough the Plan was led by the State its aim was to strenghten the nationally-owned enterprises but avoiding as much as possible to antagonize the multinational companies, especially those already established in the country.

The development of a local technological capability, including innovation skills, was an important part of the Plan’s design, since imports were associated with the undevelopment of such capability. Accordingly, FINEP’s resources for developing the research and graduate education system and for granting subsidized loans to technology projects of national enterprises were expanded. State enterprises were instructed to favour locally designed products in their purchases and they greatly expanded their own R&D centres. At the same time, stricter rules for importing technology were adopted, often conditioning imports to local technological efforts.

Parallel to the main thrust of the Plan, which aimed at completing the structure of production of the Second Industrial Revolution, the Government policy-makers established a set of policies aiming at high-tech sectors, the vectors of the Third Industrial Revolution: telecommunications, aeronautics, armaments, nuclear power and, last but not least, informatics. Such sectoral policies has two elements in common: the emphasis on local technological capabilities (including innovation) and the control of the sector by national enterprises.

Within this context, in the begining of 1976 CAPRE was restructured. gaining a Council composed by high officers of several Ministries and empowered to define a national informatics policy. The policy, stated in the middle of the year, had five main objectives:

i) to achieve technological capability to design, develop and produce electronic equipment and software in the country;

ii) to ensure that national firms hold a proeminent position in the national market;

iii) to create opportunities for the development of the informatics parts and components industry;

iv) to create jobs and, especially, more qualified employment for national engineers and technicians;

v) to generate a favourable balance of payments for informatics products and services.

Retaining its power to control imports, which were necessary to manufacture computers in Brazil, CAPRE was also empowered to analyse local manufacturing projects. However, it lacked any positive inducement policy instrument, such as credits or fiscal incentives. 

Within the sector, the priority lay with the segment of small systems, mini and microcomputers and their peripherals, which were not yet produced in the country and to which the efforts to develop national technology should be directed, while for larger systems, locally produced by subsidiaries of multinational firms, especially IBM and Burroughs, the emphasis was laid on rationalizing the investments by using the resources available. 

Under the leadership of BNDE, the State took control of COBRA’s capital and the company was turned around to become a supplier of commercial equipment, mainly for the banking system. A consortium of private banks took an equity interest, followed by the two other main Federal State banks (Banco do Brasil and Caixa Econômica Federal). Although it used licensed technology to produce its banking automation equipment, COBRA continued to invest heavily in its own projects, developing the small-systems concepts originated from the GTE. However, an important by-product of this decision was the reduction of the Navy’s support of the policy.

Simultaneously, IBM anounced its intention to produce locally its minicomputer /32. It was widely recognized that such production would kill the policy. As a consequence, battle-lines were drawn: on the foreground, on one side IBM and other multinational subsidiaries and on the other the academia and professional communities. In the background, the Government was deeply divided and subject to strong internal and external pressures.

Such conflicts, which lasted throughout 1976 and 1977, led to a bid to manufacture minicomputers in Brazil. Projects were assessed by CAPRE according to five criteria: local content of manufacture in terms of components and employment; technological “openness”, giving higher priority to projects which involved greater disclosure of imported technology and greater local technological development; control of the internal market in order to avoid excessive concentration in the hands of a single firm; local equity control and, finally, balance of payments conditions. Implicit, there was a belief that the import of technology would be a once-for-all affair and that next generations of the same type of equipment could rely on locally developed technology. 

Fifteen projects were submitted to CAPRE, out of which three were selected at the end of 1977. All three were based on imported technology with the appropriate clauses of openness. None of the suppliers of technology were industry leaders. In fact, the latter, through their subsidiaries in Brazil (IBM, Burroughs, HP, NCR, Olivetti and TRW) chose to present themselves to the bidding without local partners and with scant attention to the other conditions of the bid. Out of the pressure of segments of the intelligentsia and the bureaucracy and of the rigidity of the multinational leading firms the market reserve was born.

The market reserve for locally-controlled firms was applied to minicomputers and smaller systems only. Combined to import restrictions it implied that the segment of larger systems was de facto reserved to the subsidiaries of multinational firms already established in Brazil – mainly IBM and Burroughs. Because of its product mix the other main foreing supplier, Olivetti, stood more to loose from the policy and eventually withdrew from the sector. Although they were barred from the fastest-growing market segment, the other two, and more clearly IBM, henceforth changed strategy, refraining from explicitly attacking the policy and attempting to circumvent it by playing upon the definition of the borders of the policy, producing computers of “medium” size. However, other U.S. companies, such as Data General, totally excluded from the Brazilian market, started pressing the U.S. Government to take action against the policy.

In 1979, with the change in Government, a new actor came to the fore in the informatics policy: the national security community. Since the mid-seventies the National Security Council and the Foreign Affairs Ministry had been involved with informatics projects related to cryptography, developing equipment and software locally, which led to the creation of a specialized firm. Such experience strenghtened their perception of the weakness of the Brazilian electronics industry. Considering electronics strategic for the objectives of national security, interpreted at the time in wide-embracing terms, they considered CAPRE’s policies weak and limited in terms of the range of electronic activities and they viewed with suspicion its involvement with the academia, a traditional focus of resistance to the military regime. 

Holding very strong powers within the Government, the Security Council, supported by the Foreign Affairs Ministry, sought the control of the informatics policy. Such bid was largely unopposed by the economic ministries, at the time concerned mainly with the foreign adjustment of the economy and with controlling inflation. As a result, CAPRE, where the majority of the Council was held by civilian ministries, was replaced by a Special Informatics Secretary (SEI – Secretaria Especial de Informática) attached to the National Security Council. 

SEI immediately laid down its Directives of the National Informatics Policy. Contrary to many expectations, the objectives of local technological and industrial development under national control were maintained. In fact, the Directives is one of the few official documents in which the market reserve for national firms is explicitly aknowledged. Moreover, the range of activities covered by the policy was broadened so as to include software, national networks for data communication and all components of informatics products and services. 

SEI had three instruments to implement its Directives: the control of imports, the granting of permission to local manufacture and the supervision of purchases by State enterprises and agencies. However, in the latter case it was never able to develop a comprehensive policy for the multifarious Brazilian State. In order to foster local technological development, SEI established at the end of 1982 a research centre (Centro Tecnológico para Informática – Technological Centre for Informatics) with four areas of concentration: computing, process automation, instrumentation and microelectronics.

Over the next three years, following its Directives, SEI defined through its Normative Acts policies and participants in the areas of computers and peripherals, industrial automation equipment, electronics instruments, microelectronic components and software. However, progress in the latter two, the top priority areas, was slow, albeit for different reasons. In microelectronics there were two large industrial groups interested but they demanded fiscal and credit incentives which laid outside the pail of SEI and which the economic ministries were unwilling to give. As a result, investments were procrastinated while, internationally, the minimum scale of plants grew by leaps and bounds. For software, although SEI imposed import controls and conditioned the approval of manufacturing projects for general-purpose microcomputers to the adoption of operating systems locally developed, such measures proved to be ineffective against copying and smuggling of imported software.

Moreover,SEI’s attempt to establish a coherent policy for the electronics complex was foiled at two strategic points – telecommunications and consumer electronics. The first sector was ruled by the Communications Ministry, which followed an independent policy, where products were manufactured by firms which were nationalized subsidiaries of multinational companies using either the technology supplied by the former parent companies or the technology developed by the National Telecomms Research Centre. The second sector was located in a Free Trade Zone in the Amazons region, under the auspices of the Interior Ministry and its firms operated mainly as users of foreign designs and assemblers of imported components, directing their products to the internal market only.

Lacking any positive inducement policy mechanism, the efficacy of SEI’s policies was further undermined by resistance of the economic Ministries (Planning and Treasury), where the objective of local technological development had become a remote priority, as witnessed by decline in the funding of FINEP and the reduction of BNDES’ support to the policy. The same applied to COBRA, the State Enterprise which had led the market technologically in minicomputers, and which was left to languish in terms of mission and resources. The lack of financial incentives to investments affected especially the development of the strategic industry of microelectronics components, the core of the electronics complex, signalling to the firms involved a limited commitment of the Government to the policy.

SEI’s policies were obviously supported by the many industrial firms which had entered the market. However, the policy inevitably brought it into conflict with foreign subsidiaries previously occupying the Brazilian market, which often opted to leave the country altogether or to supply it via local licensors. Users of equipment also often resented the restrictions imposed on the supply and the inevitable higher costs of infant products. Moreover, the military nature of the Secretary estranged the academic community and parts of the civil bureaucracy which had previously supported the policy. Even the main beneficiaries of the policy – the local companies arisen under the umbrella of the reserved market – often resented the restrictions to imports of components and the power wielded by the bureaucracy. Hard-core supporters of the policy also complained about the “laxity” of SEI’s criteria about technology imports, putting a negative premium on the firms which invested more on the local development of technology.

With the end of the military regime on sight, the civilian supporters of the policy, especially the academics, the professionals and the industrialists more deeply committed to local technological development, sought the backing of Congress to pass a law giving the policy appropriate political legitimacy. At the same time, concerned with international pressures and wishing to establish the policy on firmer ground, the military backers of the policy within the Government were also led to submit a Bill to Congress, refraining from using the power of the Executive to pass a decree. 

1.3. Maturity and decay under the law: from 1984 to 1990

In 1984 the Brazilian Congress passed by unanimous vote an Informatics Law. Simbolically, the date was the same in which thirty years before the law creating the oil monopoly had been voted – possibly the single major victory of the country’s nationalist faction.

In essence, the Law was a ratification of CAPRE’s and SEI’s policies. It confirmed the prime objective of industrialization-cum-local technological development and the priority given to locally controlled firms. In this latter aspect it went a step further and defined the “local control” so as to involve technology – a feature latter embedded in the definition of “national enterprise” of the Constitution of 1988. Similarly, the scope of the policy, stemming from the definition of “informatics”, covered the whole electronics complex.

Institutionally, however, the Law led to a break in the previous mold, in which the policy was defined by the Executive alone. Now Congress had to approve the three-years Informatics Plans (PLANIN) and the Council in charge of presenting the Plans to Congress and taking the main decisions regarding the implementation of the policy included a strong representation of the civilian institutions supporting the policy (CONIN – Conselho Nacional de Informática e Automação – National Council for Informatics and Automation). SEI was retained as the executive secretariat of the Council.

The instruments of BIP were also nominally increased, although no mention is made of a market reserve. SEI retained the power to control imports, albeit for a period of eight years and gained the management of some fiscal incentives, especially for microelectronics and software. The creation of a special fund for financing R&D expenditures was vetoed by the President but CTI was confirmed as a policy instrument under the jurisdiction of SEI. COBRA, however, was left under the control of the State banks, the private consortium having left some years before, as the banks which participated in it developed individual informatization strategies and acquired interests in other informatics companies or established subsidiaries to supply banking equipment. Although the importance of State purchasing power as an industrial and technological policy instrument was recognized, no mechanism of coordination was established. In practice, since the fiscal incentives were very limited, the instruments of the policy remained the same as before the Law.

A major effect of the Law was to impart a much stronger legitimacy to the policy, strenghtening its power. However, the unanimity of the last vote in Congress was deceptive. In fact, BIP’s two main attributes – development of a local innovation capability under control of national enterprises – made it intrinsically conflictive. 

The period of preparation of the Bill and the debates in Congress showed that the opposition to the policy was not exclusive to politicians traditionally aligned with foreign interests but came also from a wide range of actors which felt their beliefs and interests threatened. This arc encompassed from objectors to the principle of State intervention to multinational companies active in the electronics complex, with, in between, officers from the economic ministries, local enterprises operating essentially with imported technology and multinationals from other sectors, fearful of the extension of the informatics policy to other areas.

As a result, the final version of the Law contained several compromises, the most important being the limitation of SEI’s power to control imports to eight years. Nothing was said about what would happen the day after. Some interpreted the deadline as the end of the market reserve and others argued that the control could be taken over by another agency (CACEX), which controlled the rest of Brazilian imports. The press, which strongly opposed the policy, supported the first view, which tended to become dominant.

With the new civilian Government, come into power in 1985, the informatics policy was entrusted to the newly-created Ministry of Science and Technology but telecomms and consumer electronics remained under different Ministries. Moreover, the politicians in charge of the three Ministries held diametrally opposed views about the policy, reflected within CONIN. Policy coordination within the electronics complex was rendered all but impossible. Support from the economic ministries was, at best, lukewarm and the retrenchement of the military power implied a weakening of the policy. 

Outside the Government, there was a backlash of the 1984 decision: while the supporters of the Law demobilized their forces, the opposers strenghtened theirs with a mounting press campaign. Since BIP provided a model which could be used for other industrial sectors the trenches gained new participants, especially from other high-tech sectors still undeveloped in the country – biotechnology and fine chemicals. On both sides the participants had the same origins as in informatics, but since the strenght of opposers (e.g. multinational firms from the pharmaceutical industry) was much greater than the supporters’ (e.g. small Brazilian firms producing fine chemicals), the net result of the proposals to expand the scope of the policy to other sectors was to weaken it further. 

Against this background of internal forces came a strong external pressure: in September 1985 the US government announced the start of an investigation into the Brazilian Informatics Policy and the possibility of economic retaliation if discriminatory or unfair trade practices were found against US interests. The possibility of restricting Brazilian exports to the US market of sectors (e.g. orange juice producers) which had nothing to benefit from BIP incresed the private sector opposition to the policy. Within the Brazilian government, the coming of a conflict at a time of balance of payments restrictions and intricate foreign debt renegotiations was anything but welcome at the economic and Foreign Affairs ministries .

In spite of this mounting pressure the Brazilian Executive and Legislative refused to change the Informatics Law and, in order to stem criticisms, SEI was reorganized in 1986 so as to gain greater administrative efficiency. Nonetheless, an incremental process of deterioration of the policy got under way, especially from 1987 onwards, as the more nationalistic faction of the ruling party got weaker and the economic conditions of the country worsened.

Thus, CONIN gave way to US pressures in several instances of import restrictions and Congress passed a Software Bill which was a clear compromise with US demands. A major turning point in the policy, because of the growing importance of software for the sector, the Bill provided very limited protection to locally-developed software, undermining thus the core of BIP. Moreover, the President of the Republic stated to the press that informatics was a “special case”, killing the expansion of BIP to other sectors, and that he would not repeat the vote favourable to the Informatics Law he had given in 1984 as a Senator. Following this, the Presidency took several administrative measures, e.g. regarding the control by SEI of imports for the assembly of electronic products in the Amazon Free Trade Zone and the classification of enterprises as “national”, which gave clear signs that the Executive was withdrawing its support to the policy. 

Less obviously, but not less effectively, the Ministry of Finance put a low ceiling on SEI’s foreign exchange allowance. The imports of electronic products depended on such quota and were restricted accordingly, creating considerable strain between SEI and users of such products, with the former taking the blame. Moreover, a blind eye was turned on smuggling of electronic products, which reduced the market for locally produced goods and services and jeopardized the results of projects aiming at local technological development.

Possibly anticipating the demise of the policy, some of the leading Brazilian informatics firms strenghtened their technological links to foreign suppliers and laid the ground for future joint-ventures, at the same time they used smuggled components massively, undermining the core of BIP and making its end a self-fulfilling prophesy. Such strategies were deeply resented by the enterprises more deeply committed to the technological objective of the policy, causing a rift in the informatics entrepreneurial community.

Under such pressures BIP’s policy-making apparatus lost all initiative. SEI, accused of rigidity, ended up by condoning entrepreneurial strategies, such as those mentioned above, which run counter the heart of the policy and CONIN was unable to present Congress with a strong II Plan for the sector, leading to the extension of the First Plan. The absorption in 1989 of the Ministry of Science and Technology by the Ministry of Industry, then run by a notorious oponent of BIP, put an institutional lid on the policy.

Therefore, at the end of eighties, the Brazilian Informatics Policy in its pristine form was agonizing. However, it was not dead yet and, besides the entrepreneurs of the sector, it could still rally support from important segments of society, especially in the intelligentsia and the bureaucracy. Among such supporters there was a consensus, made explicit during the discussions preparatory of the II PLANIN, that the policy should and could be revived, albeit introducing major changes. Such modifications should lead to a greater product selectivity, restricting the range of products to which it should be applied. Local manufacture should embody an increase in the import content so as to better profit from external technological developments and should aim at cost reductions and at exports. It was hoped that if such changes were introduced, the policy could regain internal political legitimacy and retain its main pillars – the commitment to local technological development and the fostering of locally controlled firms.

However, the Presidential elections held at the end of 1989, when the economy was bordering hyperinflation and the State policy-making capability was reduced to a minimum, led to the victory of a candidate explicitly committed to a reduction in State intervention and an opening of economy to imports and foreign capital. 

The supporters of BIP, especially the academics, tried to rally public support to the policy, attempting to revive the Brazilian Informatics Movement (MBI) which had been the mainstay of the 1984 campaign, but with very little success. ABICOMP, the national producers association, preferred instead futile attempts to negotiate with the Executive, ignoring that the past alliance with the bureaucracy was dead. Committed to put an end to the policy, the Executive adopted in 1990 administrative and legal procedures to such purpose, such as withdrawing the II PLANIN from Congress, reducing the number of products subject to import controls and extinguishing SEI. Appropriately, the last battle was fought in Congress and a new Informatics Bill was passed in 1991, after a strong press campaign against the old policy, especially against Congressmen who supported it. 

The new Law changes the concept of “national enterprise”, reducing it to a majority of capital, which allows for joint-ventures in which technological control is in the hands of the foreign partner. CONIN was downgraded and its composition altered, reducing the weight of the groups previously supporting BIP in favour of its opponents. SEI was extinguished and replaced by a Department (DEPIN) of a new Ministry of Science and Technology, holding practically no powers. 

The Bill replaces import administrative controls by tariffs, which decline over time. By 1994 tariffs will range from 35% for finished goods to nil for components not produced in the country. As positive inducement mechanism the Law envisages fiscal incentives for local production and for R&D activities, as well as the use of the State purchasing power. However, none of such mechanisms was yet implemented.

Buffeted by the combination of general recession and policy changes, the industry went into a deep crisis, of which there is no end on sight: as compared to 1989, it is estimated by DEPIN that in 1992 the local industry had reduced net earnings, employment and R&D investment by, respectively, 47%, 60% and 69%. So far the worst affected were producers of components and peripherals. Suppliers of banking automation equipment and of computers have fared relatively better – the former because they have a leading edge on technology combined with a captive and rich market and the latter by virtue of associations with foreign companies. Such partnerships have led to the abandonment of all plans of local technological development and entail no small risks for the survival of the local firms when import liberalization will come into full stride. 

Although it is beyond the scope of this paper to develop more fully conjectures about the future of the electronics industry in Brazil, it is clear that a chapter of the country’s science and technology and industrial policy has come to an end.

2. Objectives, scope, instruments and social support

2.1. Objectives and scope

BIP was an ambitious project, to say the least. It aimed at creating a high-tech sector – first an industry and later the whole electronics complex – in a developing country, endowing such industry with the full range of technological capabilities – from research to marketing – under the control of national entrepreneurs. The two attributes – technological self-reliance and national enterprises – made up its diferentia specifica, carrying it a step further traditional import-substitution policies, which relied almost exclusively upon imports of technology, especially for innovation activies, and upon subsidiaries of international companies. 

The two attributes were organically linked: it was correctly assumed that the subsidiaries of multinational companies would not invest in research and development in Brazil, having the option to do so nearer their parent companies, in locations where they enjoyed strategic and systemic advantages. Therefore, only national companies would be a vehicle for a relative innovation capability. As shown by other sectoral experiences (e.g. petrochemicals), joint-ventures with international companies where the latter held the control of technology did not lead to the transfer of technological innovation capabilities to the local company. Therefore, wholly locally owned companies were necessary. If madness it was, there was method in it.

However, the two attributes were never unqualified. Technological self-reliance was never confused with autarchy: technology imports were always an important part of the strategy, as the starting point for local production, although it was assumed that, over time, they could be replaced by local alternatives. As originally envisaged, it was assumed that having mastered the innovation capability for a family of products (e.g. minicomputers), based on a combination of technology imports and endogeneous investments, the local firms would be able to prescind from further technology imports, being able to follow the international frontier.

This process would be “horizontally” repeated, for new product families (e.g. microcomputers), widening the scope of the policy, but it was understood that this scope was restricted by economic and technlogical factors – e.g. mainframes were excluded. Nonetheless, the technological interdepencies which are characteristic of electronics industries, making them an “industrial complex”, led to a substantial widening of the scope of the policy.

In other words, the objective of the policy, in its most radical version, was to close the technological gap over time for a selected but widening range of families of products. It was a process of import substitution in which local manufacturing and innovation capabilities were sequentially developed . Protection against imports – of products and of the design built-in into such products – was regarded as essential to such purpose. As originally envisaged, such protection should be coupled to positive incentives such as venture capital, credits, tax reductions and State procurement. Thus, to the risk-reduction imparted by import controls should be added other measures, which would reduce risks and costs and accelerate the catching up process. However, as already pointed out, the second part of the policy instruments was never fully set up, retarding the closing up of the technological gap.

The other attribute was qualified too: national enterprises were supposed to take over only the product fields not previously occupied by multinational subsidiaries. This strategy, designed to come to grips with economic and technical realities of the computer sector as well as to reduce the policy conflicts, was applied mainly during CAPRE’s rule. As the policy broadened its scope, the “empty space” approach become more difficult to follow, eventually leading to the exit of some multinational companies as producers in Brazil.

2.2. Managing the technological gap: resources, needs and time

An assumption was critical to BIP’s model: that the national enterprises would invest the necessary amounts to absorb the imported technology and develop their own technology. The amount of investment required was considerable, considering that the firms had no previous electronics experience. Such investment involved high risks too – technical, economic and financial – as well as a long time horizon.

BIP’s strategists clearly underestimated the speed and intensity of technological change in the electronics industry and, consequently, the threshold of resources necessary for catching up with the international technological frontier and remaining there, while, at the same time, absorbing the imported technology in other product ranges. 

The threshold was further raised and the nature of necessary technical resources revolutionized by the emergence of the microcomputer and the changes in microelectronics. At the begining of BIP, its policy-makers correctly identified the minicomputer as a window of opportunity and emphasized product-design skills. However, the coming of the microprocessor and of the microcomputer with open architecture transformed the fastest-growing product of the industry into a commodity, placing the emphasis on production and marketing skills. Moreover, such skills changed too. Production moved from batch-assembly to automated mass-production and the main users changed – from large and medium enterprises where purchases were made putting a premium on technical characteristics of the product, to small enterprises and households, where price and user-friendliness were the main considerations.

In other words, the international frontier had not only moved forward but it had also changed its shape and the gap had changed accordingly. However, BIP reacted slowly to this momentous transformation, retaining the emphasis on product-design and not paying enough attention to production techniques and economics and even less to marketing. This was one of the important causes of BIP’s downfall and, below, we return to some possible reasons for this slowness of reaction.

The fact that electronics is a fan-shaped industrial complex, composed by several industries catering for different markets (e.g. data-processing, telecomms, entertainement) but made interdependent by a common technological basis, provided by microelectronic componentes and software, raised the threshold above mentioned as well as the gap between resources and needs. 

SEI explicitly embedded the concept of the industrial complex into BIP but failed to gain control of the technology and industrial strategy of two industries which are critical for the electronics complex – telecomms and durable consumer goods. As a consequence, economies of scope across industries and economies of scale for components and software were reduced. As previously discussed, the insufficiency of BIP’s instruments (mainly import controls) contributed to stymie the development of software and components. As a result of this negative sinergy within the electronics complex, the industries under BIP’s aegis had their costs and risks augmented, especially when compared to other national industries, raising therefore the threshold of resources and the risk-propensity required for closing the gap.

There was very limited evidence of this Schumpeterian behaviour in Brazilian industry, where import substitution had established reliance on imported technology as a norm. The main exceptions to this norm came from State enterprises (e.g. in the oil, telecomms and aeronautics sectors), where there was a politically-driven motivation to technological autonomy and, more recently, from export-oriented private firms. It was no accident that COBRA, the State enterprise, was a leader in technology investments in the computer industry, but it was an outstanding achievement of BIP that the private informatics enterprises at the mid-eighties were investing between 8 and 10% of their sales on technological activities, in a country where, on average, manufacturing industries spent less than 1% of their sales on such activities. It is also noteworthy the fact that national informatics firms allotted about a fourth of their graduate employees to R&D activities, in contrast with their multinational competitiors, which allocated less than 6% of their graduate employees to such activities (Hewitt 1992). 

In order to understand the actual behaviour of the privately-owned electronics enterprises it is worth examining in some more detail the effects of BIP and other policies upon their investment rationale.

The undevelopment of the Brazilian science and technology system meant that local firms had to internalize costs and run risks that, elsewhere, were not privately borne, raising the threshold and risk levels of investment. The timing and intensity of policy instruments was critical. During the first half of the eighties, when the scope of BIP was broadened by SEI, public funding of science and technology declined sharply, cutting short the process of structuring the S&T electronics system started during the seventies. Although this was partially reversed by the Ministry of Science and Technology during its short life-span, when electronics was a priority area, it was not possible to create a critical mass of human and institutional resources. In fact, even top priority projects, such as CTI, were not properly funded. This lack of resources reflected not only budgetary constraints but also the lack of commitment to the policy from the economic ministries1.

The dearth of externalities was not restricted to the top end of technical skills. Although subsidiaries of multinational firms had been operating in the country for decades, staffed mainly with local personnel, the skills they developed was concentrated on marketing of mainframes, by and large inapproriate to the problems faced by local enterprises striving to desing, produce and market different types of products. 

The same limitation applied to the network of suppliers of parts and components, which was very rudimentary, since the subsidiaries were supplied mainly by imports. As already mentioned, the durable consumer goods industry, which in other countries provided a strong market for locally produced parts and components, was supplied mainly by imports thoroughout the duration of BIP. As a consequence, although imports allowances of CAPRE and SEI privileged parts and components, local firms were obliged to verticalize production, spreading their investments and incresing their costs. A side-effect was to increase the profitability of smuggling parts and components, enhanced by the lack of effective repression. In fact, the main deterrent to smuggling was the moral suasion of the informatics community, which, as previously mentioned, tended to decline over time. 

The same propensity to import, smuggling if necessary, apllied to software, where import controls were, at the same time, cumbersome and ineffective and incentives to local production were scarce. For both microcomponents and software the international standardization of products under way during the eighties led to an increasing pressure to import – legally or otherwise. As a consequence, the attractiveness of local investment in such activities, the core of the electronics complex was reduced.

In other words, differently from other countries, the development of the Brazilian electronics complex was plagued by a vicious circle of a cumulative nature, in which the industries which made up the shafts of the fan (e.g. computers, industrial automation) did not benefit from the economies of scale and scope arising from the hub of the fan (components and software). Such negative sinergy was internalized by the enterprises which, following the industrial complex approach, entered several industries of the complex and which were obliged to follow different and contradictory strategies in their product-divisions or subsidiaries.

To such external factors it should be added the fact that the local enterprises entering the electronics area had no previous experience of the field, suffering thus all the pains and errors of learning. Although most of them had technology licensing agreements, the knowledge imparted by the licensors was limited, restricted mainly to the provision of product designs and specs. In most cases, investing, manufacturing and selling was an on-the-job learning process with all its inherent mistakes. 

To counter the combined effect of such internal and external factors BIP had practically only one instrument – the control of imports. Fiscal incentives were almost negligible and the funding from public development banks was very limited, especially during the start-up phase of the industry, when it was most necessary. Moreover such funding was provided under the form of loans and not as risk capital. The undercapitalization of COBRA, where the technology ethos was strongest, was often remarked but never corrected by its owners, the State banks. State purchasing power, always present in BIP’s documents, as a main instrument for fostering the industry, was used haphazardly and discontinuously, depending on whims and political orientation of the managers of State agencies. Such weakness in terms of instruments and time-horizon was not accidental – it reflected the opposition BIP suffered within the State, which, in turn, reflected the conflicts it evoked in the Brazilian society

The paucity of instruments used by BIP stands in stark contrast with the wide array of policy instruments used in other countries, which ranged from State intensive and extensive funding of R&D and production to State procurement and support in the internal market and abroad. In such countries, the development of the electronics complex was stimulated by measures which, at the same time, reduced risks and costs. Moreover, in other countries the policies for the segments of the electronics complex were convergent and had a long, normally indeterminate, time horizon, reflecting a wider and more permanent social support2

It is true that the control of imports sheltered the local companies from price and perfomance competition and allowed them to reap considerable margins on the products they sold. If, on the one hand such margins could be justified on the grounds that, in the absence of alternative sources of funding, they were necessary to allow the firms to make their “primitive accumulation” to develop local technological and industrial capability, on the other hand, they attracted rent-seekers, aiming at making the highest possible short-term profits with very limited commitment to the development of local resources. The possibility of smuggling and the limited capability of SEI to control the implementation of the projects it approved (again because of “budgetary constraints”) facilitated the latter behaviour. 

In this context, the imposition of a time-limit to SEI’s power to control imports by the Informatics Law of 1984 probably played a contradictory role: it stimulated both learning and predatory behaviours. However, since the time period was established arbitrarily, as a political compromise between the supporters and opposers of the policy in Congress, bearing no relationship to learning curves, its net effect was probably tilted to making the best of the policy while it lasted.

The behaviour of entrepreneurs is obviously dependent on the development of the market they serve. BIP was predicated upon the assumption that the Brazilian market would provide a basis wide enough to develop the industry. The increasing role played by static scale economies in the more standardized industries was clearly underestimated by policy-makers. As suggested above, this may be partly explained by the technological emphasis on product design. However, political economy factors may have acted too, albeit sometimes unconsciously: if scale economies were a prime criterion for guiding SEI’s decisions to allow the local manufacture of a product, the agency would be led to restrict the number of local suppliers. As a consequence, it would have to meet an inner-circle hostility, from the frustrated newcomers, and more strident accusations from opposers of the policy that it was nurturing an exclusive set of enterprises. As it was, SEI could truthfully contend that it was fostering competition in the industry. 

In fact, a trait that distinguishes BIP from other countries’ informatics policies is the absence of “national champions”. From the outset of the policy, at the time of CAPRE’s market reserve decision, policy-makers were unwilling to commit resources to one or a few enterprises, which explains the fate of COBRA, an obvious candidate to be a national champion. As a consequence, the policy tended to follow a “product design” approach insted of focusing on enterprises and their economics. Such bias was reflected in the staffing of SEI, where there were very few economists and in the procedures of analysis, which priorized technical aspects.

Finally, it is also probable that the estrangement between SEI and the academic community, brought about by the “national security” origin of the former and the ruthless way in which it replaced CAPRE (where the relationship between bureaucracy and academia was very close) contributed to reducing SEI’s capability to properly assess the technical changes under way at the international level3.

Moreover, because of the levels of investment which were required and of the structure of funding of such investment, based mainly on retained earnings and very expensive short-term credit, the internal market had to grow fast – the enterprises being in the position of the cyclist which must keep pedalling in order to stand upright. Indeed, until 1987 the Brazilian market grew at spetacular rates, impervious to the crisis which affected the rest of the economy during the eighties. According to data from SEI, between 1980 and 1986 the earnings of national informatics firms grew 7.4 times – circa 40% yearly average. In 1987 the growth was 14% – a healthy rate for any industry. Nonetheless, as an indication of the financial fragility of the industry, such decline in growth provoked a serious crisis.

An export oriented strategy, eventually developed along selective lines, could have provided some solutions. However, pressures to export were applied only on the foreign subsidiaries, which complied in exchange for grater import flexibility. Although local firms did achieve some export successes in specific market niches (e.g. services automation) the strategy was very inward-looking. Only at the end, in the late eighties, BIP begun to consider exports as a priority, but without any policy instrument to back it up. 

The inwardness of the policy was the result of several, convergent factors. First, the very success of internal sales reduced the incentives to export. Second, the policy itself, by emphasizing local design of products and software reduced their tradability and contained no incentives to export. The scant attention paid to production technology and economics, especially to scale economies, as mentioned above, had important negative consequences for the international competitiveness of the products covered by BIP, especially after the microcomputer revolution made standardization and scale economies prime requisites to international trade. Finally, BIP was deprived of the export basis of other developing countries, especially of Southeast Asia: the durable consumer goods industry. While in the other countries such industry provided the experience of mass-production and international trading for exporting other electronic products, in Brazil the durable consumer goods industry produced limited quantities oriented to the internal market too and used mainly imported components. In this aspect too the sinergy of the Brazilian electronics complex was largely negative.

1987 was a watershed for BIP . In that year coincided a market slackening with the withdrawal of Government support, as shown above. The two events were closely connected. The diminished demand growth of 1987 was largely a result of the failure of the stabilization attempt of the year before (the Cruzado Plan), which led the Brazilian Government to declare a moratorium on external debt payments and to the weakening of the groups which were the strongest supporters of the policy within the Governement coalition. The stepping up of US pressures against BIP, with threats of export retaliations, could not have come at a worst time for BIP. Although BNDES stepped in, providing relief credit for some of the largest firms in dire straits, the support of BIP in the economic ministries and the Foreign Affairs Ministry – never enthusiastic – was then substantially reduced, as discussed above. The combination of macroeconomic foreign exchange restrictions with the low priority attached to the success of BIP led to the already mentioned greater import restrictions of parts and components, stimulating smuggling and undermining the competitiveness of enterprises which adhered to the policy. At the end of the day, macroeconomic interests reimposed their hegemony over sectoral rationale.

As the policy weakened under internal and external pressures, another cumulative process set in: reading a writing on the wall many firms reduced their commitment to BIP’s objectives and rules and started to negotiate partnerships with foreign companies (using as their main asset their hold on the Brazilian market), increased (legally and illegally) imported content, contained investments in R&D, etc. Such actions undermined BIP further and thus stimulated other firms to follow a similar course, straining the relationships between such enterprises and those which still adhered to the policy. As a result, when the tide of liberalization mounted in 1990 BIP was bereft of support even within the informatics entrepreneurial community, with the exception of a few stalwarts which still upheld the banner of technological autonomy. The latter presently have adapted to the new norm or are exploring small market niches.

The speed by which a substantial part of the informatics entrepreneurial community changed gears, throwing their lot with a reversal of BIP, may be viewed as a sign of entrepreneurial capability for interpreting market signals and adapting strategies accordingly. Another interpretation is that many of the entrepreneurs were never really committed to BIP’s objectives, having supported them as an ideological shield under which they were able to gain rents, which were good as they lasted. 

There is probably some truth in both interpretations. Undoubtedly there was a strong component of rent-seeking in the support given by entrepreneurs to the policy. Many paid only lip-service to BIP’s technological objectives, using them as beachead to enter the market. However, it must be recognized that the limited array of instruments BIP was able to muster and its fixed time-horizon were factors, internal to the policy, which stimulated such behaviour or, at least, led the entrepreneurs to keep in mind a policy reversal as a possible alternative. An exclusive commitment to BIP required a Faustian drive to local technological independence for which Brazilian entrepreneurs were never noted. Indeed, one of BIP’s achievements was to reveal that, even under unfavourable conditions, there were entrepreneurs capable of such commitment.

A policy of management of the technological gap using import controls is based not only on assumptions about the behaviour of entrepreneurs: it relies also on assumptions, explicit or implicit about consumers’s reactions. At the very least it must assume that the latter will bear, with grace or by force, the costs of the policy: the restriction of the range of products offered and the higher price/performance ratio of the goods actually supplied.

For the reasons above outlined, consumers, inequivocally and literally, footed the policy’s bill. Opposers of BIP inevitably pointed out consumers’ satisfaction as a main reason to scrape it and, therefore, it is worth considering the argument in more detail. Schmitz and Hewitt (1992) point out that “the diffusion of computers made by national firms has been rapid by any standards. The average annual growth rate of the Brazilian microcomputer market between 1984 and 1987 was the highest in the capitalist worls at 74 per cent” (p.31), showing that the policy, at the very least did not prevent diffusion. The same authors provide a good survey of the evidence on price differentials between Brazil and other markets at the end of the eighties, when the attack on the policy was at its peak: they show that the former were double the US prices and not higher than a fourth of the European prices. Over the eighties, according to the same source, the technological lag in terms of product-vintage between Brazilian and international supply had been reduced too, although it was still significant – at least two years. 

No matter how satisfactory such diffusion and learning performances were from a long-term industrial policy point of view, there was a shift from an attitude of cooperation and tolerance with BIP’s products to hostility and civil resistance, as expressed by the smuggling of finished goods or by purchases of products assembled with aknowledgedly smuggled in parts and components. Curiously, consumer disaffection increased with the shift from mini to microcomputers, although the purchasers of the former were probably better informed than the latter about price-performance characteristics of the international frontier. This is probably attributable to the greater commitment of the technical profession to the policy.

It is also important to notice that there was no noticeable difference in the performance of national firms and subsidiaries of multinational companies. Moreover, similar differentials of price and product vintages were observable in the segments of the electronics complex where BIP was not applicable, such as the consumer goods assembled in the Amazons Free Trade Zone, as well as in other industries structured by traditional import-substitution policies and dominated by multinational firms, such as the automobile and pharmaceuticals industries. Finally, a detailed study of the cost structure of informatics products showed that sourcing was a major cause of the Brazilian higher costs and that import-liberalization would not necessarily bring about a reduction of such costs (ibid.). 

In other words, although electronics did cost more in Brazil, it was not significantly different in this respect from the rest of the industry established in the country and its higher costs could not be ascribed to the specificities of BIP. Nonetheless, this was what precisely happened. The press played a major role in this process by carefully reporting all the inefficiencies of the industry and by, equally carefully, abstaining to report its achievements or to compare its performance to other industries and policies. To give an example, it is widely recognized that the automation of the Brazilian banking system is highly sucessful (Cassiolato 1992). Although millions use it, such success was never related to BIP .

In this way, consumer dissatisfaction, especially of householders, was nurtured, increasing the opposition to the policy. Such opposition, spreading by way of mouth, was probably crucial for the overthrow of the policy. The standards may have been double but they were inequivocally sucessful in depriving the policy of social support. After all, a well-known apothegm of Brazilian politics is that “facts do not count but versions of them”.

The same may be said about State intervention. In order to pay the external debt the other Brazilian industries were subject to import controls similar to those imposed on electronics, managed by another Government agency (CACEX) and it was never explained to the public that the import quota of SEI was not decided by it but by the Treasury. Other industries of the electronics complex, not subject to BIP, depended even more strongly than BIP’s on Government incentives, such as the fiscal exemptions of the Amazons Free Trade Zone or the procurement of telecomms equipment, which was coupled to transfers of technology from the State sectoral research centre. To other industries, dominated by multinational companies, such as the electric power equipment the role played by State intervention was not less important.

We have argued above that BIP’s strategists underestimated the problems facing the policy. Such problems would have been reduced by greater selectivity. For instance, by distinguishing between families of products that would have to be imported for the perceivable future, products that could be manufactured locally but with imported technology and, finally, products to which the policy of technology import-substitution could be applied4.

As shown above, BIP started selectively, by concentrating on small and medium computers but soon, driven by the logic of the industrial complex, the scope of the policy was broadened. However, since the policy did not gain the control of the complex, the losses were doubled: sinergy was negative and the available resources were spread too thinly. By the end of the eighties the need for greater selectivity was getting wider recognition – it was a recurrent theme during the preparation of the Second PLANIN. But it was not unanimous: there were those which considered introducing greater selectivity as caving it to the pressures of the US Government and internal opposers of BIP5. In fact, one of the results of the pressure under which BIP, in general, and SEI, in particular, were placed during the late eighties was to rigidify the stand of part of the policy supporters, preventing them from making major strategic changes. 

Probably, it was too late, anyway. As discussed in more detail en the following section, more was at stake with BIP than supply and consumption of electronic products and delenda BIP had become a symbol of modernity. Under the prevailing circumstances, no greater selectivity could have saved it.

2.3. Values, interests and social support 

A crucial aspect of BIP was its value content. The history of the policy may be seen as the apogee of a weltanschauung and its decline. BIP’s paradigmatic force, as a model applicable to other industries did not escape anyone – supporters and opposers alike, inside the country and abroad. Such attention was obviously reinforced by the strategic role played by electronics in the modern world. 

BIP strategists assumed that the notions of national autonomy and local creativity would be strong enough to warrant it social support, giving the industry enough time to proceed along learning curves and reach close to an international technical and economic efficiency frontier. Such support involved the legitimacy of the policy instruments – State intervention discriminating against imports and in favour of nationally owned enterprises and of local technological efforts and the social actors (scientists, engineers, etc) responsible for such activities. 

Although a considerable part of the debate surrounding the policy was conducted using “objective” arguments such as the performance and price of the products of BIP, the objectiveness was more apparent than real, since what was at stake in the economic and technical efficiency debate was an income distribution question – how costs and benefits of the policy would be distributed along different social groups over an imprecise time duration – a question which cannot be answered without resort to value judgements. Moreover, underneath such arguments laid unquantifiable values about creativity and power – of local versus foreign agents, of producers versus consumers and of the State versus the market. The fierceness of the debate, which often turned vicious, and the polarization of opinions is indicative of the indivisibility of such values, which rendered impossible a meaningful compromise. 

As shown above, the balance of forces shifted along time and it is worthwhile to try to identify the factors conditioning such movement. Let us begin with the contextual factors, since BIP was a sectoral expression of a pattern of development. As mentioned, at the inception of BIP a similar pattern was apllied to other sectors too. Expansive macroeconomic conditions, a strong State which led the economy and had an assertive international positioning, confidence about the future, supported the assumptions of BIP.

Although the macroeconomic conditions worsened considerably during the first years of the eighties, by 1984 an export-led recovery was under way, lending credence to the view that the crisis had been overcome and that the Brazilian economy was bound to return to its “natural” high-growth course. Optimism was greatly reinforced by the iminent end of the military regime. The approval of the Informatics Bill by Congress fits into this context.

In turn, the debate about the Bill contributed to make informatics a national issue and a symbol of State intervention, focusing the opposition to the latter on BIP. If at its inception the informatics policy was a kind of guerrilla warfare, as aptly described in the literature (Adler, 1986; Dantas, 1988), its institutionalization by Congress turned the conflict into a war of position, with the occupants of the trenches well defined in ideological terms. 

The debacle of the 1986 Cruzado stabilization plan put an end to optimism and the next year ushered in a period in which the Brazilian unatended structural problems claimed their price as an economic crisis still under way. The credibility of the Executive, wich was already weakened by successive and unsuccessful attempts to reduce public deficits, resulting only in a deterioration of the State apparatuses, was finally swept away as the economy bordered hyperinflation. This could not but affect the legitimacy of a policy, such as BIP, which hinged on State intervention. 

Nonetheless, the legitimacy of the values underlying BIP was still strong enough to lead Congress to enshrine in the 1988 Constitution a definition of “national enterprise” closely patterned upon BIP, a characterization of the Brazilian market as a “national asset” and to reserve to the State strategic sectors such as oil and telecomms. However, the same Congress established, against the strenuous efforts of BIP supporters, the maintenance of the privileges of the Amazon Free Trade Zone. In fact, the process of writing up the Constitution led to the consolidation of the conservative forces within Congress and the articles which supported BIP were a compromise with the waning nationalist faction. To all practical purposes, they were the latter’s swan song.

The disenchantment of public opinion with State intervention due to internal reasons was further enhanced by the international tidal wave of neoliberalism which swept the world during the eighties. The media, which had been strenuosly campaigning against State intervention since the late seventies rode high on the wave and singled out BIP as a prime target, inclusive for the conflicts with the U.S.

Much has been made of the US pressure against BIP as a cause of its demise, but its role and strength can be gauged only against the background above described, in which loomed the huge Brazilian external debt. As shown by the case of the nuclear policy during the second half of the seventies, different economic and political conditions made even stronger pressures sustainable by Brazilian Governments. Nonetheless, under the conditions prevailing at the end of the eighties, the US pressure played an important role in the reduction of the Government support to BIP, previously examined.

In short, during the second half of the eighties the macroeconomic and political conditions became highly unfavourable to BIP’s values. The latter were further undermined by the policy’s specific problems of managing the technological gap, previously commented. The behaviour of entrepreneurs and consumers shows that the mores of the Brazilian society were mismatched with BIP’s in at least three critical aspects. First, on the valuation of independence, technological and otherwise. Public opinion, as expressed by consumers, wanted Miami, not the Silicon Valley. Entrepreneurs were quite willing to parlay autonomy of decisions for a safer existence. Second, the time-horizon: although industries take as long as human beings to reach maturity, as shown by other international experiences (e.g. the Japanese car industry), in Brazil there was little patience with BIP. Third, a cavalier approach to the law, as witnessed by smuggling and other corner-cutting procedures. The latter points to a deeper problem, which lies at the heart of BIP – the lack of legitimacy of the State. 

As shown, throughout BIP’s life-span its supportive coalition remained essentially the same: academics, technicians and bureaucrats – social actors who had professions which led them to place high value on independence, especially technological independence. To such coalition were later added the entrepreneurs of the sector, with the misgivings already mentioned. Such alliance, which had to fight against a growing number of oppositors as BIP encroached on a broadening range of interests, could never convince public opinion that it was fighting for the common good. The media said and people believed that it was only a particularist policy – “for some colonels and a few inefficient entrepreneurs”6. It was not hard to believe, given the record of particularist policies of the Brazilian State, strongly reinforced during two decades of military regime. In fact, BIP was often branded as an exclusive product of the military, in spite of being one of the very few sectoral policies submitted to Congress. 

The fact that policies alternative to BIP served other particular interests was conveniently disregarded by its opposers. However, the important point is that BIP failed to capture the hearts and minds of the majority of those involved. Therefore, as a result of the general conditions and of its specific problems, at the end BIP was hollowed of most social support. Accordingly, it ended with a whimper, not with a bang. 

3. What is left

The metaphor of the half-full glass, which is also half-empty depending on who looks at it is well applicable to BIP as an industrial and technological policy. It produced a sizable industry with considerable technical capabilities, although far short of its ambitions. Its products, in terms of price, performance and updateness, are similar to those of industries spawned by the traditional import substitution model. It provided jobs which involved the use and development of technical skills wich other industries in the country did not foster but which they now can use. Moreover, it showed that under appropriate circumstances there are some Schumpeterian entrepreneurs in Brazil. 

However, as an ideological construct – as the proof that a more independent pattern of development was both desirable and feasible – in pragmatic terms BIP failed. At the end it had very little social support, no matter if justifiedly or not. As pointed out above, several lessons about the objectives and mores of the Brazilian society can be drawn from such experience, as well as about the relative weight of interests and how they operate, within and outside the State. As for the latter, it is a reminder of its limits and of the penalties attached to hubris.

At the same time, looking again at the glass, BIP was an example of audacity, hope, hard work and honesty – qualities that are not amiss in a society such as the Brazilian. Moreover, since the values which inspired it are not dead, they may find a different form of expression, eventually as a new policy. Opposers of the policy may read this as a threat and think of Dracula but its supporters may find relief and hope in the image of the Phoenix.

(*) Professor of the Faculdade de Economia e Administração of the Universidade Federal do Rio de Janeiro and Director of the Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social. This paper was prepared for the project on The Politics of Technology Policy Institutions in Latin America organized by the United Nations University Institute for New Technologies (UNU/INTECH) under the coordination of Dr. Maria-Inês Bastos. I thank Arthur Pereira Nunes, Ivan da Costa Marques and José Guaranys for the time they spent discussing and recollecting facts and ideas about the policy. The final version of the paper benefited from the careful reading by Wilson Suzigan of its first version, as well as from the comments of the participants of the seminar on The Politics of Science and Technology Institutions in Latin America, held at INTECH in April 1993. The usual disclaimer that the article represents strictly personal views obviously applies, but, since the policy was ladden with values, as argued in more detail in the text, it is convenient, from the begining, to “declare an interest”: in my double capacity, as a bureaucrat and academic, I was an active supporter of BIP. Since “objectivity” is not to be confused with “neutrality” I hope I have provided a balanced account of the policy but corrections are all the more welcome.

 

  • F.Erber, Professor of the Faculdade de Economia e Administração of the Universidade Federal do Rio de Janeiro and Director of the Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social. This paper was prepared for the project on The Politics of Technology Policy Institutions in Latin America organized by the United Nations University Institute for New Technologies (UNU/INTECH) under the coordination of Dr. Maria-Inês Bastos. I thank Arthur Pereira Nunes, Ivan da Costa Marques and José Guaranys for the time they spent discussing and recollecting facts and ideas about the policy. The  final version of the paper benefited from the careful reading by Wilson Suzigan of its first version, as well as from the comments of the participants of the seminar on The Politics of Science and Technology Institutions in Latin America, held at INTECH in April 1993. The usual disclaimer that the article represents strictly personal views obviously applies, but, since the policy was ladden with values, as argued in more detail in the text, it is convenient, from the begining, to “declare an interest”: in my double capacity, as a bureaucrat and academic, I was an active supporter of BIP. Since “objectivity” is not to be confused with “neutrality” I hope I have provided a balanced account of the policy but corrections are all the more welcome.

Referências Bibliográficas

Adler, E. (1986) Ideological guerillas and the quest for technological autonomy : development of a domestic computer industry in Brazil, International Organization, Vol. 40, n.3

Bastos, M. I. (1992) State policies and private interests : the struggle over information technology policy in Brazil, in H. Schmitz and J. Cassiolato (ed.) , Hi-tech for industrial development : lessons from the Brazilian experience in electronics and automation, Routledge, London

Cassiolato, J. (1992) The user-producer connection in hi-tech : a case-study of banking automation in Brazil, in H. Schmitz and J. Cassiolato, op cit

Dantas, V. (1988) Guerrilha tecnológica: a verdadeira história da política nacional de informática, Livros Técnicos e Científicos Editora Ltda

Erber. F. (1989) Política industrial nacional e política de informática nacional, Instituto de Economia, UNICAMP, mimeo

Evans, P. (1992) A informática no Brasil, India e Coréia na década de oitenta: uma análise comparativa da política e da organização industrial, in P. Evans, C. Frischtak and P. Tigre (ed.) Informática Brasileira em Transição: Política Governamental e Tendências Internacionais nos Anos 80, UFRJ/IEI, Rio de Janeiro

Gaio, F. (1992) Software strategies for developing countries : lessons from the international and Brazilian experience, in H. Schmitz and J. Cassiolato, op. cit.

Hewitt, T. (1992) Employment and skills in the Brazilian electronics industry, in H. Scmitz and J. Cassiolato, op. cit.

Jowett, P. and Rothwell, M. (1986) The Economic of Information Technology, The Macmillan Press Ltd., London

Piragibe, C. (1985) Indústria de informática: desenvolvimento brasileiro e mundial, Editora Campus, Rio de Janeiro

Schmitz, H. and Hewitt, T. (1992) An assessment of the market reserve for the Brazilian computer industry, in H. Schmitz and J. Cassiolato, op. cit.

A Problemática do Emprego no Mundo e no Brasil: uma Estratégia de Geração de Empregos

Fabio S. Erber, 2001

Este texto, de natureza introdutória, visa situar a análise do caso do RN no contexto mundial e nacional. Apresenta-se, inicialmente, uma visão panorâmica da crise de emprego no mundo, apontando a incidência do desemprego aberto e oculto, o aumento da precariedade no mundo do trabalho e seus efeitos sobre a renda. A parte final da Seção apresenta, de forma sumária, os fatores subjacentes à essa situação, situando o caso brasileiro no contexto da evolução mundial durante os anos noventa. Discute a visão internacional sobre como minorar os problemas de emprego, apontando os consensos e diferenças que existem nas avaliações, concluindo que não existe um receituário pronto e acabado para este fim, cabendo a cada sociedade, à luz de suas especificidades econômicas e sociais, definir a própria estratégia de emprego. Finalmente discute o caso brasileiro, apresentando, inicialmente e de forma sucinta, a problemática do desemprego (aberto e oculto) e da precariedade do emprego no país durante os anos noventa. A seguir, discutem-se os principais determinantes desta situação e conclui-se com a apresentação de uma estratégia para geração de empregos para o futuro. (1. Introdução)

2. A crise do emprego no mundo: o desemprego aberto,  a precariedade do emprego e a pobreza

As condições de emprego no mundo constituem um problema nada menos que dramático. Segundo o último relatório da Organização Internacional do Trabalho (OIT, 2001), ao fim do ano 2000, entrando num novo milênio, o desemprego aberto atingia 6% da população economicamente ativa – cerca de 160 milhões de pessoas, quase o equivalente à população total do Brasil. Estima a OIT que 500 milhões de novos empregos terão que ser criados ao longo da próxima década somente para absorver os novos entrantes no mercado de trabalho e reduzir o desemprego.

O desemprego aberto incide de forma distinta, mesmo em áreas geográficas relativamente homogêneas, como a que é constituída pelos paises da OCDE1, conforme ilustra a Tabela 1, abaixo. Uma das poucas regiões a apresentar uma evolução favorável nos últimos anos da década, no futuro próximo a OCDE deve sofrer um aumento do desemprego em função da redução esperada do crescimento dos Estados Unidos e União Européia e da continuidade da crise japonesa.

TABELA 1

TAXAS DE DESEMPREGO NOS PRINCIPAIS PAÍSES DA OCDE NOS ANOS NOVENTA – EM % DA PEA

Fonte: IPEA

Na América Latina e no Caribe, estudo recente da CEPAL2 mostra que o total de desempregados passou de 7,6 milhões de pessoas em 1990 para 18,1 milhões em 1999 e que a taxa desemprego urbano passou de 5,8% em 1990 para 8,5% em 2000. No entanto, a agregação oculta diferenças importantes entre países. Assim, enquanto o desemprego urbano praticamente dobrou ao longo da década na Argentina e na Colômbia3, manteve-se alto e estável no Chile (9,2%) e oscilante e, comparativamente, baixo, no México (2,2% em 2000)4. Embora o caso brasileiro seja discutido a seguir, cabe registrar que neste período, segundo a mesma fonte, a taxa de desemprego urbano cresceu de 4,3% para 7,1%.    

Finalmente, como nota a OIT (ibid.), no passado recente o desemprego  continua alto na África, Oriente Médio, Europa Central e Oriental, e tende a agravar-se na China.  

O desemprego aberto é, pois, um problema mundial, mas não esgota a dramaticidade do mercado de trabalho. A OIT (ibid.) estima que, se acrescentarmos aos desempregados os trabalhadores sub-empregados, o número de pessoas afetadas chega a pelo menos um bilhão de pessoas. 

O desemprego e sub-emprego estão fortemente associados à miséria. Segundo a OIT (2001), cerca de um terço da força de trabalho mundial está desempregada ou sub-empregada e ganha menos do que o necessário para manter-se acima das linhas de pobreza.

O estudo da CEPAL antes mencionado quantifica essa percepção intuitiva, mostrando que, na América Latina e Caribe, os 20% mais pobres da população apresentam uma  taxa de desemprego que é mais do que o dobro da taxa de desemprego média da região. Estudos sobre a pobreza no Brasil, como o de Albuquerque e Rocha (1999) também apontam na mesma direção: o desemprego é um dos principais determinantes da pobreza e da desigualdade.

No entanto, estar empregado não garante a saída da miséria. Segundo a OIT (2001), no mundo, 16 entre cada 100 trabalhadores, ganham menos de um dólar americano por dia – incapazes, portanto, de prover o seu sustento básico.

Ao mesmo tempo, notam-se em todo o mundo importantes mudanças nos padrões de emprego, que aumentam a vulnerabilidade dos trabalhadores, restringem suas perspectivas de treinamento e progresso profissional e afetam adversamente suas condições de emprego e rendimento. Estas mudanças, que podem ser sintetizadas pela expressão “precarização do emprego”, consistem na tendência ao uso de trabalhadores em tempo parcial, com contratos de curto prazo ou sem contrato e no aumento dos empregados por conta própria. Tomando por exemplo os países mais avançados, o emprego em tempo parcial cresceu nos países da OCDE ao longo da década de noventa, atendendo 16% do total da força de trabalho em 1999. No mesmo ano, em 12 países da União Européia, o emprego temporário atingia 12% do  total (OIT, 2001). 

Parte destes fenômenos encontra sua raiz nas transformações introduzidas nos processos de produção e gestão através de um conjunto de inovações baseadas nas tecnologias da informação, que afeta profundamente o processo de competição e sobrevivência das empresas, altera as cadeias produtivas (por exemplo, através de processos de terceirização) e a própria estrutura setorial de produção – fortes determinantes do número e qualidade dos empregos ofertados.  Esta revolução tecnológica também cria empregos de alta produtividade e remuneração que têm algumas características semelhantes ao trabalho precário. No entanto, parece significativo que o emprego por conta própria ocupe apenas 7% da força de trabalho dos Estados Unidos e cerca de 25% desta na América Latina (OIT, 2001).

As transformações tecnológicas em curso também alteraram substancialmente os critérios de “empregabilidade” e de educação adequada para o preenchimento de vagas no mercado de trabalho. Assim, as novas tecnologias de produção e gestão enfatizam as habilidades mentais e intelectuais em detrimento das habilidades manuais, aspectos comportamentais voltados para a cooperação, iniciativa e busca de soluções e uma educação que substitui o “aprender a fazer” pelo “aprender a aprender”.  O novo perfil de competências, obviamente, não se estabeleceu de forma homogênea ao longo de todas as atividades econômicas. Em muitas destas persiste o antigo perfil taylorista-fordista, caracterizado pela linearidade, segmentação, padronização e repetição. No entanto, a tendência é de progressiva ampliação do novo paradigma, que traz as marcas da integração e flexibilidade5.  

O novo paradigma de produção e gestão implica em profundas transformações no sistema de educação profissional, valorizando o desenvolvimento de habilidades intelectuais gerais e fundamentais. Ao mesmo tempo, impõe aos trabalhadores mudanças igualmente radicais, enfatizando a necessidade de contínuo re-treinamento. A persistência do desemprego de longo prazo, mesmo nos países da OCDE – 31% do total de desempregados, superando os 50% em alguns países, como a Bélgica, Itália e Portugal (OIT,2001) – atesta a dificuldade de lidar com estes novos desafios.

Nos países em desenvolvimento, esta “nova” precarização vem somar-se à “velha” precarização – o vasto contingente populacional que não encontrava emprego estável e de remuneração digna nos moldes do antigo padrão de desenvolvimento fordista-taylorista, precariedade medida não só pelas altas taxas de sub-emprego e desemprego oculto, como pela baixa escolaridade da força de trabalho, pela extensão do trabalho infantil e pelo alto grau de informalidade nas relações de trabalho – traços altamente visíveis  em qualquer esquina de metrópoles do Terceiro Mundo. Para estes países, para não agravar os problemas de emprego e pobreza, tornou-se necessário realizar transformações em suas estruturas produtiva e institucional tão profundas que merecem o nome de revolucionárias, mesmo que sejam feitas sob o amparo da lei e da ordem.

É importante assinalar que o quadro acima descrito se insere num contexto mundial marcado por forte volatilidade nas taxas de crescimento econômico, especialmente nos países de industrialização recente, como o Brasil, o que  impacta de forma negativa a criação de novos empregos.

O mesmo contexto é também caracterizado pela internacionalização das atividades econômicas, na qual as empresas, crescentemente, atuam no mercado internacional como vendedoras e, em menor escala, como produtoras, processo que é reforçado pelo processo de redução das barreiras nacionais ao comércio e investimento e pela formação de blocos regionais. Neste sentido, a globalização constitui um vetor que  amplifica as transformações nas empresas, cadeias e estrutura produtivas acima descritas e seus efeitos sobre o mercado de trabalho, difundindo-as em escala mundial, embora de forma diferenciada segundo setores econômicos e regiões.  

Finalmente, os anos noventa culminaram um período de grandes transformações institucionais no âmbito das relações entre Estado e sociedade civil entre as quais destacam-se, do ponto de vista deste trabalho, a liberalização do mercado de trabalho 

Como se sabe, o contexto brasileiro foi profundamente afetado por esta evolução mundial através de uma forte abertura comercial, financeira e de investimento, que levou as empresas localizadas no país a realizar um  importante ajuste produtivo, seja ao nível micro seja ao nível das cadeias produtivas. Ao mesmo tempo, foi dado início ao processo institucional de liberalização do mercado de trabalho. Durante a década, as taxas de crescimento da economia apresentaram forte volatilidade e o emprego, discutido em mais detalhe a seguir, pouco cresceu, tornando-se um tópico  da mais alta prioridade no debate econômico e político. Neste sentido, indesejável, o país também alinhou-se ao contexto mundial, acima descrito.

Para concluir, é importante assinalar que a empregabilidade e o rendimento auferido pelos indivíduos em cada sociedade são também definidos por atributos destes indivíduos, além de serem afetados pelos fatores sistêmicos acima mencionados, como a taxa de crescimento da economia, a estrutura produtiva e a estrutura de oferta de serviços educacionais Alguns destes atributos individuais, como a escolaridade e a experiência, são adquiridos através da própria inserção do indivíduo no sistema, que facilita ou não a aquisição dessas características – por exemplo, definindo as condições de entrada no mercado de trabalho e eventuais prêmios pela aquisição de alguns atributos, como a educação. Outros atributos, como o sexo, são inalteráveis, mas também afetam a empregabilidade e o rendimento, segundo características de cada sociedade. 

3. O Debate Internacional sobre as Políticas de Emprego: Problemas Universais, Soluções Locais

Há um consenso na comunidade internacional6 quanto à gravidade dos problemas acima enunciados.  À primeira vista, existem também alguns pontos consensuais quanto às soluções que amenizariam a dramaticidade da problemática acima descrita (todos estão de acordo de que, a despeito das boas intenções, amenizar é o que é factível, mesmo no longo prazo):  

  • O crescimento econômico é indispensável, seja para gerar novos empregos, seja para obter recursos adicionais para educar as novas gerações e reeducar as velhas, investir em infra-estrutura e transformar as instituições (ver abaixo);
  • O crescimento econômico tem que ser acompanhado por mudanças estruturais, que gerem empregos mais produtivos (além de mais empregos);
  • O novo paradigma tecnológico requer pesados investimentos em educação (além dos investimentos em infra-estrutura e serviços, como telecomunicações);
  • As novas condições de produção e gestão e o processo de globalização demandam alterações nas instituições diretamente vinculadas ao mercado de trabalho – desde as instituições encarregadas da educação até os mecanismos de regulação do mercado de trabalho.

No entanto, subsistem profundas diferenças. Em primeiro lugar, quanto ao peso relativo que os fatores acima enunciados têm na solução dos problemas do desemprego. Ou seja, embora todos estejam de acordo que os fatores acima são importantes, há discordâncias quanto à sua hierarquia. A título de exemplo, a OCDE e o Banco Mundial atribuem à desregulação e flexibilização dos mercados de trabalho uma importância muito maior que a que lhes é dada pela OIT e pela UNCTAD.  Tais diferenças têm, por sua vez, implicações em termos de medidas econômicas e institucionais – seja em termos do montante de recursos a serem alocados seja quanto ao sequenciamento das medidas.

Em segundo lugar, existem discordâncias profundas sobre como chegar a esses resultados: veja-se, por exemplo, a diversidade de opiniões sobre as causas do crescimento e estratégias e táticas para lográ-lo; sobre o papel do Estado no processo de crescimento e sobre o papel que políticas deliberadamente dirigidas para a criação de empregos devem ter na configuração geral da política econômica. 

Em parte, estas diferenças prendem-se a esquemas de interpretação da realidade (p.ex. a adoção de teorias econômicas de corte keynesiano, evolucionista ou neo-clássico para explicar o crescimento). Quando tenta-se traduzir as proposições gerais em práticas políticas, pesam muito também as especificidades econômicas e institucionais locais. Para tomar um exemplo institucional, a regulação do mercado de trabalho tem história e intensidade distintas nos vários países, mesmo os que pertencem à mesma região, como bem exemplificam os casos alemão e francês. Mesmo que haja um consenso quanto à necessidade de modificá-la, o processo de transformação é distinto nos dois países. Em termos mais gerais, a configuração política da sociedade, dada pelos valores, instituições e atores presentes e as características da estrutura econômica, ao variarem entre sociedades, afetam fortemente as opções de políticas de  emprego, como demonstra, novamente a título de exemplo, a evolução da legislação sobre o trabalho.

Em outras palavras, não há um “receituário” ou blue-print para a concepção e execução de políticas de emprego universalmente aceito – as sociedades tratam a problemática do emprego segundo suas especificidades econômicas e políticas, fortemente influenciadas pela história.  

Mais especificamente, admitindo que o Estado não pode ficar alheio à problemática do emprego, difundiu-se internacionalmente7 a distinção entre “políticas ativas” e “políticas passivas” de emprego, endossada pelo atual Governo brasileiro (Ministério do Trabalho, 1998). 

De uma forma ampla, as “políticas ativas” visam ampliar o número e a qualidade dos postos de trabalho. Incluem, pois, a política macroeconômica e de desenvolvimento e seus desdobramentos setoriais e regionais. Da mesma forma, incluem as mudanças institucionais que visam adequar a regulação do mercado de trabalho e qualificar a força de trabalho. Neste conceito, as políticas ativas incidem tanto sobre a demanda como sobre a oferta de mão-de-obra e abrangem seja política desenhadas especificamente para gerar empregos como outras políticas que, concebidas com outros fins (por exemplo, objetivos fiscais), acabam por ter forte impacto sobre o número e a qualidade dos empregos.

Por sua vez, as “políticas passivas” são orientadas para a oferta de mão-de-obra, seja tentando restringir o crescimento desta oferta (por exemplo, incentivando a aposentadoria8, retardando a entrada dos jovens no mercado de trabalho), seja amparando a mão-de-obra desempregada através de mecanismos de renda compensatórios (como o seguro-desemprego) e de instituições que visam encurtar o período de desemprego, como as que propiciam treinamento e realizam a intermediação entre os desempregados e potenciais empregadores. 

Como toda taxionomia, esta contém elementos de arbítrio na classificação de políticas. No entanto, apesar de eventuais imprecisões, a sumária descrição dos objetivos e das medidas incluídos em cada categoria de políticas aponta para a mesma conclusão anterior: embora os problemas de desemprego e geração de renda sejam universais, sua configuração e soluções são específicas para cada sociedade.     

4. O Caso Brasileiro: Uma Estratégia para o Emprego

À semelhança do mundo em desenvolvimento, a situação do emprego no Brasil tendeu a piorar durante a década dos noventa. A taxa de desemprego aberto (o percentual de pessoas da população economicamente ativa – PEA, que busca emprego e não encontra, em um dado período de referência) aumentou, segundo todas as medidas disponíveis. Assim, para o IBGE, que toma uma semana como período de referência e exclui da PEA aquelas pessoas desempregadas e que não procuraram emprego naquela semana, a taxa de desemprego aberta em seis das principais regiões metropolitanas do país passou de 4,84% em 1991 a 7,11% em 20009. Por sua vez, em suas pesquisas o DIEESE adota um período de referência maior do que o IBGE: um mês. Nas regiões metropolitanas em que é possível compará-las, as estimativas de desemprego aberto do DIEESE superam as do IBGE. As pesquisas das duas instituições concordam com o aumento da taxa de desemprego aberto durante a década passada, embora o crescimento desta taxa por região metropolitana seja freqüentemente diferente (veja-se a Tabela 2, a seguir).

A forma de medir o desemprego aberto adotada pelas duas instituições oculta o problema das pessoas que desistiram de procurar emprego no período de referência – o desemprego oculto por desalento. Em suas pesquisas, o DIEESE estima que este tipo de desemprego afeta uma porção importante da PEA e tende a crescer durante a década passada.

A Tabela 2, a seguir, compara as estimativas de desemprego aberto do IBGE e do DIEESE nas regiões metropolitanas estudadas pelas duas instituições para os anos de 199210 e 2000 e mostra ainda as estimativas de desemprego oculto por desalento feitas pelo DIEESE naqueles dois anos.

TABELA 2

BRASIL: TAXAS DE DESEMPREGO ABERTO E OCULTO POR DESALENTO EM REGIÕES METROPOLITANAS MEDIDAS PELO IBGE E PELO DIEESE EM 1992 E 2000

Fonte: IPEA (2001)

A problemática do emprego no Brasil combina desemprego (aberto e oculto) com precariedade dos empregos existentes. O DIEESE estima que, em 2000, o número de pessoas que realizaram “atividades remuneradas eventuais e instáveis ou não remuneradas em ajuda a negócios de parentes”, superou os 4% da PEA em todas as regiões metropolitanas que pesquisou, menos o DF11. Esta forma de desemprego oculto tende a aumentar durante os anos noventa.

Outro indicador de precariedade do trabalho brasileiro é dado pela participação dos empregados sem carteira assinada na população ocupada, que, nas regiões metropolitanas estudadas pelo IBGE, passa de 21% em 1991 para 28% em 2000. A esses trabalhadores, que não contam com a proteção dos direitos trabalhistas, podem ser adicionados os que atuam por conta própria, que passam de 20% a 23% da população ocupada no período considerado. Ou seja, mais da metade da população ocupada tem empregos de tipo informal.

Há um relativo consenso sobre os determinantes desta evolução do mercado de trabalho no Brasil, embora o peso destes fatores seja discutível. Conforme já apontado, esta evolução resulta da interação entre fatores de natureza global e características específicas da situação brasileira. 

Entre os primeiros, destacam-se as transformações tecnológicas e organizacionais em curso no mundo, cujas conseqüências em termos de redução de postos de trabalho e de mudança no perfil de competências necessárias para ocupar estes postos já foram discutidas acima.

Durante a década de noventa, este processo de transformação tecnológica encontra no Brasil um ambiente propício à sua difusão mercê do processo de abertura externa da economia – abertura comercial e aos investimentos. A exposição à competição externa, ampliada pela política de câmbio vigente entre 1995 e 1999, obriga as empresas instaladas no país a grande esforço de ajustamento, do qual a adoção de novas técnicas produtivas e organizacionais é um forte componente. 

Apesar dos fortes aumentos de produtividade resultantes deste processo de ajuste e dos inequívocos benefícios trazidos pela estabilização de preços na segunda metade da década dos noventa, a economia brasileira continua constrangida por restrições cambiais e fiscais. Em conseqüência, a taxa de investimento permanece baixa e o crescimento econômico apresenta-se oscilante e incerto, limitando a criação de novos postos de trabalho.

A estes condicionantes macro-econômicos somam-se determinantes sociais e econômicos de natureza estrutural, herdados do padrão de desenvolvimento anterior, entre os quais quatro merecem ser destacados:  o baixo nível de escolaridade da mão de obra brasileira, que dificulta sua adequação aos requisitos das novas tecnologias; a regulação do mercado de trabalho, que, embora proteja os trabalhadores que têm emprego formal, dificulta a ampliação deste emprego e incentiva o uso dos mecanismos informais;  a estrutura industrial do país, onde destacam-se setores intensivos em capital, nos quais novos empreendimentos tendem a utilizar relativamente pouca mão de obra e, finalmente, a estrutura do sistema financeiro, que dificulta a criação e sobrevivência de empresas de pequeno porte, no meio rural e urbano. 

Observando estas especificidades, é possível desenhar uma estratégia para a geração de empregos no Brasil, conforme já apresentado em CNI (1997).

Em primeiro lugar, é indispensável retomar o crescimento econômico de forma sustentada. Ou seja, é necessário contar com um quadro macro-econômico no qual as empresas possam ter um horizonte de planejamento de suas atividades de longo prazo, em que investimentos em atividades produtivas sejam mais atraentes do que investimentos financeiros. Para tanto, uma reforma fiscal abrangente é uma condição necessária. 

No entanto, as tendências tecnológicas acima mencionadas e a herança do padrão de desenvolvimento anterior sugerem que a retomada do crescimento, mesmo que sustentada, não será suficiente para resolver, no médio e longo prazo, a problemática do emprego no Brasil. Obstar a mudança tecnológica em uma economia aberta como a brasileira é impossível, além de indesejável. Assim, uma estratégia de emprego deverá concentrar-se na remoção dos obstáculos estruturais internos.

Neste sentido, é fundamental elevar o nível de qualificação da mão de obra brasileira, aumentando, simultaneamente, sua empregabilidade e sua produtividade – ou seja, contribuindo para o estabelecimento de um círculo virtuoso entre emprego  e crescimento econômico.

Neste contexto, é importante distinguir três públicos-alvo da qualificação, que demandam estratégias distintas de abordagem. Em primeiro lugar, os grupos etários que estão prestes a entrar ou entrando no mercado de trabalho, que vêm encontrando crescentes barreiras a essa entrada (OIT, 1999), ensejando, através da educação de primeiro e segundo grau o desenvolvimento das capacidades demandas pelo novo paradigma tecnológico. Em segundo lugar, encontramos aqueles que, tendo participado do mercado de trabalho, dele foram alijados – em caráter temporário ou permanente – por falta de qualificação, ampliando o alcance do Plano Nacional de Educação Profissional (PLANFOR). O terceiro grupo é constituído pelos trabalhadores que, estando empregados, necessitam novas qualificações. A ação pública, numa estratégia de emprego, deveria priorizar, atendendo às suas peculiaridades, os dois primeiros grupos, atuando de forma suplementar no último, onde os mecanismos empresariais tendem a ser mais eficientes.

Em segundo lugar, é necessário apoiar as atividades empresariais geradoras de emprego. Visto pelo enfoque da dimensão das empresas, uma estratégia de emprego implica no apoio diferenciado às pequenas e microempresas, tradicionalmente absorvedoras de mão de obra. Mecanismos como a combinação de acesso ao crédito em condições compatíveis com o crescimento e assistência técnica são fundamentais para a sobrevivência e expansão desse tipo de empresa. O apoio à micro e pequena empresa é mais eficaz quando é orientado para a formação de agrupamentos (clusters) empresariais, que geram externalidades para os seus membros através de relações inter-pessoais e efeitos de emulação ou quando estas empresas têm um agente organizador, a exemplo de uma empresa compradora de seus produtos e serviços. Assim, mesmo políticas “horizontais” como o apoio à micro e pequena empresa têm uma inescapável dimensão de cadeia produtiva12.

Em economias que já alcançaram o grau de complexidade da brasileira, o antigo enfoque setorial tende a ser substituído pela abordagem por cadeias produtivas ou complexos industriais, em que se destaca a interdependência setorial. Esta perspectiva é especialmente eficaz para a geração de empregos, posto que permite enfocar os efeitos diretos e indiretos de políticas orientadas para os setores que imprimem dinamismo ao conjunto. 

A diferenciação das cadeias produtivas quanto ao seu grau de abertura ao exterior, à rapidez das transformações tecnológicas e às suas demandas por qualificações da mão de obra empregada leva a estratégia de emprego a diferenciar-se também. Cadeias produtivas com alto grau de abertura e com forte dinamismo tecnológico provavelmente demandarão mão de obra mais qualificada do que cadeias que têm baixo grau de abertura e baixo dinamismo tecnológico. Embora os dois tipos de cadeias necessitem para o seu crescimento de mecanismos de política como o financiamento a longo prazo, no primeiro caso, a qualificação de mão obra é um requisito essencial para ganhar espaço na competição internacional, estabelecendo outro círculo virtuoso entre emprego e crescimento. No segundo caso, em que, presumivelmente, o emprego estará mais direcionado para pessoal menos qualificado, torna-se mais fácil adotar políticas de incentivo direto ao número de empregos. 

Finalmente, é consenso nos meios empresariais brasileiros, de que a flexibilização da regulação do mercado de trabalho constitui peça essencial de uma estratégia de emprego para o país. Conforme aponta a CNI “(n)o Brasil, a flexibilização passa pela mudança no sistema de relações de trabalho, que deve deixar de ser estatutário para ser negocial. A adoção da negociação deve ser acompanhada por uma revisão da legislação, na qual seriam flexibilizados vários direitos previstos em lei, garantindo-se apenas direitos básicos para os trabalhadores, deixando as partes negociarem livremente… Para obter a flexibilização desejada, é fundamental caminharmos para uma negociação descentralizada, em nível de empresa” (CNI, 1997, p. 24).

Conforme aponta o mesmo documento “ainda que complexo, este será um tema que a sociedade brasileira terá que debater em profundidade nos próximos anos” (ibid.). As reformas já aprovadas, como a ampliação das possibilidades de adoção de contratos temporários e as reformas em fase de aprovação no Congresso, que tratam da flexibilização negocial, caminham nesta direção.

A superação dos obstáculos macro-econômicos e estruturais ao emprego será de longa duração e, no seu percurso, deixará muitas pessoas desempregadas. Sob pena de agravar as já imensas tensões sociais do país, será pois necessário dar maior amplitude e eficácia à rede de apoio social, que abrange, entre outros mecanismos, o seguro-desemprego.

Apontou-se em seção anterior que parte da empregabilidade das pessoas é explicada por seus atributos individuais, dos quais alguns, como a educação, são adquiridos através da socialização e outros são inatos, como o sexo e a cor. Há consenso que a sociedade deve prover os meios mínimos necessários para que os indivíduos adquiram as competências necessárias à sua empregabilidade, através da educação. No entanto, as especificidades da situação brasileira fizeram com que, recentemente, fosse argüida a necessidade de adotarem-se políticas ativas de estímulo ao emprego de indivíduos cujos atributos inatos os colocam em desvantagem no mercado de trabalho. Ainda em sua fase inicial, o debate sobre o tema de “políticas afirmativas” dirigidas aos grupos mais desfavorecidos deve ampliar-se no futuro próximo, tornando-se parte de uma estratégia de emprego.

O Brasil apresenta, ainda, a especificidade de ser um país de dimensão continental, onde a problemática do emprego apresenta fortes características regionais. A Tabela 2 ilustra essa heterogeneidade sob o ângulo do desemprego, aberto e oculto, mostrando que esse fenômeno é mais forte na região Nordeste do que no resto do país. Da mesma forma, os fatores estruturais acima discutidos apresentam características regionais, que fazem com que sua interação com os determinantes macro-econômicos e os efeitos sobre o emprego decorrentes desta interação também tenham especificidades regionais. Em conseqüência, estratégias brasileiras de fomento ao emprego terão que ser, necessariamente, especificadas ao nível regional e, dentro deste, ao nível local, quando a heterogeneidade dentro da região for substantiva. A título de exemplo, agrupamentos regionais de empresas constituem uma base eficaz para estruturar ações sistêmicas de fomento do crescimento e do emprego, combinando políticas de educação, assistência técnica e financiamento.

Retomando a taxionomia de políticas de emprego antes apresentada, uma estratégia de emprego para o Brasil deverá contemplar políticas ativas, como as voltadas para o crescimento sustentado e para o fomento de tipos de empresas/cadeias produtivas que usam mais intensamente mão de obra, em articulação com políticas passivas como a re-qualificação dos trabalhadores. Esta articulação implica uma visão sistêmica da problemática do emprego. No entanto, a heterogeneidade regional do país impõe a desagregação da estratégia ao nível local, tanto em sua etapa de concepção como nas fases de implementação e acompanhamento. Neste sentido, a flexibilidade é um atributo a ser buscado no âmbito das políticas, tanto quanto no mercado de trabalho.

Referências Bibliográficas

Albuquerque, R. C. e Rocha, S. (1999) Sobre Estratégias de Redução da Pobreza, em J.P.R. Velloso e R.C Albuquerque (org.) – Pobreza, Cidadania e Segurança, José Olympio Editora, Rio de Janeiro

CEPAL – Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (2001) Informe Econômico de 2001, CEPAL, Santiago

CNI – Confederação Nacional da Indústria (1997) Emprego na Indústria : Evolução Recente e uma Agenda de Mudanças, Rio de Janeiro

Fogaça, A. e Salm, C. (1994) Qualificação e Competitividade, em J.P.R. Velloso e R.C Albuquerque (org.) Modernidade e Pobreza, Livraria Nobel S.A., São Paulo

Gusmão, P. (1999) Desemprego, Crescimento Econômico e Inovações Tecnológicas nos Países Avançados: as Abordagens da OIT e OCDE, em DIEESE (org.) – Emprego e Desenvolvimento Tecnológico: Artigos dos Pesquisadores, São Paulo

IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (2001) Mercado de Trabalho – Conjuntura e Análise, Ano 6, n. 16

Matusita, A.P. e Gimenez, D. M. (1999) Capitalismo Avançado no Pós-Guerra e a Experiência Recente das Políticas de Emprego, em DIEESE (org.) – Emprego e Desenvolvimento Tecnológico: Artigos dos Pesquisadores, São Paulo

Ministério do Trabalho (1998) Emprego no Brasil: Diagnóstico e Políticas, mimeo, Brasília

OIT – Organização Internacional do Trabalho (1999) esemprego Juvenil no Brasil: Em Busca de Opções, Brasília

____________________ (2001) World Employment Report 2001, Genebra

Rovere, R,, Erber, F. e Hasenclever, L. (2000) Industrial and Technology Policy and Regional Development, Third Triple Helix International Conference, CD-ROM, Rio de Janeiro.

Weller, J. (1998) Supressão e Geração de Emprego Em Uma Época de Mudanças Estruturais, DIEESE (org.) – Emprego e Desenvolvimento Tecnológico: Brasil e Contexto Internacional, São Paulo

O Padrão de Desenvolvimento Industrial e Tecnológico e o Futuro da Indústria Brasileira

Fabio S. Erber, UFRJ – Revista de Economia Contemporânea – Vol. 5 – Edição Especial

Este ensaio analisa as relações existentes entre as atividades tecnológicas realizadas pela indústria brasileira e o que pode ser chamado o “padrão” de desenvolvimento industrial nacional, tal como este foi se configurando ao longo da última década, e discute alguns desdobramentos futuros destas relações. O artigo divide- se em seis seções. A primeira faz considerações importantes sobre as limitações da análise. Nas quatro seções seguintes discute alguns traços do padrão de desenvolvimento industrial brasileiro e suas implicações para o desenvolvimento de atividades tecnológicas no país: a estrutura de produção e a inserção no comércio internacional (seção 2), o controle do capital das empresas industriais (seção 3), o padrão de investimentos (seção 4) e o foco das políticas públicas (seção 5). Na sexta e última seção apresenta algumas especulações sobre o futuro.

2. A estrutura setorial da produção, importações e exportações    

A literatura sobre desenvolvimento tecnológico da indústria há muito reconhece que os setores industriais se diferenciam em termos do uso que fazem de recursos tecnológicos. Assim, mesmo numa economia reconhecidamente inovadora como a dos Estados Unidos, a produção de alimentos dedica em média 0,5% do seu faturamento líquido a gastos em P&D enquanto a indústria de computadores destina 9,2% das suas vendas ao mesmo fim1. No Brasil, observa- se o mesmo fenômeno: no mesmo ano (1997) a percentagem de firmas paulistas que introduziram inovações de produtos e processos na indústria de computadores chega a 64% enquanto na de alimentos é de apenas 17% (Quadros et al. 1999)

Os setores industriais diferenciam- se também pelo papel que desempenham nos fluxos intersetoriais de tecnologia: as inovações mais radicais são geradas por um grupo restrito de setores, que usa intensamente recursos científicos e técnicos. Estas inovações são transmitidas aos demais setores que as incorporam em novos produtos ou processos. Neste processo de adaptação e difusão de inovações, os fornecedores especializados de bens de capital desempenham um papel fundamental. 

Portanto, a demanda de um sistema industrial por recursos tecnológicos depende, em boa medida, de sua composição setorial. Quanto maiores forem os pesos relativos de setores que atuam próximos da fronteira científica e de setores produtores de bens de capital, maior tende a ser o uso de ativos tecnológicos e mais rápido o progresso técnico. 

Os ativos tecnológicos utilizados por um setor podem estar localizados dentro do país ou fora. Neste último caso, em que importa- se o produto destes ativos, a demanda do país serve a fomentar o desenvolvimento destes ativos externos. Embora a literatura aponte a importância da proximidade e da interação entre os que desenvolvem e os que usam inovações, a padronização de processos e produtos em escala internacional através da globalização de redes empresariais minora os problemas microeconômicos advindos da distância geográfica entre produtores e usuários de inovações. Do ponto de vista do sistema industrial como um todo, a distância tem efeitos maiores, posto que um sistema nacional de inovações gera, cumulativamente, externalidades para o meio circundante.

Os Quadros 1 e 2, a seguir, mostram a evolução da estrutura de produção da indústria brasileira, assim como a evolução das exportações e importações de produtos industriais. Os 49 setores considerados respondem por 89% do valor bruto da produção industrial brasileira de 1995 (Moreira 1999 a)2. Estes setores foram agrupados segundo dois tipos de classificação freqüentemente utilizadas em análises industriais: (i) os fatores mais importantes na competitividade internacional dos setores, distinguindo setores que são baseados em ciência, que atuam como fornecedores especializados, que usam intensamente mão de obra ou recursos naturais e que são caracterizados por fortes economias de escala e (ii) a intensidade tecnológica destes setores (alta, média e baixa), identificada através da participação dos gastos em P&D no seu faturamento (OCDE 1994). Os dados disponíveis cobrem o período 1989/98. Por questões de espaço e tempo a análise a seguir enfoca apenas os anos extremos do período, estando a série completa à disposição dos leitores interessados. Finalmente, cabe notar que o crescimento industrial de 1989 (2,9%) foi relativamente elevado para o fim dos anos oitenta, enquanto 1998 foi um ano de inequívoca crise. Assim, optou- se por comparar 1989 com 1997 – ano de desempenho industrial também favorável (5,5%). A análise inicia pela estrutura de produção, tratando a composição das pautas exportadora e importadora a seguir.

O Quadro 1 mostra que, na estrutura de produção brasileira, entre 1989 e 1997, aumenta substancialmente a participação dos setores baseados em recursos naturais, em detrimento dos setores intensivos em mão de obra e dos fornecedores especializados, ao passo que os setores intensivos em escala ou ciência mantém, aproximadamente, sua participação. 

Conforme apontado acima, do ponto de vista tecnológico os setores baseados em ciência são especialmente relevantes. Este grupo é composto por “material e aparelhos eletrônicos e de comunicações”, ”produtos farmacêuticos” e “outros veículos”. Embora sua participação no total da indústria seja quase constante, sua composição altera- se no decorrer do período: os produtos eletrônicos, que em 1989 respondiam por 56% do grupo, caem para 27% em 1997. Embora de forma menos abrupta, a participação de outros veículos também cai – de 19% para 13% do grupo. Em contrapartida, aumenta a participação de produtos farmacêuticos, que passa de um quarto do total para cerca de 60% deste. Fatores diversos explicam este movimento: a elevação de preços de produtos farmacêuticos e a queda de preços em produtos eletrônicos, a substituição de produção local por importados no caso destes últimos3, e a crise e posterior recuperação da EMBRAER (incluída em “outros veículos”). Quadros et al. (1999) mostram que os setores “outros veículos” e eletrônicos apresentam a maior intensidade de esforços de P&D4 dentro da indústria, ao passo que o setor de produtos químicos e farmacêuticos apresenta intensidade abaixo da média5. Ou seja, além da participação dos setores baseados em ciência manter- se aproximadamente a mesma, num período em que ocorreu uma verdadeira revolução tecnológica baseada na eletrônica, a composição deste grupo aparentemente foi na direção de uma menor intensidade de esforços de P&D.

O mesmo Quadro mostra o declínio da participação do grupo de “fornecedores especializados” (constituído principalmente por produtores de bens de capital mecânicos e elétricos6), provavelmente atribuível ao influxo de importações, que em 1989 representavam 8% do consumo aparente e, dez anos depois, eram equivalentes a quase 40% deste. Embora as importações aportem equipamentos de alta produtividade, a evolução do seu peso no consumo sugere que deve ter ocorrido uma redução nas relações produtores- consumidores, com um enfraquecimento do sistema local de inovações e um deslocamento da demanda por inovações para o exterior. 

Portanto, a evolução da estrutura industrial brasileira aponta para uma relativa perda de importância dos setores mais intensivos em atividades tecnológicas mais complexas. 

O Quadro 1 também mostra o substancial aumento da participação dos setores intensivos em recursos naturais, tornando este grupo dominante na estrutura de produção brasileira. Embora as atividades industriais destes setores sejam relativamente pouco intensivas em pesquisa e desenvolvimento (Quadros et al. 1999), a especificidade dos recursos naturais brasileiros gera uma potencial demanda por projetos de P&D a montante da cadeia produtiva, visando dar uso industrial aos recursos naturais. No passado, esta característica levou a projetos que envolveram recursos científicos e tecnológicos substanciais7 e de grande impacto econômico, como a exploração de petróleo em águas profundas, o cultivo da soja no Cerrado e o uso de eucaliptos de fibra curta para a produção de celulose. Na década de noventa, aparentemente, a geração de inovações sob estímulo das relações usuários- fornecedores de recursos naturais foi menos intensa. Embora os antigos programas tenham sido mantidos (notadamente o de petróleo), a iniciativa do desenvolvimento tecnológico na área agrícola partiu principalmente do Estado e dos produtores rurais, que se beneficiaram também dos aperfeiçoamentos tecnológicos introduzidos pelas indústrias fornecedoras de equipamentos e insumos8. Alguns segmentos, como o de laticínios, passaram por um processo de grande reestruturação empresarial, liderado por empresas multinacionais, que levou a fortes aumentos de produtividade e à difusão de novos produtos, originados nos países mais avançados. O padrão de competição nos setores intensivos em recursos naturais demanda ainda o investimento em técnicas apuradas de logística. Dado o peso destes setores na estrutura industrial brasileira, a sistematização dos estudos das inovações ao longo das cadeias produtivas deveria merecer atenção9.

A evolução da estrutura de produção mostrada no Quadro 1 aponta para a relativa estabilidade do grupo de setores intensivos em escala. Este grupo é um forte demandante de serviços de engenharia de processo para as indústrias de bens intermediários padronizados (siderurgia, petroquímica) e de engenharia de produto e processo para a produção de bens duráveis (automóveis, principalmente). Dada a característica dominante deste tipo de atividade industrial, os investimentos em tecnologia tendem a avolumar- se quando são estabelecidas novas fábricas, que envolvem novos processos e produtos. O processo de renovação da indústria automobilística (veja- se a seguir) provavelmente explica a intensidade de gastos em tecnologia relativamente alta observada nesta indústria por Quadros et al. (1999) e SOBEET (2000).

Finalmente, o Quadro 1 mostra o forte declínio relativo dos setores intensivos em mão de obra. Para reagir à competição das importações, este grupo também demanda serviços de engenharia de processo nos seus segmentos mais padronizados e de engenharia de produto para os produtos cuja estratégia competitiva se dá através da diversificação. 

O Quadro 2 apresenta a distribuição dos setores segundo sua intensidade tecnológica. Embora os setores de baixa intensidade continuem dominantes, seu peso relativo tende a diminuir – em favor porém dos setores de média intensidade, posto que a participação dos setores de alta intensidade mantêm- se praticamente constante. 

Portanto, ressalvadas as limitações dos dados originais e das classificações adotadas, a estrutura produtiva da indústria brasileira parece demandar investimentos em ativos tecnológicos industriais orientados principalmente para a engenharia, conferindo pouca importância relativa aos ativos destinados à pesquisa e ao desenvolvimento.

A observação da estrutura de importações brasileira parece confirmar a conclusão acima. Durante a década de noventa a indústria brasileira passou por um processo de intensa abertura às importações, em que estavam combinadas a valorização da taxa de câmbio, eliminação de controles administrativos, redução de tarifas e a possibilidade de financiar importações em melhores condições do que as vendas internas. Assim, a participação das importações no consumo aparente total passou de 4,5% em 1989 a 19,3% em 1998. Esta penetração das importações foi especialmente significativa nos produtos baseados em ciência e de fornecedores especializados, nos quais chegou a 39% do consumo aparente em 1998, assim como nos produtos de alta tecnologia, onde passou de 9% a 34% do consumo aparente no período 1989/1998.

A abertura às importações eliminou muitas “idiossincrasias” locais que estimulavam a realização de atividades tecnológicas no país. Aumentou a pressão para que os bens produzidos no Brasil tivessem os mesmos atributos (preço, desempenho, durabilidade, confiabilidade, etc.) que os produtos importados, induzindo a adoção de tecnologias de produto e processo importadas e, finalmente, substituiu simplesmente a produção local por bens desenvolvidos e produzidos no exterior. Assim, provavelmente contribuiu para aumentar os gastos em certas atividades tecnológicas como adaptações de produtos e processos e controle de qualidade e, simultaneamente, reduzir as atividades de pesquisa.

Os Quadros 1 e 2 mostram que as importações brasileiras apresentam maior intensidade tecnológica e maior participação de bens intensivos em ciência e de fornecedores especializados do que a produção local, confirmando que a demanda por estes bens tende a ser abastecida do exterior, reduzindo a demanda por atividades tecnológicas no país, especialmente as atividades mais inovadoras, supridas por aqueles grupos de setores. Vista pelo ângulo da intensidade tecnológica, a estrutura de importações move- se na mesma direção observada na estrutura produtiva, com uma redução no peso dos produtos de baixa intensidade sendo compensada pelo aumento da participação dos produtos de média intensidade (Quadro 2). De forma mais desagregada, tal como apresentada no Quadro 1, a evolução da estrutura das importações indica uma perda de peso relativo dos setores intensivos em recursos naturais, onde o Brasil tradicionalmente usufrui de vantagens comparativas, em favor dos setores intensivos em ciência e fornecedores especializados.

Tampouco as exportações brasileiras envolvem grandes esforços de pesquisa e desenvolvimento. No período 1989/1997 os setores cobertos pelos Quadros 1 e 2 aumentaram o coeficiente exportado de 9% do valor da produção para 15% e, conforme mostra o Quadro 2, houve um deslocamento na estrutura de exportações análogo ao da estrutura de produção: embora os produtos de baixa intensidade tecnológica continuem dominantes, perderam posição relativa em favor dos produtos de média intensidade. No entanto, não se altera a participação dos produtos de alta tecnologia, cujas exportações devem bastante aos aviões da EMBRAER (26% do grupo em 1997). Vistas as exportações pelo ângulo da intensidade de fatores (Quadro 1), reitera- se o crescimento da participação de produtos intensivos em recursos naturais, que dividem a liderança das exportações com os setores intensivos em escala. Finalmente, assinale- se, do ponto de vista tecnológico, o relativo aumento da participação de fornecedores especializados, entre os quais se destacam os produtores de motores e peças para veículos (40% do total do grupo em 1997).

Na última seção deste artigo discuto algumas implicações desta estrutura setorial para o desenvolvimento da indústria brasileira. Aqui, registro apenas que tal estrutura requer um esforço de pesquisa e desenvolvimento muito limitado e, em conseqüência, gera uma capacidade endógena de inovação bastante circunscrita. 

3. O controle do capital

O controle do capital constitui outra variável definidora do padrão de desenvolvimento industrial e tecnológico. No caso brasileiro, ao contrário da dimensão produtiva acima examinada, a estrutura de controle de capital das empresas sofreu grandes alterações com a maciça entrada de investimento direto estrangeiro e com a privatização das empresas estatais. 

Moreira (1999b) estima que, entre 1980 e 1995 as firmas com participação estrangeira no capital igual ou superior a 10% aumentaram seu peso na receita operacional líquida da indústria de transformação (ROLIT) de 28 para 43%. Tomando apenas as empresas em que o capital estrangeiro é majoritário, a participação destas na ROLIT passa de 33% em 1995 para 35% dois anos depois (ibid.). Trabalhando com dados de vendas das 500 maiores empresas, Gonçalves (1999) chega à mesma estimativa para a participação das empresas estrangeiras em 1997: 36%. Os dados sobre intenções de investimentos industriais apresentados por Laplane e Sarti (1998) indicam que esta participação tende a crescer, posto que a maior parte dos investimentos será feita por empresas estrangeiras, isoladamente ou em associação com empresas nacionais.

Moreira (1999b) mostra que, em 1997, a participação das empresas sob controle estrangeiro superava 50% da ROLIT setorial em máquinas, aparelhos e materiais elétricos; material eletrônico e de comunicações, instrumentos de precisão e veículos automotores. Nas indústrias química, de máquinas para escritório e informática e maquinaria mecânica a participação destas empresas era também muito significativa, oscilando entre 42 e 48% no mesmo ano (Quadro 3). Assim, os setores mais dinâmicos do ponto de vista de geração e transmissão de inovações estão sob forte influência das empresas de capital externo. 

Por sua vez, com a exceção da Petrobrás, as empresas estatais desapareceram da indústria de transformação. Os efeitos da privatização sobre a indústria vão mais além, posto que as empresas de serviços privatizadas são importantes demandantes de produtos industriais de alta e média tecnologia, originados em setores baseados em ciência (p.ex. equipamentos de telecomunicações) e de fornecedores especializados.

Quais os efeitos desse processo de internacionalização e privatização sobre as atividades tecnológicas realizadas no Brasil? Quadros et al. (1999) argumentam que as firmas que são total ou parcialmente controladas do exterior apresentam maior propensão a introduzir novos produtos e processos e a empregar proporcionalmente mais cientistas e engenheiros dedicados a atividades de P&D do que as firmas nacionais. SOBEET (2000) sugere que a intensidade de gastos em P&D e outras atividades tecnológicas das empresas estrangeiras é maior do que a de firmas nacionais. Moreira (1999b) mostra que os setores acima citados (Quadro 3) respondiam por 68.4% da ROLIT do universo de empresas sob controle estrangeiro. Ou seja, a maior propensão inovadora das empresas estrangeiras é consistente com sua orientação setorial.

Os estudos também são concordes na caracterização da divisão de atividades tecnológicas entre matrizes e filiais brasileiras. Assim, Quadros et al. (1999) explicam que “technologically new products and processes are originated in the industrialized countries, where transnational companies locate their major R&D centers. They transfer such innovations to the South American market by adapting new products and processes to the local market needs or to the technical constraints to supply of materials and components” (p.7). Por sua vez SOBEET (2000) afirma que “as pesquisas sobre novos produtos ou processos são feitas quase que integralmente nos laboratórios ou centros de pesquisa da própria matriz, ou naqueles por ela controlados… No Brasil, as atividades de suporte e apoio tecnológico e de controle de qualidade são as realizadas mais freqüentemente” (p. 15). Adaptações de maior vulto são feitas apenas quando idiossincrasias locais assim o exigem, como é o caso, na indústria automobilística, do uso de motores de baixa potência e a necessidade de adaptar sistemas de suspensão às condições das estradas nacionais.

A lógica empresarial da divisão de trabalho acima descrita é irretocável – a localização das atividades de P&D nos países centrais usufrui de maiores economias de escala e escopo e de externalidades derivadas de sistemas científicos e tecnológicos mais avançados. Esta lógica é reforçada pelas mudanças nas regras fiscais e administrativas que governam a transferência de recursos à conta de tecnologia, facilitando sua remessa, e na legislação de propriedade intelectual, que reforça os direitos dos detentores de patentes que, em sua maioria (mais de 80%) são empresas estrangeiras (Barbosa, 1999). Esta divisão do trabalho não obsta o aprendizado por parte das filiais (que é inequívoco), mas orienta o desenvolvimento de capacitação tecnológica para atividades cujo alcance inovativo é limitado. 

Da mesma forma, a divisão de trabalho entre matrizes e filiais também tende a circunscrever a demanda feita pelas filiais a universidades e institutos de pesquisa locais a atividades de complexidade tecnológica limitada. Se, conforme argumentam os trabalhos acima, estas empresas são os principais investidores em tecnologia, a constituição de um sistema nacional de inovação a partir delas parece limitada.

A julgar pelos resultados da SOBEET (ibid.) os estímulos fiscais e creditícios dados pelo Governo brasileiro são pouco eficazes para aumentar os gastos feitos no país em atividades simples como as que já são feitas – o que se dirá de sua eficácia para aumentar substancialmente sua complexidade! 

À luz da caracterização acima é de se lastimar de que não se disponha de informações sobre o que ocorreu com os programas tecnológicos de empresas privadas nacionais adquiridas por empresas estrangeiras, especialmente porque algumas destas (especialmente certos produtores de auto- peças) estavam entre as poucas empresas nacionais a terem programas de P&D de porte significativo.

É importante notar que a força da competição obriga empresas nacionais que concorrem com filiais de transnacionais (diretamente ou através de importações) a também buscar tecnologia no exterior para apresentarem produtos semelhantes em prazos compatíveis com os de seus competidores e, preferencialmente, amparados por marcas internacionais10. O licenciamento de tecnologia externa leva ao desenvolvimento da capacidade de produção e de engenharia de detalhe mas não induz à capacitação em pesquisa e desenvolvimento – ou seja, a competição leva as empresas nacionais a replicarem as mesmas capacidades das filiais aqui instaladas.

Tampouco conta- se com muita informação sobre os efeitos da privatização sobre as atividades tecnológicas industriais. No caso da petroquímica, em que havia um centro de pesquisas importante em implantação, este projeto foi abandonado. Nos outros casos, quando os compradores foram empresas locais, como na maioria das empresas estatais industriais, os novos proprietários aparentemente mantiveram a trajetória tecnológica anterior – tal parece ser o caso, por exemplo, da EMBRAER e da USIMINAS. Quando os compradores foram empresas estrangeiras, a lógica empresarial acima referida parece prevalecer. Embora este último caso seja mais freqüente no setor de serviços, a compra tem efeitos sobre a indústria através do mecanismo de compras, conforme já mencionado. Em primeiro lugar, é importante notar que as empresas de capital estrangeiro apresentam maior propensão a importar do que as de capital local (Moreira, 1999b) e, portanto deslocar as compras e o desenvolvimento tecnológico destas para o exterior. Em segundo lugar, os novos proprietários tendem a adotar, no Brasil, as mesmas especificações de equipamentos e componentes que usam em outras partes do mundo, reduzindo a demanda por inovações locais. Segundo Cassiolato et al. (1999), após a privatização dos serviços de telecomunicações, os fornecedores de equipamentos de telecomunicações teriam reduzido seus gastos em P&D e orientado suas atividades tecnológicas para finalidades mais simples.

Em síntese, a transformação da estrutura de controle de capital da indústria brasileira parece atuar no sentido de acelerar a introdução de novos produtos e processos e, ao mesmo tempo, concentrar as atividades tecnológicas em projetos de adaptação e melhorias de qualidade. Neste sentido, reforça a orientação derivada da estrutura de produção e de inserção internacional.

4. Crescimento e investimentos

O investimento em ativos que servem principalmente para introduzir inovações em produtos, processos e métodos de gestão faz parte do portfolio de investimentos das empresas industriais e deve, portanto, ser tratado no contexto mais amplo do processo de investimento dessas empresas (Erber, 1999). 

No caso brasileiro, há consenso quanto à predominância do mercado interno como determinante dos investimentos industriais. Isto é válido mesmo no caso das empresas transnacionais, com o eventual acréscimo do MERCOSUL ao mercado interno (Bielschowsky, 1999; Laplane e Sarti, 1997 e 1998).

O crescimento do produto industrial ao longo da década de 90 é altamente irregular, conforme mostra o Quadro 4. Apenas 1993 e 1994 apresentam taxas de crescimento elevadas, que compensam a queda do triênio anterior. Seguem- se dois anos de crescimento limitado e outro (1997) de expansão. Esta, porém é abortada pela crise externa do fim daquele ano e o crescimento do restante da década é irrisório. A taxa de investimento industrial dos períodos 1992/93 e 1995/97 (respectivamente 2% e 3,3% do PIB) sugere que a década passada foi, do ponto de vista do investimento, ainda pior que os famigerados anos 80, em que a taxa para 1981/88 foi de 3,2% do PIB (Bielschowsky, 1999). 

O mesmo autor argumenta que no período 1991/97 teriam ocorrido duas fases de investimento. A primeira fase, típica da crise do início da década, foi caracterizada pelos objetivos de redução de custos e melhorias na qualidade através da racionalização dos processos produtivos via desobstrução de gargalos produtivos e novas técnicas de gestão (“just in time”, “qualidade total”, etc.), desverticalização e especialização. O período posterior (1995/97) é descrito por Bielschowsky como um “mini- ciclo de modernização”, em que os investimentos, embora ainda orientados para a redução de custos, contariam com maior grau de imobilização devida à reposição de equipamentos. Tais investimentos seriam movidos principalmente pela necessidade de evitar perdas nos custos enraizados – ou seja, teriam, essencialmente, uma natureza defensiva. Os investimentos destinados à expansão de fábricas, à introdução de novos produtos e a novas fábricas eram reduzidos, face às incertezas macroeconômicas. A necessidade desses investimentos “de expansão” seria ainda minorada pelo aumento de capacidade de produção trazida pelos investimentos de modernização, concomitante à redução de custos. 

Nos anos finais da década, marcados pela crise de 1998/99, os investimentos industriais provavelmente mantiveram- se semelhantes aos observados por Bielschowsky (1999), conforme sugerem os dados de produção e importação de bens de capital11, embora alguns setores, como o automobilístico, tenham prosseguido com seus planos de expansão. A última sondagem da Confederação Nacional da Indústria, feita no último trimestre de 1999, mostrava que havia uma tendência a aumentar os investimentos no ano 2000, mas que estes seriam dirigidos principalmente para o aumento de eficiência das empresas (CNI 1999), seguindo assim o padrão anterior12.

Conforme aponta Carvalho (2000), o grande aumento da produtividade média da indústria durante a década de noventa pode ser atribuído a esses investimentos (incluindo a introdução de novos métodos de organização da produção) e à abertura às importações. Embora os dados setoriais sejam muito precários, Moreira (1999 a) mostra que o aumento de produtividade teria sido especialmente forte na produção de automóveis, na siderurgia e nos plásticos – setores intensivos em escala que também respondem pela maior parte dos investimentos (Bielschowsky, 1999; Laplane e Sarti, 1998). 

Os (poucos) dados de que se dispõe sobre investimentos em inovação tecnológica são consistentes com a análise acima reproduzida sobre investimento fixo. Assim, SOBEET (2000) mostra que o principal foco dos investimentos feitos por empresas estrangeiras em inovação é o aumento da participação no mercado nacional com a mesma linha de produtos da matriz. O mesmo estudo e Quadros et al. (1999) apontam que os principais fatores determinantes da decisão de investir em inovação são a redução de custos da produção e a melhoria da qualidade dos produtos. 

É possível avançar um pouco na configuração do padrão de investimento (fixo e em tecnologia) característico da década através de uma conjectura sobre os limites desses investimentos. Parece plausível supor que as empresas têm que realizar um nível mínimo de investimentos para permanecer no mercado. Esse “piso” tem uma forte determinação setorial e é também afetado pelo grau de concorrência vigente no mercado. Parece também plausível supor que as firmas têm um “teto” para seus investimentos, definido por características setoriais, pelas perspectivas dos seus principais mercados, pelas possibilidades de financiamento dadas pelo mercado financeiro e de capitais e pela possibilidade de aplicações alternativas com risco mínimo (títulos governamentais).

É importante notar que o investimento “em tecnologia” constitui um portfolio em si – projetos de desenvolvimento tecnológico variam desde pequenas adaptações de produtos e processos até a pesquisa. Posto de outra forma: os projetos de desenvolvimento tecnológico são distintos em termos da incerteza, tempo, irreversibilidade e indivisibilidade dos recursos necessários e dos resultados esperados. As mesmas condições técnicas e econômicas que tendem a comprimir o teto dos investimentos fixos a um nível próximo do piso também tendem a orientar o portfolio de investimentos em tecnologia na direção dos projetos que requerem recursos mais reduzidos, envolvendo ativos que podem ser usados para outros fins (i.e. menos específicos) e onde os prazos (de imobilização e maturação) são mais curtos e a incerteza (de custos e benefícios) é menor. 

Adicionalmente, é também importante lembrar que, seja por meio de relações intra-grupo, seja por meio de contratos de licenciamento entre empresas independentes, é possível ter acesso aos resultados dos investimentos em tecnologia feitos por outras firmas. Esta possibilidade é especialmente relevante para os resultados dos projetos de pesquisa e desenvolvimento pois permite obviar a principal restrição a este tipo de investimento: sua incerteza. Ao utilizar este recurso as empresas podem reduzir o teto de seus gastos em tecnologia no país.

O início da década dos noventa no Brasil foi marcado pela concomitância de forte incerteza macroeconômica (basta lembrar as oscilações da taxa de inflação do período, bem como a turbulência política) com o lançamento do processo de abertura comercial, que permitiu a rápida introdução de novos produtos no mercado. Conforme mencionado acima as empresas reagiram defensivamente através de reduções de custos e melhorias na qualidade do produto. Este investimento foi feito com baixas taxas de imobilização, como mostra a taxa acima citada (2%). Dada à importância da introdução de novas técnicas de gestão de pessoal e produtos, bem como de adaptações de produtos, parece provável que o piso de gastos em tecnologia tenha subido, assim como o peso relativo deste tipo de gastos dentro do portfolio geral de investimentos das empresas e dentro do portfolio específico de investimentos em tecnologia, onde parece ter sido dominante13. No entanto, nas condições vigentes no período, parece provável que o teto (de todos os tipos de investimento) tenha ficado muito próximo do piso – ou seja, investiu- se apenas o indispensável para proteger os ativos já existentes e para sobreviver face às novas condições de concorrência.

Após a implantação do Plano Real, com a estabilização de preços, o aumento da massa salarial e à expansão do comércio regional, as perspectivas de investimento melhoraram, mas a euforia foi de curta duração e o resto da década decorreu em condições de renovada instabilidade macro originada no setor externo. O teto dos investimentos foi provavelmente comprimido pela incerteza macro bem como pelas altíssimas taxas de juros, que, de um lado, desestimulavam o endividamento para investimentos em capital fixo e tecnologia e, de outro, proporcionavam altos rendimentos a baixo risco para aplicações de natureza financeira. Ao mesmo tempo, a política macro, através da operação do câmbio, aumentou a competição com as importações e desencorajou a busca de mercados externo. Ou seja, a operação da política macro elevou substancialmente as taxas mínimas de rendimento (hurdle rates) de projetos de investimento e orientou o portfolio na direção de projetos de baixa imobilização, pouca incerteza e curtos prazos de maturação. Sob tais condições, os investimentos tendem a manter sua característica minimalista defensiva e seu montante a situar- se próximo do piso. Não parece ser acidental que os principais setores que investem neste período sejam protegidos contra as importações por condições naturais favoráveis (siderurgia e alimentos) ou regimes de preços especiais (material de transporte).

É possível que, tendo feito a reestruturação mais barata e rápida durante o início da década, as empresas tenham sido obrigadas a elevar o piso de investimentos fixos, tal como evidenciado pelo aumento da taxa de investimento no período 1995/97.

Neste caso, parece provável que o peso relativo dos investimentos em tecnologia dentro do mix de investimentos tenha declinado. 

Existem poucas informações sobre os gastos empresariais em tecnologia no período. Limitações de tempo e espaço impedem uma discussão mais detalhada da quantificação feita dos gastos em tecnologia e atenho- me à identificação de algumas tendências, assumindo que os erros tenham uma distribuição uniforme ao longo do tempo. 

Sbragia et al. (1999) estudam uma amostra de 86 empresas respondentes às pesquisas da ANPEI durante o período 1993/97. A amostra é constituída principalmente por empresas médias e grandes de propriedade nacional. O percentual de vendas dedicado a todos os tipos de atividades tecnológicas teria aumentado entre 1993 e 1994 e, a seguir, diminuído – o que parece consistente com as informações e a análise expostas acima. Da mesma forma, parece consistente a tendência ao aumento do percentual dos gastos totais com tecnologia dedicado à compra de tecnologia no exterior, que dobra no período. A participação de gastos em P&D no total teria aumentado entre 1993 e 1997, sugerindo que o teto dos investimento em tecnologia poderia ter se elevado, mas um dos autores me advertiu que este resultado pode ser devido a mudanças na classificação dos gastos. SOBEET (2000) apresenta dados para 77 filiais de empresas estrangeiras de porte médio e grande. Os dados estão centrados em 1998, mas as empresas apresentaram estimativas de gastos para 1995/97 e para 1999/2001. O percentual de vendas dedicado a todo tipo de gasto em tecnologia sobe ao longo de todo o período. No entanto, a participação de gastos em P&D no total de gastos em tecnologia cai entre 1995/97 e 1998 em detrimento dos demais tipos de gastos, que envolvem projetos de menor complexidade, que vão desde a capacitação de recursos humanos até a engenharia não- rotineira. Para o futuro (sempre imprevisível), as empresas estimam que em 1999/2001 haveria uma volta da participação dos gastos em P&D no total aos mesmos níveis de 1995/97. 

Ressalvada a precariedade dos dados (a despeito da diligência dos pesquisadores), as informações acima citadas e a análise qualitativa exposta na seção anterior não parecem falsificar (no sentido popperiano) a hipótese de que o padrão de crescimento e investimento da indústria brasileira durante a última década induziu à elevação do piso de gastos em tecnologia mas não ergueu o teto desses gastos. Claro está que a hipótese, embora plausível, carece de outras pesquisas que a validem.

5. O foco das políticas governamentais

Os anos noventa são um período de profundas transformações no padrão de intervenção estatal em termos de desenvolvimento industrial e tecnológico, subordinadas a uma nova visão de desenvolvimento, que se opõe explicitamente à visão dominante até o fim dos 80. Portanto, mais além de modificações na política macro, podem ser identificadas duas “agendas” na atuação do Estado: a primeira, definida pela percepção dos equívocos do passado, constituída por ações a serem evitadas (uma agenda “negativa”) e a segunda composta pelas questões que a intervenção deve enfocar – ou seja, uma agenda “positiva”.

Dentro da agenda negativa, dois tópicos parecem ser os mais relevantes para a problemática tratada neste artigo. Em primeiro lugar, o temor que, ao adotar políticas que hierarquizem setores industriais, repliquem- se problemas de controle do Estado por grupos privados, levando à geração de rendas não- produtivas. Isto leva a uma política industrial e tecnológica de cunho “horizontal” que, em tese, não deveria diferenciar setores e, quando surgem crises, a intervenções localizadas e ad- hoc (cujo exemplo mais conhecido é o do regime automobilístico). Embora haja consenso que o rent seeking deve ser combatido (sem confundi- lo com os argumentos da “indústria infante”), este combate não pode ignorar a realidade de que os setores são diferentes em termos de dinamismo tecnológico, econômico e social. Na prática, devido a essas diferenças, não existem políticas que sejam neutras do ponto de vista setorial – mesmo as políticas macro mais gerais (por exemplo, a política cambial) afetam os distintos setores de modo diferente14. O próprio combate ao rent seeking exige a compreensão das diferenças setoriais – por exemplo através de metas de desempenho tecnológico ou exportador. Além de reduzir a eficácia da governance do Estado, a suposta “horizontalidade” das políticas industrial e tecnológica tende a consolidar o peso dos setores já implantados em detrimento de novos setores, o que, no caso brasileiro, atua contra os setores de alta tecnologia, baseados em ciência.

O segundo ponto da agenda negativa, correlato ao anterior, diz respeito à valoração da autonomia de decisões. No passado, este critério foi decisivo para a realização de investimentos pelo Estado na área de ciência e tecnologia e para a concessão de privilégios a empresas de capital nacional que investissem neste campo. Dentro da visão hegemônica, a identificação entre autonomia e investimentos em tecnologia tende a reduzir a prioridade política dada a esses investimentos15

Por sua vez, a agenda positiva também contém importantes implicações para o padrão de desenvolvimento industrial e tecnológico, convergentes com as conseqüências da agenda negativa. Também aqui selecionamos dois pontos da agenda positiva para ilustrar suas implicações. O primeiro ponto diz respeito ao foco de transformações estruturais. A nova agenda concentra suas atenções nas transformações da estrutura institucional, privilegiando as instituições de mercado. Supõe que, funcionando estas adequadamente, a estrutura produtiva a elas se conformará de modo eficiente, seguindo o modelo de vantagens comparativas internacionais. Reconhece que o mercado falha ou é incompleto (por exemplo, em termos de práticas lesivas à concorrência ou na ausência de instituições de crédito de longo prazo), mas, em sua versão mais radical, acredita que essas falhas são menos daninhas que as decorrentes da intervenção do Estado para saná-las. Em sua versão mais branda, postula que a intervenção do Estado é necessária. No entanto, esta intervenção é feita por meio de instituições específicas (por exemplo, o BNDES), através de mecanismos de mercado (reduzindo as taxas de juros para determinadas atividades ou setores) e sem qualquer perspectiva de estrutura produtiva. O regime automobilístico ilustra bem esse modo de atuação: mobilizaram- se vários instrumentos (tarifas e cotas de importação, incentivos fiscais, crédito do BNDES) sem que houvesse qualquer orientação do Estado sobre a estrutura produtiva desejável – apesar do mercado ser um mecanismo notoriamente falho para coordenar decisões, como reconhece o insuspeito Banco Mundial ao analisar o sucesso do Sudeste asiático (World Bank, 1993).

O segundo ponto diz respeito aos atores do desenvolvimento industrial e tecnológico. Na visão dominante, o demiurgo do desenvolvimento é a grande empresa internacional, que trará novas técnicas e abrirá caminho nos mercados internacionais, compensando assim sua forte propensão a importar. Para que esta firma possa agir de forma eficaz à abertura (comercial, financeira e econômica) é indispensável, eliminar as diferenças entre capitais nacionais e estrangeiros. Aqui também o desenvolvimento é confiado aos mecanismos de mercado – não há evidência de que se tenha negociado contrapartidas à abertura em termos de, por exemplo, investimentos em centros de tecnologia no país.

Em síntese, a visão de desenvolvimento prevalecente nos anos noventa parece atuar no sentido de reforçar as características estruturais do padrão de desenvolvimento industrial e tecnológico vistas acima.

Para concluir, resta lembrar que a política macro implementada dentro deste quadro de prioridades negativas e positivas atuou decididamente no sentido de orientar os investimentos em tecnologia para níveis reduzidos e concentrados em atividades de baixa complexidade, conforme discutido nas seções anteriores.

6. Especulações sobre o futuro

Argumentou- se na seção anterior que o atual padrão de desenvolvimento industrial demanda uma capacitação tecnológica mais intensa em atividades de menor complexidade, vinculadas ao uso eficiente de processos desenvolvidos no exterior, destinados à produção de bens também projetados fora. No máximo, o padrão de desenvolvimento industrial demanda adaptações dos produtos e processos às condições locais – que podem até, em alguns casos, ser de relativa complexidade.

Admitamos que o desenvolvimento econômico seja retomado, seguindo as linhas do modelo vigente: um círculo virtuoso entre abertura, investimentos estrangeiros, aumento de produtividade, exportações e aumento de mercado interno16. Neste cenário de retomada de investimentos voltados para a ampliação da capacidade produtiva, regulado apenas pelo mercado e liderado pela empresas estrangeiras, é plausível supor que as filiais brasileiras ampliem sua participação nos respectivos grupos e, assim, recebam maiores incumbências técnicas, abrangendo inclusive o resto da América do Sul. Ou seja, o tipo de capacitação tecnológica atual seria aprofundado, embora pareça pouco provável que centros de P&D venham a ser estabelecidos no país. 

Além da evolução macroeconômica favorável, este cenário é obviamente condicionado pela estratégia das matrizes das empresas estrangeiras e pela disponibilidade e qualificação da mão de obra especializada e de nível superior, principais fatores que as subsidiárias apontam como condicionando sua decisão de investir em inovação no país (SOBEET 2000).

Existem, porém, outros cenários mais pessimistas, vinculados às características estruturais vistas acima. A composição das pautas de exportação e importação vistas nos Quadros 1 e 2 aponta para a existência de um déficit comercial de natureza estrutural, posto que os produtos exportados tendem ter baixo dinamismo internacional e os bens importados têm alta elasticidade – renda interna – o tipo de situação descrito por Prebisch há muitos anos. Vários estudos, feitos inclusive por pesquisadores que integraram a equipe econômica do Governo (Batista e Fritsch, 1993), têm advertido para a tendência à perda de posição do Brasil no comércio internacional de produtos industriais devido à baixa intensidade tecnológica de suas exportações, e suas conclusões foram reiteradas recentemente pelo IEDI (2000), que recomenda, além de políticas horizontais, a adoção de políticas industriais e tecnológicas de corte setorial. 

No entanto, o atual Governo parece ater- se à visão de intervenção estatal acima descrita, que exclui a ação dirigida a transformar deliberadamente a estrutura produtiva, fiando- se na alteração da política cambial. Esta (com um ano de lag) teria levado à um superávit comercial no primeiro semestre do corrente ano. Cabe, porém, observar que não só o superávit é muito menor do que o estimado pelo Governo, como cerca de 50% do crescimento das exportações totais deve-se a dois setores apenas – material de transporte e produtos elétricos e eletrônicos (FUNCEX 2000) – atividades muito atingidas pela retração de 1999 e que podem diminuir suas exportações na medida em que o mercado interno se recupere. Também é importante notar que o valor anual das importações de bens de capital em junho de 2000 era 22% inferior ao mesmo período do ano anterior (ibid.) e que estas importações (e as de bens intermediários) apresentarão forte crescimento caso haja um novo ciclo expansivo.

Portanto, a estrutura de produção e seu desdobramento em termos de comércio internacional tendem a reforçar a dependência da entrada de capitais para evitar uma crise externa. Após a experiência do último quinquênio, parece haver um consenso de que é muito arriscado confiar esse papel aos capitais financeiros – o que reforça a importância atribuída ao investimento direto. Como este é atraído principalmente pelo dinamismo do mercado interno17, há um risco de ocorrer um círculo vicioso: uma forte expansão do mercado interno provocar uma crise externa, obrigando o Governo a adotar medidas de contenção de demanda que desestimularão o investimento direto, alongando a crise. 

Uma crise externa prolongada poderia dar lugar à mudanças no enfoque das políticas públicas, dirigindo- as para a transformação estrutural, inclusive através da negociação com as firmas internacionais. Neste caso, é possível que atividades tecnológicas mais complexas venham a ser encetadas. No entanto, mesmo neste quadro, é necessário considerar que há um forte elemento de inércia estrutural e que não é minimamente realista esperar que padrões de comportamento tecnológico consolidados ao longo de décadas sejam rapidamente modificados.

Os cenários virtuoso e vicioso acima esboçados são casos extremos. A análise anterior sugere que um quadro intermediário, em que estariam combinados crescimento reduzido, pouca transformação estrutural e limitada capacitação tecnológica, parece mais provável. 

No entanto, mesmo este quadro intermediário pode ser inviabilizado por outras dimensões estruturais, até aqui omitidas: o emprego e a desigualdade econômica e social. Embora haja consenso que o desemprego não será diretamente reduzido através da indústria de transformação, esta tem um importante função indutora de emprego no resto da economia através dos papéis que desempenha na dinâmica da economia. Além do emprego, o crescimento industrial tem importantes efeitos indiretos sobre a redução dos níveis de desigualdade através dos seus impactos fiscais e da ampliação dos gastos sociais das três esferas governamentais.

Estima-se que é necessário que a taxa de crescimento da economia como um todo seja da ordem de 5% anuais para que a taxa de desemprego não aumente. O ano corrente apresenta claros sinais de recuperação da crise do biênio anterior, com o PIB crescendo cerca de 3,8% e com a indústria tendo crescido até o fim de julho 5,3% anuais. Em termos anuais, o crescimento industrial foi liderado pelos bens de consumo durável e intermediários. Os dados semestrais do IBGE (ibge.gov.br) apontam para um maior crescimento na produção de bens de capital, indicando que o processo de investimento pode estar retomando. No entanto, o quantum importado de bens de capital acumulado no ano corrente ainda era 11,5% inferior ao do período correspondente de 1999, em que as importações foram muito afetadas pela desvalorização do início do ano (FUNCEX 2000).

As estimativas mais otimistas para o crescimento nos próximos anos variam entre 5 e 6% anuais. Caso prevaleça um cenário intermediário, de baixo crescimento, a pressão política pode levar a mudanças no padrão de desenvolvimento macro e industrial/tecnológico, cuja direção é muito incerta.

 

QUADRO 1

BRASIL: ESTRUTURA DA PRODUÇÃO INDUSTRIAL (Y); EXPORTAÇÕES (X) E IMPORTAÇÕES (M) SEGUNDO A INTENSIDADE DE FATORES, EM PERCENTAGEM DO VALOR TOTAL – 1989 E 1997

Fonte: Moreira (1999a), elaborado pelo autor.

 

QUADRO 2

BRASIL: ESTRUTURA DA PRODUÇÃO INDUSTRIAL (Y); EXPORTAÇÕES (X) E  IMPORTAÇÕES (M) SEGUNDO O NÍVEL TECNOLÓGICO DOS PRODUTOS, EM PERCENTAGEM DO VALOR TOTAL  – 1989 E 1997

Fonte: Moreira (1999a), elaborado pelo autor.

 

QUADRO 3

PARTICIPAÇÃO DE EMPRESAS SOB CONTROLE ESTRANGEIRO NA RECEITA OPERACIONAL LÍQUIDA DA INDÚSTRIA DE TRANSFORMAÇÃO (ROLIT) – SETORES EM QUE A PARTICIPAÇÃO É SUPERIOR A 40% E TOTAL DA INDÚSTRIA – 1997

Fonte: Moreira (1999b) Memo: Os setores acima listados (exceto fumo) respondiam por 64,8% da ROLIT das empresas sob controle estrangeiro.

 

QUADRO 4

BRASIL: TAXAS DE CRESCIMENTO DO PIB INDUSTRIAL 1990/2000, EM PERCENTAGENS

(1) Período janeiro/julho, produção física. Fonte: Boletim de Conjuntura, IE/UFRJ

Referências Bibliográficas

BATISTA, J. e FRITSCH, W. (1994) Dinâmica recente das exportações brasileiras (1979- 90), In: REIS VELLOSO, J.P. e FRITSCH, W. (org.) A nova inserção internacional do Brasil. José Olympio Editora, Rio de Janeiro.

BARBOSA, A. (1999) Sobre a Propriedade do Trabalho Intelectual: Uma Perspectiva Crítica., Editora UFRJ, Rio de Janeiro.

BIELSCHOWSKY, R. (1999) Investimentos na indústria brasileira depois da abertura e do Real: mini- ciclo de modernizações 1995- 97, CEPAL, Série reformas econômicas n. 44, Santiago do Chile.

CARVALHO, P. (2000) As causas do aumento da produtividade da indústria brasileira nos anos 90., Tese de doutorado, IE/UFRJ.

CASSIOLATO, J.; SZAPIRO, M. and LASTRES, H. (1999) Local system of innovation under strain: the impacts of strucutral change in the telecommunications cluster of Campinas, Brazil., Instituto de Economia, Universidade Federal do Rio de Janeiro, mimeo.

CNI – Confederação Nacional da Indústria (1999) Perspectivas de investimento para o ano 2000., Sondagem Conjuntural, suplemento especial, Outubro.

ERBER, F. (1999) O sistema de inovações em uma economia monetária: uma agenda de pesquisas., In: J. E. CASSIOLATO and H. LASTRES (eds.) Globalização & Inovação Localizada - Experiências de Sistemas Locais no Mercosul. IBICT/MCT, Brasília.

ERBER, F. and Vermulm, R. (1993) Ajuste Estrutural e Estratégias Empresariais., Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, Brasília.

FRANCO, G (1998) Inserção Externa e Desenvolvimento., Revista de Economia Política.

FUNCEX – Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (2000) Boletim Setorial de Comércio Exterior, Ano IV, n.3.

GONÇALVES, R. (1999) Globalização e desnacionalização, Paz e Terra, São Paulo.

IEDI – Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (2000) Abertura, política cambial e comércio exterior – lições dos anos 90 e pontos de uma agenda para a próxima década., Mimeo, São Paulo.

LAPLANE, M. e SARTI, F. (1997) Investimento direto estrangeiro e a retomada do crescimento sustentado., Revista do Instituto de Economia da UNICAMP, n. 8.

____________________. (1998) Novo ciclo de investimentos e especialização produtiva., In: REIS VELLOSO, J.P. (org.) O Brasil e o mundo no limiar do novo século. José Olympio Editora, Rio de Janeiro.

MOREIRA, M. (a) (1999) A indústria brasileira nos anos 90: o que já se pode dizer?, In: GIAMBIAGI, F. e MOREIRA, M. (org.) A Economia Brasileira nos Anos 90. BNDES, Rio de Janeiro.

___________. (b) (1999) Estrangeiros em uma economia aberta: impactos recentes sobre a produtividade, a concentração e o comércio exterior, In: GIAMBIAGI, F. e MOREIRA , M. (org.), op. cit.

NSF – National Science Foundation (2000) Science and engineering indicators, Washington, D.C.

OECD – Organization for Economic Cooperation and Development (1994) Manufacturing performance: a scoreboard of indicators, OECD, Paris.

QUADROS, R. et al. (1999) Technological innovation in Brazilian industry: an assessment based on the São Paulo innovation survey, International Conference on Technology Policy and Innovation. Austin, mimeo.

SBRAGIA, R; KRUGRIANKSAS, I. and ANDREASSI, T. (1999) Innovative firms in Brazil., In: em ETZKOWITZ, H., et al. (eds.) Triple Helix in Latin America, no prelo.

SOBEET – Sociedade Brasileira para o Estudo de Empresas Transnacionais (2000) Comportamento tecnológico das empresas transnacionais em operação no Brasil, Conjuntura Econômica, março.

WORLD BANK (1993) The East Asia Miracle, Washington, D.C.

Desenvolvimento Econômico: O Recorte Setorial

Fabio S. Erber, Apresentação do livro intitulado Desenvolvimento econômico: o recorte sectorial (Livro BNDES 50 anos | Histórias setoriais)

Este artigo tem por objetivo abrir a discussão da temática setorial e apresentar brevemente catorze estudos setoriais feitos por especialistas do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social como parte das comemorações dos cinquenta anos dessa instituição.Pareceu-me útil tentar, inicialmente, situar o conceito de “setor” no âmbito da teoria econômica, mostrando que essa dimensão de análise possui longa história e é de utilização frequente pelos autores preocupados com o desenvolvimento do capitalismo, tendo emergido há pouco das trevas a que havia sido consignada pelos programas de pesquisa keynesiano e neoclássico.A seção seguinte trata do caso brasileiro; mais especificamente, da atuação setorial do BNDES numa perspectiva histórico-analítica. Partindo da visão de desenvolvimento que foi hegemônica desde o pós-guerra até a década de 80, argumenta que a estratégia de desenvolvimento adotada demandava, simultaneamente, políticas setoriais e uma instituição financeira como o BNDES. A participação do Banco na evolução de alguns setores estratégicos e, inversamente, o peso desses setores na carteira do Banco justificaram, mais tarde, a institucionalização de centros de conhecimento setorial na forma de Gerências Setoriais. A seção conclui argumentando que, em face da necessidade de retomar o crescimento econômico e em face das pesadas restrições macroeconômicas existentes, parece muito provável que a nova estratégia de desenvolvimento venha a novamente privilegiar as alterações na estrutura produtiva, atuando por meio de políticas setoriais. Para tanto, o Banco será um instrumento fundamental para formular e executar a estratégia, e as Gerências Setoriais poderão cumprir um papel crucial como núcleos de inteligência setorial.Para concluir, a quarta seção faz uma breve revisão das características dos estudos setoriais a seguir apresentados, centrada principalmente em sua morfologia, deixando ao leitor o prazer de descobrir seu conteúdo substantivo.

2. O Conceito de “SETOR” na Teoria Econômica 

O uso do conceito de “setor” reflete uma visão da economia que privilegia a complexidade, a diferença entre as partes que compõem o sistema econômico. É um conceito mesoeconômico, situado entre as análises da empresa e a dos grandes agregados macroeconômicos. Sua função é reunir empresas ou atividades econômicas que apresentam elementos comuns. O nível de agregação usado – a definição de “setor” – depende do tipo de problema a ser tratado. Por exemplo, a divisão da economia em setores primário, secundário e terciário, muito usada em estudos de desenvolvimento, agrega no “secundário” “indústrias” distintas, que, em outros tipos de análise, como os de organização industrial, constituem a unidade de agregação. Mesmo a definição de “indústria” pode variar: enquanto alguns trabalhos associam a indústria a um mercado,1 outros vinculam a indústria a uma base técnica específica.2

O conceito de setor tem longa história. Suas raízes encontram-se na divisão de trabalho e na especialização. No clássico livro de Adam Smith sobre A riqueza das nações, já no capítulo inicial, argumenta-se que a separação de atividades é devida a esses dois fatores e, a seguir, é feita a distinção entre agricultura e indústria em termos da maior capacidade dessa última de “separar os diferentes ramos de trabalho”, o que explicaria por que o aumento da capacidade produtiva do trabalho é maior na indústria do que na agricultura. Em conseqüência, as nações “mais opulentas” seriam aquelas que se distinguem por sua superioridade na manufatura (Smith, 1974, p. 111). 

Corolário da especialização é a interdependência, também celebrada por Smith. Em conseqüência, a operação de um setor é um processo coletivo, em que o resultado final difere da soma das partes. Embora simplifique linearmente as relações de interdependência, a metáfora da “cadeia” que vai das matérias-primas à comercialização de produtos exprime adequadamente outra conseqüência importante da interdependência: o fato de que a força de um setor é inversamente proporcional à fraqueza de seu elo mais débil. “Ilhas de excelência” esparsas num mar de subdesenvolvimento não conduzem à superação deste.  

A interdependência também existe entre setores, o que, mais tarde, levou ao desenvolvimento de outros conceitos mesoeconômicos, como o de “complexo industrial”, que, à semelhança do conceito de “indústria”, pode ser usado para agregar setores industriais que mantêm fortes relações de compra-e-venda de produtos visando a abastecer determinado mercado (por exemplo, o complexo têxtil), ou para juntar setores que suprem mercados distintos mas que compartilham a mesma base técnica (como o complexo eletrônico). 

Finalmente, os setores (ou complexos) articulam-se para formar a estrutura produtiva de dada economia, cujo dinamismo depende dessa articulação e do peso relativo de seus componentes.  

Esses temas – especialização, interdependência e estrutura produtiva – e suas implicações para o desenvolvimento do capitalismo seriam posteriormente explorados em detalhe por Ricardo e Marx, em seus respectivos contextos históricos, como testemunham as análises que fizeram sobre a constituição do setor produtor de maquinaria e os efeitos da introdução desta no resto do sistema produtivo e sua percepção da natureza coletiva do processo de trabalho industrial. 

Apesar dessa ilustre genealogia, o conceito de setor foi relegado a um plano secundário quando a análise econômica se deslocou dos temas de desenvolvimento para a preocupação com o equilíbrio e a alocação de recursos. Admitindo-se que existam “firmas representativas”, cujo comportamento maximizador é conhecido e que operem em condições de perfeita competição, a noção de “setor” só tem sentido como uma imperfeição, resultado da rigidez técnica e, eventualmente, das preferências idiossincráticas dos consumidores. Em outras palavras, passava-se diretamente do micro (a empresa) para o macro (a economia com um todo) sem a intervenção do mesoeconômico (o setor). 

Sintomaticamente, a dimensão setorial reaparece com forte peso na obra de Schumpeter, toda ela dedicada à análise do desenvolvimento capitalista. As inovações que movem o sistema são introduzidas em setores específicos e deles se difundem pelo resto do sistema, provocando “ondas” de investimento e movimento cíclicos. 

Entretanto, na seqüência da Grande Depressão, a obra de Schumpeter seria eclipsada pelo programa de pesquisa keynesiano. Este, mesmo divergindo radicalmente da análise neoclássica, pela sua ênfase numa economia “monetária” e no horizonte de curto prazo,3 manteve o mesmo ocultamento da dimensão mesoeconômica, prometendo o crescimento mediante instrumentos de política macro. 

Mais recentemente, a retomada da hegemonia pelo programa neoclássico de pesquisas, reforçado por hipóteses como a existência de expectativas racionais, confirmou o desinteresse do mainstream econômico por análises setoriais.  

Contudo, o surgimento de um programa de pesquisas alternativo ao keynesiano e ao neoclássico, baseado nas teorias de Schumpeter, fez com que a dimensão setorial fosse retomada. Nessa perspectiva, o desenvolvimento depende da introdução de inovações. As empresas são essencialmente diferentes entre si em termos de suas competências, desaparecendo o “agente representativo” – o que demanda outra instância agregadora. Esta é dada pelos setores. 

A dimensão setorial cumpre também uma função explicativa da dinâmica econômica: os diversos setores em que as empresas atuam apresentam oportunidades distintas de introduzir inovações e têm padrões de inovação dados por “paradigmas” tecnológicos, imprimindo cumulatividade às distintas trajetórias setoriais. Assim, a composição setorial da estrutura produtiva é um determinante de dinâmica interna e de sua inserção internacional. De certa forma, voltamos a Smith. 

Embora banida por longo tempo dos debates de teoria “pura”, a dimensão setorial nunca deixou de ser tratada em análises de economia aplicada, como nos estudos de organização industrial, investimento e comércio internacional, e, conforme apontado acima, todos os teóricos do desenvolvimento do capitalismo, de Smith a Schumpeter, incorporaram essa dimensão em seu trabalho. 

3. O Setor no BNDES  

O desenvolvimento dos países que se integraram ao mundo capitalista como fornecedores de matérias-primas surge como tema específico de análise no segundo pós-guerra, alimentado pela Guerra Fria e pela descolonização. 

Nesse contexto, estabeleceu-se uma distinção importante entre “crescimento” e “desenvolvimento”: o primeiro significava a expansão da estrutura vigente, enquanto o segundo implicava mudanças estruturais.  

Durante o longo período desenvolvimentista, convencionou-se que a estrutura que devia ser mudada era a produtiva, por meio da constituição de uma infra-estrutura moderna e da industrialização, processos feitos com base em políticas setoriais específicas, conduzidas pelo Estado. A transformação da estrutura produtiva requeria, porém, uma estrutura institucional adequada em termos de financiamento. 

Um processo de desenvolvimento, que envolve a constituição de novos setores, é uma situação em que vigem problemas de incerteza “pura”, do tipo keynesiano – ou seja, uma incerteza que não pode ser eliminada por mais informações. Tal incerteza era agravada pelas características dos setores a desenvolver: vultuosos investimentos em ativos específicos destinados a projetos de longo prazo de maturação, que implicavam forte “afundamento” de recursos. O mercado de crédito e de capitais da época não apresentava instituições dispostas a assumir esse tipo de incerteza, lacuna que foi preenchida pela criação do BNDES. 

A história das aplicações do Banco reflete um duplo movimento: de um lado, a evolução das necessidades de funding de investimentos de setores essenciais a uma nova estrutura produtiva e, de outro, a constituição de mecanismos alternativos de provisão desses recursos. Assim, o BNDES foi, inicialmente, “o banco das ferrovias” e, a seguir, “o banco da eletricidade e da siderurgia”. Mais tarde, na vigência do II PND, veio a desempenhar papel fundamental na constituição de outros setores de insumos básicos, como celulose e papel e petroquímica, e da indústria de bens de capital.  

A trajetória setorial não se esgota na constituição: periodicamente, os setores necessitam passar por um processo de renovação, que, dependendo das especificidades, replica as condições de sua instalação. Embora o BNDES tenha contribuído para aperfeiçoar o mercado de crédito e de capitais brasileiro, este permanece incompleto em termos de financiamento a longo prazo. Não é, pois, acidental que a modernização de setores industriais como o petroquímico, celulose e papel, mineração e metalurgia e investimentos relacionados à infra-estrutura (transportes, energia e telecomunicações) figurem com destaque no atual Plano Estratégico do BNDES. 

A complexidade da estrutura produtiva brasileira, associada à incompletude e às deficiências da estrutura de financiamento (privado e público) no Brasil, explica também a diversificação das atividades do BNDES em direção a atividades como serviços distintos da infra-estrutura, exportação, pequenas e médias empresas e desenvolvimento social. No financiamento à exportação, emerge de forma mais nítida o corte setorial, com a forte concentração das operações no financiamento das vendas do setor aeronáutico. 

O peso assumido por um número restrito de setores na carteira do Banco postula, por si só, a necessidade da instituição de contar não apenas com um acompanhamento sistemático desses setores, mas também com o monitoramento específico das empresas mutuárias. Da mesma forma, a avaliação das propostas de financiamento submetidas ao Banco requer a competência para analisar os setores em que os candidatos ao financiamento se inserem. Em outras palavras, o BNDES, como outras instituições financeiras semelhantes, requer, operacionalmente, alto grau de inteligência setorial. Dada a diversificação das operações do Banco, este tem ainda que deter a competência para realizar a análise de novos setores. Para ser eficaz, tal conjunto de competências precisa estar institucionalizado, de forma a não depender de indivíduos específicos – o que implica contar com uma massa crítica de técnicos qualificados em análises setoriais. 

Esse tipo de consideração presidiu a decisão da diretoria do Banco de criar as Gerências Setoriais do BNDES, em 1993. 

No entanto, é importante notar que o BNDES é um instrumento do Estado. Dada a qualificação de seu pessoal, ampliada ao longo dos anos, é um dos principais aparatos do Estado brasileiro em termos de competência técnica, para além do seu peso financeiro. 

Essa competência transformou o Banco num dos principais atores do processo de formulação e execução de estratégias de desenvolvimento no país, especialmente em períodos de forte transformação produtiva, como por ocasião do Plano de Metas e do II PND, ou de mudança institucional, durante os anos 90. 

Nos próximos anos, parece provável que a atuação do BNDES como formulador e executor de políticas de alteração da estrutura produtiva se veja novamente exigida, em função das modificações que se anunciam para a estratégia de desenvolvimento do país. Para tanto, será fundamental a concepção das Gerências Setoriais como “núcleos de inteligência setorial”, agindo articuladamente com as áreas operacionais do Banco e os demais aparatos do Estado. 

4. Os Artigos deste Livro 

Este livro reúne catorze artigos sobre a experiência setorial do BNDES. O conceito de setor foi interpretado de várias formas, refletindo a experiência do Banco. Assim, o recorte adotado vai da “indústria” (siderurgia) ao “complexo industrial” (eletroeletrônica) e à “atividade” (microcrédito).  

Os estudos têm perspectiva histórica, remontando às primeiras intervenções do Banco no setor em pauta. Na maioria dos casos (energia, transportes, bens de capital, celulose e papel, petroquímica e siderurgia), a história do apoio do BNDES ao setor confunde-se com a própria história do Banco e do setor, tão intimamente entrelaçadas estão as duas trajetórias. Nos demais casos (comércio e serviços, indústria têxtil, agroindústria, eletroeletrônica e telecomunicações), a intervenção do Banco no setor, embora importante, não teve o mesmo caráter “estruturante”. A inclusão do setor “social”, abrangendo educação, saúde e microcrédito, testemunha a diversificação das atividades do BNDES e a concepção multidimensional do desenvolvimento. Em outras palavras, o livro oferece um rico painel de experiências históricas. 

Apesar da importância da recuperação da história setorial, especialmente num país onde esse tipo de informação é reconhecidamente precário, os estudos concentram sua atenção em dois outros aspectos. Em primeiro lugar, detalham a experiência recente do Banco nos respectivos setores e, em segundo, analisam as perspectivas de atuação do Banco nos setores. Dessa forma, fornecem elementos importantes para a revisão crítica do passado recente e, principalmente, contribuem para a formulação de políticas setoriais e para a própria atuação do Banco. Nesse sentido, cumprem a função estratégica das Gerências Setoriais de atuarem como centros de inteligência para a formulação de políticas de desenvolvimento.

Referências Bibliográficas

AMADEO, E. (1989) Apresentação, In ____ (org.). John M. Keynes: cinqüenta anos da Teoria Geral. Rio de Janeiro, INPES/Ipea.

GUIMARÃES, E. (1981) Acumulação e crescimento da firma, Rio de Janeiro, Zahar.

SMITH, A. (1974) The wealth of nations, Harmondsworth, Penguin Books. Edição original: 1776.